MAIS ALIMENTAÇÃO, MENOS INTERMEDIAÇÃO

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Paulo Rabello de Castro

O Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) tem tido uma jornada de sucesso como política social de acesso ao prato de comida, desde 1976, por uma lei (a de no. 6.321) assinada por Ernesto Geisel e pelo saudoso Mário Simonsen. O PAT se expandiu de modo a garantir, hoje, vales de alimentação e refeição a mais de 20 milhões de brasileiros, movimentando compras por cartão ou aplicativos, emitidos por operadoras, em cerca de R$ 200 bilhões anuais. A relevância social do PAT é inquestionável. Nem por isso devemos deixar de indagar sobre a eficiência operacional do Programa, uma vez que é o pagador de impostos que banca, em última análise, as imunidades tributária e previdenciária embutidas nesse benefício concedido pelos empregadores a seus colaboradores. Quase cinco décadas transcorreram sem esse necessário questionamento até que promulgada, na gestão anterior, a lei 14.442, de 2022, que previa sua regulamentação, agora agilizada pelo presidente Lula e sua equipe. Em quase meio século, o PAT não havia sido analisado e repensado em termos de sua eficiência operacional. É disso que se trata na celeuma armada em torno das medidas em vias de implantação.

Quando é a sociedade que financia um benefício social como o do PAT, é dever constitucional da gestão pública avaliar como esse ganho chega até os beneficiários e quanto disso fica pelo caminho como custo de intermediação entre os concedentes e os beneficiários. Quanto mais custosa a intermediação, menor será a vantagem social líquida do PAT. Quando a Constituição prescreve, no seu art. 37 (caput) que a Eficiência é princípio basilar da Administração, a lei magna está a exigir cuidado e atenção a cada real despendido no PAT, para que os bilhões de reais ali investidos de fato se convertam em alimentos adquiridos e consumidos pelos trabalhadores e suas famílias. O eventual lucro das operadoras de vouchers e seu fluxo de caixa são apenas saudáveis decorrências de um Programa eficiente, não podendo a situação financeira dos intermediários representar peso morto para os pagadores de impostos.

Ora, as atuais margens de intermediação do PAT são agressivas, justamente porque as operadoras sobrevivem na zona de conforto de uma era pré-digital, permitindo que a força desproporcional de um punhado de intermediários dos vales de alimentação e refeição crie "cunhas de ineficiência" entre os prestadores de alimentos e os portadores dos vouchers.

Essas “cunhas”, ou margens de ineficiência, se manifestam de duas maneiras muito claras: pela cobrança de taxas onerosas sobre os prestadores de alimentos e pelos prazos desmedidos de reembolso, que podem chegar a 60 dias para o comerciante, que fica no aguardo da conversão dos vouchers em dinheiro vivo. Enquanto isso, os recursos representativos dos vouchers já estão no caixa das operadoras. Ora, o elevado ônus financeiro dessa transação e a demora na sua liquidação são custos repassados (leia-se, peso morto) ao longo da cadeia, impactando os preços ao consumidor e, em última análise, reduzindo a potência do Programa.

É neste ponto que a nova regulamentação fará toda diferença, ao fomentar o princípio da concorrência. As principais inovações contidas na lei e no seu regulamento dizem respeito ao direito de portabilidade e a interoperabilidade. Os portadores do benefício poderão migrar de operadoras, assim fomentando mais concorrência e busca de eficiência na operação. Ao se estabelecer um teto para as taxas cobradas pelas operadoras aos comerciantes dos alimentos, e ao se aplicar um menor prazo de repasse do valor das compras ao estabelecimento afiliado ao PAT, o novo decreto estará estimulando outro ditame constitucional, o da ampla concorrência.

Os efeitos esperados são a maior eficiência econômica e o empoderamento dos detentores do direito à alimentação. Se a operadora insistir em práticas ineficientes e, para bancar isso, quiser impor condições onerosas de intermediação, acabará perdendo a preferência dos clientes.

Não se trata de querer transferir ganhos financeiros dos intermediários para o varejo alimentar. O que está em causa é a eliminação das “cunhas de ineficiência”. Os ganhos de eficiência se traduzirão em custos menores na cadeia alimentar e, portanto, em preços finais mais baixos. Numa palavra: teremos aumento do poder de compra do trabalhador, pois sua moeda-alimentação será valorizada por aceitação universal.

Paulo Rabello de Castro, 76, ex-presidente do BNDES e do IBGE, é doutor em economia pela Universidade de Chicago, consultor de empresas e autor de diversos livros sobre eficiência e políticas públicas, como “O Mito do Governo Grátis” (Edições de Janeiro), além de colaborador frequente de colunas em jornais e mídias digitais.


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