Crédito garantido por venda no cartão vira nicho disputado

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Em um ano em que o consumo patina, mas os pagamentos com cartões ainda crescem a taxas robustas, o sistema financeiro aumentou a aposta em linhas de financiamento que antecipam aos lojistas o recebimento dos recursos das compras feitas com o cartão de crédito. A competição pelos recebíveis de cartão do comércio é tamanha que as taxas dessas operações têm caído desde abril, mesmo com o Banco Central elevando o juro básico da economia.

Não é sem motivo que os bancos e as empresas que fazem o credenciamento dos estabelecimentos comerciais, como Cielo e Redecard, disputam a preferência do lojistas para fazer essas operações. A força da garantia dos recebíveis de cartão, que serve de lastro para a linha de crédito, faz dela o equivalente, na pessoa jurídica, do crédito consignado (com desconto em folha de pagamento) na pessoa física. Uma segurança que fez com que os bancos colocassem a modalidade na ponta da lança para oferta de crédito ao varejo de menor porte. E que explica por que as instituições financeiras vêm se desdobrando para simplificar a tomada desse crédito pelo comércio, na tentativa de atrair novos lojistas ou de aumentar o uso da antecipação por quem já trabalha com ela.

Em junho, segundo o Banco Central, a taxa média cobrada pelos bancos na antecipação de recebíveis de cartões era de 25,5% ao ano, cerca de seis pontos percentuais abaixo do que em igual período do ano passado (31,7%). Também é um juro menor do que o cobrado em abril deste ano (30,7%) e em maio (26,3%).

Estimativas de executivos do mercado de cartões dão conta de que pouco mais de um quarto das compras feitas com cartões de crédito no segundo trimestre foram antecipadas pelos lojistas por meio dos bancos ou credenciadoras, que também podem fazer essas operações. Em números absolutos, isso significa cerca de R$ 30 bilhões antecipados no período. De abril a junho, o volume financeiro total de compras com cartão de crédito foi de R$ 123,49 bilhões, avanço de 15,3% na comparação com o mesmo período de 2012.

No segundo trimestre, só os bancos desembolsaram R$ 9,35 bilhões em antecipação de faturas de cartões de crédito, segundo dados do BC. A cifra é 43,6% maior do que a apurada em igual período de 2013. Historicamente, os bancos respondem por 30% das antecipações e as credenciadoras - Cielo, Redecard e Santander -, pela maior fatia. Na Cielo, a única credenciadora a divulgar os volumes que antecipa, a cifra do segundo trimestre foi de R$ 10,58 bilhões, valor 71,7% maior do que o do mesmo período de 2012.

O Banco do Brasil lançou há poucos meses um crédito rotativo para empresas que usa os recebíveis de cartões como garantia. Como a empresa usa o que precisa no mês, o banco acaba pagando menos imposto e o crédito fica mais barato, afirma Asclepius Ramatiz Lopes Soares, gerente executivo de micro e pequena empresa do BB.

O BB tem usado a modalidade como parte da estratégia para ampliar a antecipação entre seus clientes. Tem selecionado empresas com domicílio bancário na instituição - que mantêm a conta corrente em que recebem os créditos de compras no cartão no banco - mas que não antecipam as faturas com o BB. No segundo trimestre, o estoque dessas operações avançou 5,5% na comparação com o primeiro trimestre, afirma Soares, sem dar detalhes sobre o desembolso no período. Na média dos bancos, o avanço do estoque dessa linha foi de 5,6%, para R$ 6,54 bilhões, no mesmo intervalo.

No caso do Santander, a antecipação tem sido o atrativo para fisgar novos correntistas entre pessoas jurídicas. "Para pequenas e médias empresas, é uma forma de encontrar uma taxa de juros que não consegue em linhas de capital de giro, por exemplo", afirma Reinaldo Assunção, superintendente executivo do banco. O banco cobra entre 1,7% e 3,5% ao mês para antecipação, e consegue as taxas mais baratas o lojista que faz antecipação de forma automática.

Só o braço de credenciamento do banco espanhol antecipou algo próximo de R$ 4,7 bilhões no primeiro semestre. Com atuação concentrada em pequenos e médios lojistas, que costumam acessar mais a linha, a instituição chega a antecipar mais de 30% dos valores que captura na parceria com a processadora GetNet. Esses valores incluem apenas o que o banco antecipa no âmbito de sua credenciadora e não crédito que concede, por exemplo, com base na projeção do que o varejo deve receber com cartão no futuro.

A Cielo, por seu lado, tem conseguido fazer com que o grande varejo também recorra às operações de antecipação de recebíveis. "Nós continuamos a crescer no varejo e aumentamos bastante a penetração no segmento de grandes contas", afirmou o presidente da Cielo, Rômulo de Melo Dias, na teleconferência de resultados trimestrais. Entre abril e junho, a credenciadora antecipou 16% do volume que capturou com lojistas. Um ano antes, esse percentual era de 10,5%.

A Cielo entrou nas operações de antecipação de recebíveis bem depois que sua rival, a Redecard, que não divulga mais seus resultados após fechar o capital. A Redecard, historicamente, antecipa cerca de 20% dos volumes que captura. Na Cielo, crescer em antecipação de recebíveis é uma forma de compensar receitas menores em outras frentes, já que a tendência das taxas de desconto cobradas de lojistas é de queda, graças à maior competição entre credenciadoras.

Do lado dos lojistas, a demanda por esse tipo de operação também ficou mais forte. "Em um cenário em que os bancos (em especial os privados) mantêm uma política de crédito mais restritiva em jogo, a antecipação pode ser a última opção de crédito para pequenos e médios lojistas", afirmam analistas do Credit Suisse, em relatório.

No Bradesco, a carteira de antecipação de recebíveis avançou 10,3% em 12 meses, pouco abaixo do que cresceu o estoque de operações de micro, pequenas e médias empresas do banco (11,2% na mesma comparação). Assim como o BB, o Bradesco vem tentando aumentar o número de empresas com domicílios bancários na instituição, ao mesmo tempo em que automatizou a contratação da antecipação. "É uma linha com perfil de risco muito parecido com o do consignado", afirma José Ramos Rocha Neto, diretor de empréstimos e financiamentos.



Veículo: Valor Econômico


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