Empresas já se ajustam para demanda maior

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Medidas de incentivo do governo levam à recontratação e à revisão, para cima, de projeções de venda

 

Algumas empresas que atuam diretamente nos segmentos beneficiados pela prorrogação da redução de impostos e pela queda no custo de financiamento de bens de capital já projetam um ano com aumento de vendas na comparação com 2008 e com recontratação de pessoal. Companhias que demitiram no auge da crise estão readmitindo funcionários e outras, que concederam férias coletivas, reforçam a produção com temporários.

 

A redução do IPI para eletrodomésticos permitiu à Whirlpool , fabricante das marcas Brastemp e Consul, recuperar no segundo trimestre a queda registrada no trimestre anterior e a contratar 1,2 mil trabalhadores a partir de maio. O diretor de relações institucionais da Whirlpool Latin America, Armando Ennes do Valle Júnior, afirma que as vendas da empresa até março caíam em média 16%. Fogão, por exemplo, registrava queda de 20%. "Na primeira quinzena de abril, antes do anúncio do IPI, as vendas apresentavam queda de 15% a 20%. A medida chegou quando a indústria estava tirando o pé."

 

A Whirlpool operou com jornada reduzida no início do ano e em abril aventava a possibilidade de reduzir o quadro de funcionários. "Maio foi excepcional, as vendas cresceram 20% em relação a maio do ano passado. Junho aponta para crescimento de 15%", afirma Valle Júnior. Com isso, a empresa estima encerrar o primeiro semestre com produção igual à registrada no mesmo intervalo de 2008. Para o ano, a empresa voltou a prever crescimento de 4% sobre o ano passado - ao longo do primeiro trimestre essa projeção havia sido revista para uma queda de até 6%.

 

Valle Júnior diz que a recuperação da demanda pelo varejo em função do IPI reduzido obrigou a empresa a ampliar o quadro de pessoal. Desde maio, a Whirlpool contratou 1,2 mil trabalhadores por prazo determinado e, desse total, 300 já foram efetivados. "Agora é preciso entender o que vai acontecer com o consumo", diz Valle Júnior, sobre a possibilidade de novas efetivações. Ele acredita que a demanda crescerá de maneira mais linear nos próximos meses.

 

Patrício Mendizabal, presidente da Mabe, que fabrica produtos da linha Dako e GE no país, afirma que desde a redução do IPI para a linha branca, as vendas da empresa aumentaram de 20% a 30% em relação ao mesmo intervalo do ano passado, mas não sabe quanto é devido ao IPI reduzido.

 

No caso da Latina, que fabrica tanquinhos e tem 45% da receita associada ao produto, o aumento do volume de vendas foi de 30% no período de vigência do IPI, o que levou a uma expansão de 35% na produção. Para tanto, o presidente da empresa, Valdemir Gomes Dantas, diz ter elevado o número de funcionários em 10%, o que recompôs as demissões feitas em novembro. A empresa tem hoje 300 funcionários. "Com a prorrogação da redução do IPI, a garantia é que não haverá demissões", diz Dantas. O conjunto de medidas, que estabelece um cenário para o setor até dezembro, também permite ao empresário estimar um crescimento de 10% a 15% para a receita deste ano, em comparação a 2008.

 

Rodolfo França Jr., diretor da Lojas Insinuante, maior varejista de eletroeletrônicos do Nordeste, afirma que a rede manteve as encomendas de produtos que tiveram redução de IPI no mesmo patamar dos últimos dois meses. A prorrogação do incentivo, acrescenta, era uma medida esperada. Segundo ele, as indústrias estão conseguindo entregar os pedidos, mas os estoques estão em níveis muito baixos. "O mercado está trabalhando da mão para a boca, como se diz no setor", diz França. A indústria está vendendo tudo que produz. Como o abastecimento está muito ajustado, sem folga, qualquer problema de logística já é suficiente para provocar a falta de produtos nas prateleiras.

 

A prorrogação da redução das alíquotas de IPI sobre os materiais de construção está levando a fabricante pernambucana de tintas Iquine a ampliar seu quadro de funcionários em 10%. Com a contratação de 50 trabalhadores, a Iquine retorna aos níveis do ano passado. Segundo Leonardo Vasconcelos, gerente nacional de vendas da Iquine, o volume de tintas vendidas no primeiro semestre foi 3% menor que o do mesmo período do ano passado. A projeção para o ano, porém, com o empurrão da redução de impostos, é de um incremento de 8%. "Com a mudança no IPI, estamos reformulando todo o planejamento de produção", explicou. A fábrica, em Jaboatão dos Guararapes, na região metropolitana do Recife, já começou a operar em três turnos e nos fins de semana. As mesmas medidas serão adotadas em Serra (ES).

 

O presidente do Sindicato das Indústrias de Cerâmica para Construção e de Olaria de Criciúma (Sindiceram), Otmar Müller, acredita que entre agosto e setembro o setor poderá realizar contratações de temporários e novas encomendas de matérias-primas como efeitos da prorrogação da isenção de IPI. Ele avalia que as vendas no mercado interno poderão ficar estáveis nos próximos meses em relação ao ano passado. De março a maio, o setor apresentou queda de 3% nas vendas no mercado interno e de 39% nas exportações.

 

Segundo Müller, o setor fabrica itens para o acabamento da obra (portanto, etapa final de uma construção), e por isso ainda não sentiu efeitos concretos da desoneração, o que pode ocorrer agora neste segundo semestre.

 

Para Helio Dourado, dono da Premo, fábrica de pré-moldados para a construção civil, houve um aumento na produção de concreto armado da ordem de 20% este ano, em comparação com 2008, e isto incidiu diretamente na compra de cimento, que responde por 30% do custo de produção. Dourado não atribui este aquecimento da produção à redução do IPI sobre o cimento e sim aos pedidos fechados em 2008. "Foram fechadas vendas que somam R$ 100 milhões e ainda faltam faturar R$ 60 milhões", disse. As vendas em 2009, por enquanto, estão modestas. Foram fechados R$ 20 milhões em contratos novos. Ele espera que o Programa Minha Casa Minha Vida, impulsione mais os negócios que a própria redução de IPI.

 

O diretor-comercial da Marcopolo para o mercado interno, Paulo Corso, acredita que a redução da taxa de juros e o aumento dos prazos de financiamento, incluídos no pacote do governo, devem "alavancar" as vendas de ônibus no segundo semestre. A expectativa é que os negócios retornem a um nível próximo ao observado na primeira metade de 2008, antes da crise. No primeiro trimestre de 2009 a produção de carrocerias no país caiu quase 37% sobre 2008.

 

As novas medidas do governo para estimular a economia incluíram a ampliação dos prazos de financiamento de ônibus com linhas do BNDES de 72 para 96 meses, com redução de 10,25% para 7% ao ano na taxa de juros. De acordo com Corso, entre 60% e 70% das vendas da Marcopolo no mercado interno são financiadas pela instituição. Corso afirmou também que a empresa tem condições de atender ao crescimento da demanda previsto para a segunda metade do ano sem novos investimentos nem contratação de pessoal. A companhia recorreu à redução de jornada com a paralisação das duas fábricas de Caxias do Sul (RS) durante nove dias em fevereiro e março sem desconto salarial e agora dispõe de um bom estoque de banco de horas para suportar o aumento da produção.

 

O diretor de relações governamentais da Ford para América do sul, Rogelio Golfarb, também considera que a redução do IPI mostrou-se eficaz para estimular as vendas de automóveis no segundo trimestre e deve ajudar a manter a demanda aquecida no terceiro trimestre. "A redução do IPI permitiu que as vendas de automóveis se mantivessem no nível de 2008. Nos Estados Unidos, o mercado teve queda de 36%, na Argentina as vendas caíram 34%, e na Europa houve queda de 14,5%. Essa medida anticíclica teve um impacto bastante importante", compara.

 

Ele considera que a redução da TJLP será fundamental para estimular uma recuperação no setor de bens de capital e na área de caminhões, que acumulam no ano queda de 30%. A Ford, diz, não pretende antecipar planos de investimento ou realizar contratações em função das medidas do governo. "Ainda há uma capacidade ociosa grande para ser preenchida. Mas a redução dos juros é importante porque sinaliza um cenário mais favorável para o investimento no próximo próximo ano."

 

O presidente da distribuidora de aço Rio Negro, Carlos Loureiro, afirma que a redução do IPI para automóveis ajudou a dirimir a queda na produção de aço no país, de 35% no acumulado até maio. Para o setor siderúrgico, porém, a recuperação de grandes demandantes como os setores de caminhões, bens de capital e infraestrutura é fundamental para reverter esta queda. "O governo mexeu na alavanca certa, que é o custo do investimento. Agora os juros foram para um nível que permite antecipar investimentos. Esse pacote vai gerar mais uso de aço que o anterior", avalia.

 


Veículo: Valor Econômico


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