Competitividade industrial chinesa é desafio para o país, diz Barros de Castro

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A indústria brasileira conta em vários segmentos com sofisticação técnica muito superior a de empresas chinesas, mas a história recente não recomenda confiar na diferença de estágio, disse ontem o economista e professor Antonio Barros de Castro. "Na China, há uma espécie de máquina armada em torno da competitividade. E eles são velozes. Quem fizer de conta que os chineses não existem vai morrer", avaliou.

 

Para ele, a China traz um desafio enorme para o Brasil. Está havendo uma "ruptura histórica em grande dimensão". Mas lembrou que o Brasil tem enormes oportunidades, por exemplo, na área de recursos naturais. "O uso dos recursos naturais é obrigatório. Somos os campeões da biomassa. Também podemos entrar na corrida mundial pela energia barata." Mas lembrou que, para avançar, é preciso ações como "deselitizar e multiplicar a pesquisa e desenvolvimento".

 

Assessor da presidência do BNDES, e professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Castro foi um dos organizadores do seminário para discutir os desafios para as economias nacionais frente à concorrência chinesa no contexto de crise mundial. E alertou : "Existe na China uma lógica econômica que não se dá por acidente".

 

Segundo o professor, é ingênuo pensar que as empresas lá são competitivas apenas porque pagam salários baixos. Pelo contrário, há toda uma estratégia em torno do baixo custo. Segundo ele, os chineses não se preocupam em usar estados da arte da tecnologia, buscam unir soluções que garantam eficiência e competitividade.

 

Castro disse que aplaude, mas avalia como insuficiente, a estratégia de inclusão social criada no governo Fernando Henrique Cardoso e que está sendo uma marca do programa de Lula, por meio da ampliação do Bolsa Família e de aumento sistemático do salário mínimo. Para ele, diante dos desafios do cenário mundial, o Brasil precisa buscar outros mecanismos para fortalecer a capacidade de compra da população. Aqui, há amplas oportunidades de ampliar o mercado interno, aumentando escala das empresas nacionais. Mas lembrou que para isso é preciso também baratear os bens, tornando-os mais acessíveis para uma camada maior da população.

 

Os chineses, além do foco na exportação, desenvolvem estratégias para ampliar o poder de compra interno. Nos dois dias de seminário, a discussão central foi em torno de entender o processo de crescimento avassalador da indústria chinesa e estratégias para o Brasil diante deste cenário.

 

Na tarde de ontem, o professor John Mathews, da Macquaire University, da Austrália, que escreveu um livro sobre o que caracteriza como "dragões multinacionais", mostrou que esses dragões, as multinacionais chinesas, cada vez mais se tornam competitivas por voltarem-se para novas tecnologias. Vão muito além dos bens baratos que tomam conta do mercado mundial e têm foco no redesenho de produtos, processos, reorganização da produção.

 

Segundo Mathews, a estratégia das grandes empresas chinesas começa, em muitos casos, com a compra de tecnologia, fazendo joint ventures, adquirindo participações minoritárias no exterior. Depois, as empresas inovam na forma de produzir e vão tirando espaço e até comprando empresas do Hemisfério Norte.

 

O consultor Mario Ripper, com trajetória profissional na área de tecnologia da informação e telecomunicações, citou como exemplo dessa estratégia a Hauwei, fabricante de equipamentos de telefonia. Com 21 anos e de capital fechado, a companhia vem registrando saltos no faturamento. Pulou de US$ 12 bilhões, em 2007 para US$ 18 bilhões no ano passado. Já é a sexta maior do mundo e tem 75% do faturamento fora da China. São 100 mil empregados, sendo 37 mil atuando em pesquisa e desenvolvimento. Segundo levantamento recente, a companhia, em 2008, já era a segunda no ranking entre as fabricantes de infraestrutura de tecnologia sem fio.

 

Para Ripper, esse desempenho teve como aliado o foco na ampliação no mercado interno, na disponibilidade de recursos financeiros oferecidos pelos bancos de desenvolvimento chineses e também uma estratégia de governo, fixada no início da década, que abriu o mercado para fabricantes estrangeiros, mas fixou obrigações de transferência de tecnologia e investimentos em segmentos estratégicos, como semicondutores, dentro da própria China.
 

 

Veículo: Valor Econômico


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