Produtos sem agrotóxicos invadiram a mesa de uma camada de famílias brasileiras que pagam mais caro por esses alimentos
A Korin é 100% brasileira, mas segue ensinamentos japoneses da alimentação natural. E, como mandam a cautela e paciência orientais, só foi criada depois de muita pesquisa e experimentos. Isso levou mais de 15 anos. Sua fundação como empresa foi em 1994, época em que pouco se falava sobre alimentos sem agrotóxicos. Seus executivos não informam faturamento e nem vendas. Mas basta acompanhar a diversificação de produtos e ampliação da presença da marca nas gôndolas de supermercados para perceber que o ritmo de expansão é forte.
A empresa com sede em Ipeúna (SP) pertence à Igreja Messiânica e sua história começou alguns anos depois da fundação dos primeiros templos da instituição religiosa no país. Até hoje os principais diretores e gerentes da Korin são messiânicos e grande parte dos envolvidos na área técnica, de veterinários a agrônomos, é formada por pessoas ligadas à igreja.
A empresa e a igreja seguem os ensinamentos do mestre japonês Mokiti Okada (Tóquio, 1882-1955), pensador e religioso que não tinha nenhuma ligação com a agricultura. “Mas achava que se vivemos no mundo material precisamos ter um corpo saudável”, explica Sergio Homma, diretor da Korin Agricultura e Meio Ambiente, um dos braços da holding Korin Empreendimentos, formada um ano após a fundação da empresa.
Engenheiro agrônomo paranaense, Homma começou, em 1987, a trabalhar em uma fundação da Igreja Messiânica chamada Mokiti Okada, dedicada a pesquisar a agricultura natural. Recentemente, assumiu o comando da área de agricultura e meio ambiente, operação que oferece algumas pistas do crescimento do grupo. Em 2020, a divisão de insumos, ligada a essa área, investiu R$ 2 milhões para quadruplicar a capacidade da fábrica. A previsão indicava que a expansão seria suficiente para a atividade dos próximos cinco anos. Há pouco tempo os cálculos foram refeitos e indicaram que a capacidade ampliada será esgotada em três anos.
A divisão de insumos está fortemente relacionada às lições de Okada cultivar alimentos. Para ele, é partir de um solo mais puro que se originam tanto hortaliças e frutas saudáveis para consumo humano como o alimento dos animais que também se tornarão alimento posteriormente. E quanto mais se respeitar a natureza no preparo dessa terra fértil mais ganharemos em termos de qualidade e saúde. “A agricultura natural não é um modelo; é um propósito baseado nas leis da natureza”, diz Homma.
O nome Korin (se pronuncia “Kôrin”, com a tônica na primeira sílaba) significa anéis de luz nos ideogramas japoneses. O logotipo da marca preserva a forma manuscrita pelo fundador da companhia, um reverendo japonês que morreu em 2013, depois de viver alguns anos de volta ao Japão. Tetsuo Watanabe chegou ao Brasil em 1962 com a intenção de fundar a Igreja Messiânica no país. Filho de um sacerdote de Mokiti Okada, ele teve a ideia de seguir os ensinamentos do fundador da igreja no Japão também na área alimentar.
O grupo começou com a divisão agropecuária, a maior até hoje. Inicialmente, se voltava ao consumo da comunidade messiânica. Mas, pouco a pouco, a produção ganhou escala e diversificação. O trabalho que começou com frangos e ovos hoje oferece outros produtos de origem animal, como peixes, além de café e grãos, como feijão e arroz, e até milho para pipoca.
A vantagem dos insumos biológicos, diz Homma, é atuar no solo e não na planta. Têm o propósito de tratar a terra ao invés de “adubá-la”. Para desenvolver esses bioinsumos a Korin tem um centro de pesquisas em Ipeúna. A divisão de começou a crescer em 2010, diz Homma, a partir da venda desses produtos a outras empresas interessadas na agricultura natural. “Era um tipo de produto muito raro no mercado”, diz.
A expansão da divisão de insumos cresceu ainda mais à medida que a Korin intensificou parcerias com pequenos agricultores. Espalhados em diversas regiões, além desses insumos, eles adquirem da Korin orientações sobre a técnica de agricultura natural.
Homma é descendente de japoneses, mas não tem tido muito tempo para assistir às competições em Tóquio. A Olimpíada coincidiu com o período de trabalho pesado de negociação de insumos. “Estamos em plena fase de plantio final de muitas lavouras”, disse.
Quando Okada lançou sua filosofia alimentar, na década de 1930, não havia a preocupação com agrotóxicos. Anos depois, o uso de pesticidas, entre outros, se tornou uma espécie de necessidade para a produção intensiva de alimentos. “Imaginava-se que esse era um mal necessário. Mas, aos poucos, a ciência foi dando respaldo a novos conceitos, respeitando a natureza”, afirma Homma, que desde os tempos de faculdade se interessou pelo trabalho de Okada e, consequentemente, sua doutrina religiosa.
O aumento do interesse do público por alimentos sem agrotóxicos abriu as portas para a Korin. Além das redes de supermercados e outros pontos do varejo, o grupo tem dez lojas próprias ou franqueadas em São Paulo, Rio e Brasília. Homma não revela planos de expansão. Diz apenas que as vendas têm crescido, em média, dois dígitos por ano, desde a fundação.
Segundo o executivo, a empresa não sofreu o impacto da pandemia. Ao contrário. Com o isolamento social, as pessoas passaram a preparar as refeições em casa, o que as levou a valorizar os alimentos que levam certificação de origem sem agrotóxicos.
Esses produtos são mais caros que os da agricultura e da pecuária convencionais. Mas quando questionado sobre preços e concorrência Homma tem a explicação na ponta da língua: “Se fala muito sobre o modelo não ser economicamente viável. Mas não é bem assim. Quando se joga com a natureza a seu favor a tendência é baratear o custo. No Brasil ainda se usam muitos produtos químicos para resolver problemas sanitários que o próprio modelo criou. Quando se coloca tudo isso numa planilha qual é o real custo de cada um?”
Nem todos os consumidores se queixam dos preços. Homma não esquece, por exemplo, o dia em que uma mulher foi até a empresa com o filho de 17 anos. Ela foi agradecer e apresentar o rapaz saudável, que cresceu comendo alimentos naturais.
Fonte: Valor Econômico