Varejo resiste a repasses da indústria e troca marcas

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Na queda-de-braço com a indústria para saber quem paga a conta gerada pela alta dos preços das commodities, o varejo tem mostrado grande poder de resistência. Nas mesas de negociação, as novas tabelas de preços apresentadas pelos fabricantes têm sido recusadas total ou parcialmente. Com a dificuldade de repassar os novos custos ao consumidor final, as redes de varejo deixaram de comprar alguns produtos, substituíram outros por marcas mais baratas e até trocaram de fornecedor.
 

 
No mês passado, a rede de supermercados Bistek , que tem nove lojas em Santa Catarina, recebeu da indústria novas tabelas, com reajustes entre 7% e 14%. Walter Ghislandi, diretor comercial da empresa, conta que não comprou os produtos com novos preços. "Algumas indústrias estão vendo essa reação do mercado e adiam os repasses da nova tabela de preços ", diz. Em alguns casos, a Bistek decidiu substituir itens que ficaram muito caros por produtos similares nacional e importados.
 

 
O novo cenário levou à redução de cerca de 3% no mix de produtos da rede. "Decidimos não comprar dos fornecedores irredutíveis na negociação." Segundo o varejista, a maior pressão de preços veio dos fabricantes de menor porte. "Talvez as grandes indústrias tenham mais gordura para queimar."
 

 
Outra rede catarinense de supermercados, a Giassi, também negocia para evitar reajustes. Zefiro Giassi, dono da empresa, diz ter conseguido receber alguns produtos ainda com preços antigos. Em outros casos, deixou de comprar e passou a substituí-los por similares, abrindo espaço para marcas novas, que chegam com preços melhores do que as já conhecidas. "Tem sido uma ginástica", diz
 

 
No caso da Giassi, os maiores aumentos e a maior dificuldade de negociação vieram de fabricantes multinacionais. "Empresas menores aceitam mais as ponderações que fazemos. As grandes empresas vendem com o preço novo ou preferem não vender." O aumento de preços por parte da indústria nos últimos meses foi entre 7% e 8% nos produtos em geral, na avaliação do varejista, mas houve casos de itens que superaram com folga esse percentual, como os sabonetes, que subiram mais de 50%.
 

 
Com 45 lojas em 27 cidades gaúchas, a maioria na região metropolitana de Porto Alegre e no Vale dos Sinos, a rede de supermercados Unidasul, alterou cerca de 20% do mix de produtos para driblar os aumentos de preços nos últimos quatro meses. No período, a estratégia foi substituir itens mais caros, conhecidos como "marca líder", por similares mais baratos, as chamadas mercadorias de "primeiro preço", explicou o diretor comercial Augusto De Césaro.
 

 
Conforme o empresário, a rede procurou fazer as trocas de produtos mantendo os mesmos fornecedores, mas nem sempre isso foi possível. Os maiores aumentos, disse ele, ocorreram nos alimentos básicos, como arroz, feijão, trigo, derivados de soja e milho e carne bovina. Agora, diz De Césaro, os aumentos dos preços dos alimentos começam a perder fôlego. Segundo ele, o leite recuou 20% em comparação com o fim de junho devido ao aumento da produção no Rio Grande do Sul. A carne bovina também tende a cair, acredita o empresário. "O pior já passou", diz.
 

 
"Se tivéssemos aceitado o aumento da indústria, os preços estariam bem maiores", avalia o presidente da Associação Paranaense de Supermercados (Apras), Everton Muffato, sócio da rede que leva seu sobrenome, uma das maiores do Estado. "Se a indústria fala em aumentar 10%, propomos 5%", explica. Segundo ele, a decisão de não aceitar repasses exagerados, somada ao inverno menos rigoroso e à queda nos preços dos grãos, já deu resultados. A inflação no portfólio de produtos da rede, que foi de 3,5% em janeiro, na comparação com igual período de 2007, bateu em 8% em junho, mas diminuiu para 6% em julho e a expectativa é que caia mais em agosto.
 

 
O executivo diz que a média de aumento da indústria é de 5% a 10%. No caso de produtos derivados de commodities, por exemplo, cujos preços tiveram aumentos no mercado internacional, não deu para exigir repasse zero. Segundo Muffato, em 80% dos casos têm sido possível fazer acordo e, quando não há acerto, o varejista troca de marca, em especial nos produtos em que o cliente não costuma manter fidelidade.
 

 
Em Minas, a redução dos preços dos alimentos, captada nos indicadores de inflação recém-divulgados, já acalmou os ânimos nas mesas de negociação entre indústria e varejo. "Tivemos uma curva fortemente ascendente de preços, fazendo com que as negociações ficassem bastante acirradas, mas a situação já se reverteu substancialmente", diz Adilson Rodrigues, superintendente da Associação Mineira de Supermercados (Amis).
 

 
Segundo ele, a principal estratégia dos supermercados para conter a onda de remarcação foi a de buscar marcas alternativas, de âmbito regional e mais popular, fugindo da pressão por reajustes dos grandes fornecedores. Mas o que pesou mesmo, de acordo com Rodrigues, foi o comportamento do consumidor, que buscou substitutos para os produtos que registraram maior alta. "No caso do feijão, houve queda de 18% no volume de vendas físicas em maio", afirma o superintendente da Amis.
 

 
"Muitos produtos já apontaram para redução ou acomodação de preços, tornando as negociações mais fáceis", afirma Nelson Júnior, gerente de marketing da rede Bahamas, maior da Zona da Mata mineira, com 21 lojas . O caso da farinha de trigo é ilustrativo. Depois da forte alta, há 45 dias os preços não sobem. "O mesmo aconteceu com o óleo de soja, que já apresenta redução de preço de 5% a 7%." A mesma acomodação de preços foi detectada em Santa Catarina, pelas redes Bistek e Giassi. Nas duas, itens que subiram muito há quatro meses estão agora com preços em queda, como óleo de soja e seus derivados e trigo.
 

 
Para o grupo Mateus, maior rede varejista do Maranhão, a situação ainda é preocupante. . De acordo com Ilson Mateus, sócio da empresa, nos últimos três meses o faturamento dos supermercados caiu 5% ante igual período do ano passado. O maior problema, segundo ele, vem das carnes. "São produtos perecíveis, que não permitem que se faça estoque para segurar os preços. O jeito é remarcar mesmo", afirma. Desde maio, a alta acumulada é de 50%.
 

 
Para outros itens, Mateus tem buscado alternativas. Para arroz, óleo de soja e feijão - produtos que chegaram a dobrar de preço - a rede tem feito estoques para segurar os valores. "Está uma queda-de-braço dura, ninguém quer reduzir preço." Para conseguir fazer estoque, a empresa reduziu a armazenagem de produtos que não estão sofrendo aumento de preços, como itens de limpeza. Assim, sobra dinheiro para investir em alimentos. No caso do arroz, Mateus também trocou o fornecedor do Sul do país por agricultores do Maranhão. "Só nisso já ganho 15%, o custo do frete", afirma.
 

 
Veículo: Valor Econômico


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