Abilio Diniz mais doce

Leia em 6min 40s

O comandante do grupo Pão de Açúcar quebra o silêncio e revela um novo estilo, mais aberto ao diálogo. e pensa até em estrelar um programa de TV

 

Sexta-feira, dia 22 de agosto, 10 horas da manhã. O empresário Abilio Diniz entra em sua sala de reuniões na sede do Grupo Pão de Açúcar, região central de São Paulo. Minutos antes, ele ficara R$ 100 mil menos rico. Maureen Maggi acabara de conquistar a medalha de ouro no salto em distância na Olimpíada de Pequim - e o Pão de Açúcar, um de seus patrocinadores, havia prometido um prêmio extra em caso de vitória. Mas Abilio nem sequer tocou no assunto. Bem-humorado, metido em uma camisa pólo azul, calça jeans e tênis, pouco lembrava o empresário sempre vestido com ternos escuros bem cortados, camisas impecavelmente brancas e gravatas discretas e elegantes. "Passei anos usando paletó o dia inteiro", conta ele. "Hoje, quando preciso vesti-lo, acho desconfortável.

 

A gola fechada da camisa me incomoda." A descontração de Abilio não parece pontual. Nos últimos tempos, o aspecto sisudo que sempre o caracterizou foi sendo substituído por uma atitude mais jovial, segundo diversas pessoas de seu convívio ouvidas por DINHEIRO. "Ele está em outro nível de autoconhecimento e preparo emocional. Não é só discurso. Quem trabalha com ele assiste a esse processo. Ele se motiva com o crescimento dele e da empresa", afirma Maria Aparecida Fonseca, a Cidinha, diretora de recursos humanos que deixou o grupo depois de 24 anos de casa. "Ele não tem vergonha de admitir que vive em outro momento."

 

A jornada de trabalho continua dura, mas ele tem hoje outras fontes de satisfação. "Estou fazendo um monte de coisas que nada têm a ver com negócios. Não posso escrever um livro e falar sobre as coisas em que acredito se estiver vivendo de forma diferente", afirma ele, referindo-se a Caminhos e Escolhas - O Equilíbrio para uma Vida mais Feliz, obra de sua autoria lançada quatro anos atrás. "Não dá para viver tenso e cabisbaixo. É preciso buscar uma forma alegre de se viver." Abilio tem procurado - e encontrado - formas de expressão para esse novo momento em sua vida. Recentemente ele concluiu três episódios-piloto de um programa de tevê apresentado por ele. Ainda está em fase de testes, mas o título parece ser definitivo: "Escolhas, com Abilio Diniz". Com duração de cinco minutos, possui temas variados, mas sempre abordando assuntos referentes a qualidade de vida e bem-estar. Um deles fala sobre carboidratos. Outro discorre a respeito de amor. E o terceiro discute como dizer não no ambiente de trabalho e na vida pessoal. "Escolhas" pode ir ao ar em algum canal de tevê ou pela internet. "Isso dá um trabalho, nossa!", comenta Abilio. "São horas e horas de gravação para chegar nisso."


 
De certa forma, os projetos de Abilio nascem de sua experiência no Pão de Açúcar, palco permanente de sua vida. O grupo existe há 60 anos. Abilio tem 70 - embora sua aparência seja de 50 anos. "Eu acho que sou um bom ativo da empresa", afirma. "Acho que conheço este negócio. E uma pessoa que tem conhecimento precisa utilizá-lo." E passá-lo para a frente. Abilio está começando a rascunhar um curso de liderança com base nos seis pilares que compõem a estrutura do livro lançado em 2004: atividade física, de alimentação, de estresse, auto-conhecimento, amor e fé. A formatação final ainda encontra- se longe. "Pode ser que eu faça em conjunto com alguma escola de administração. Posso dar aula ou simplesmente desenvolver a concepção do curso. Mas alguma coisa eu tenho que fazer", diz ele.

 

É difícil estabelecer o momento exato dessa ruptura na vida de Abilio. Sua trajetória pessoal e profissional é pontuada por fatos dramáticos e emblemáticos. Viveu uma luta fratricida pelo controle do grupo no início dos anos 90. Dela, saiu como acionista majoritário de um negócio à beira da falência. O processo de recuperação que comandou tornou-se um dos mais impressionantes casos de virada da história do capitalismo brasileiro. Antes de se atracar com os irmãos, foi vítima de um seqüestro que o deixou sete dias trancafiado numa casa na periferia de São Paulo. Tudo isso foi lentamente moldando o novo estilo de Abilio. Os sinais de que o grupo pode voltar aos bons tempos também contribuem (leia reportagem à pág. 74). Mas talvez o ingrediente definitivo tenha sido o nascimento de Rafaela, a filha de três anos, fruto do segundo casamento. "Ela me motiva", confessa. "Faço esportes, malho e malho. Não quero ir buscá-la na escola e ver os coleguinhas falando: 'olha, aquele velhinho é o pai da Rafaela'."

 

'O sucesso nos acomodou'

 

Em entrevista exclusiva, Abilio fala do novo momento
do Pão de Açúcar

 

O que mudou na empresa desde dezembro passado?

Quando decidi pela profissionalização, todo mundo falava: "Ah, não tem profissionalização com o Abilio presente, ele põe o dedo em tudo." Sabendo disso, eu dei muita liberdade ao executivo principal. Você não pode nunca dar liberdade absoluta ao CEO. Dessa forma, a tendência é ele dar pouca informação e não discutir os caminhos da empresa com quem está em cima. É preciso uma profissionalização com uma governança corporativa que realmente funcione.

 

Foi dada muita liberdade aos dois presidentes anteriores, Cássio Casseb e Augusto Cruz?

Não queria me fixar em nomes, mas na tese daquilo que aprendi. É preciso ver qual foi a omissão do conselho e dos acionistas.

 

Qual a razão da mudança no grupo?

Voltamos às origens. A modificação que Cláudio [Galeazzi, o atual CEO] liderou, com a diminuição de mais de 20 diretores neste ano, não foi feita para reduzir despesas, mas para simplificar e buscar mais eficiência. O que eu mais criticava aqui era o excesso de reuniões. O número caiu para menos da metade. Tínhamos excesso de poder e poder dividido. Os executivos montavam exércitos, um para bater o outro aqui internamente. Nos últimos anos entrou muita gente nova e até desnecessária. É uma coisa inacreditável.

 

Como isso afetou a empresa?

De muitas formas. Tivemos problemas seríssimos, com falta e excesso de estoque. A pior coisa que pode acontecer é o cliente ir à loja e não encontrar o que procura. Não apenas porque se perde venda, mas por causa da imagem que fica para o cliente. Crescemos bastante nos anos anteriores e houve um pouco de acomodação.
 


E como malha. Abilio acorda às 5h30 e faz uma hora de exercícios aeróbicos. Toma café e ruma para a sede do Pão de Açúcar. Ao meio-dia, atravessa a avenida e entra na academia da empresa para mais uma hora de musculação. A jornada vespertina acaba por volta das 7 horas da noite, quando volta à academia para jogar squash. Os adversários são funcionários do Pão de Açúcar. Horas extras estão praticamente banidas de seu dia-a-dia - e ele incentiva seus colaboradores a seguir o exemplo. "Não valorizo quem fica aqui até tantas horas da noite", diz ele. Sempre que aparece uma oportunidade, incentiva os diretores a mergulhar no mundo da malhação. "O Cláudio (Galeazzi, CEO do grupo) é um puxador de ferro danado. Agora, depois de falarmos muito, está começando a fazer exercício aeróbico." O estilo paizão também se manifesta durante o expediente. Não é raro Abilio se aproximar da mesa de algum executivo e se oferecer para ajudar em algum tipo de trabalho. Mas, afinal, qual o objetivo de Abilio com a metamorfose? José Roberto Tambasco, vicepresidente comercial operacional do Pão de Açúcar, arrisca: "Ele já percebeu a necessidade de a empresa se perpetuar independentemente dele."


 

Veículo: Revista Isto É Dinheiro


Veja também

Redes de alimentação fora de casa optam por migrar para se expandir

A Associação Brasileira de Franchising (ABF) divulgou na última sexta-feira os dados da pesquisa fe...

Veja mais
Rede Covabra de Supermercados inaugura loja em Campinas

Conforme a tendência antecipada pelo DCI, na última semana, de aceleração da expansão ...

Veja mais
Extra abre mais uma unidade em Sorocaba

O Grupo Pão de Açúcar inaugurou na sexta-feira última mais uma unidade da bandeira Extra no ...

Veja mais
Pão de Açúcar mais doce

Como, a partir de uma palavra-chave, a nova equipe de executivos recolocou a rede nos trilhos   No centro da sala...

Veja mais
Carrefour retoma alta após semestre difícil

O Carrefour, uma das maiores redes varejistas do mundo, anunciou na última sexta-feira que retomou o crescimento ...

Veja mais
Aniversário

A Cativa Têxtil, de Pomerode, completa 20 anos hoje com a divulgação de dois novos licenciamentos da...

Veja mais
Varejo aposta nos produtos infantis

A demanda dos consumidores por produtos para o público infantil chama a atenção das empresas especi...

Veja mais
O caminho das rosas até São Paulo

Sexta-feira, 9h45. Quando a advogada Patrícia Neves chegou ao trabalho, no Morumbi, foi surpreendida com um ramal...

Veja mais
Expansão em marcha lenta

O presidente executivo do Grupo Pão de Açúcar, Claudio Galeazzi, engavetou os investimentos da vare...

Veja mais