Marcas brasileiras investem e ganham espaço na Argentina

Leia em 5min 40s

Fabricantes como Penalty e Vulcabrás elevam produção local e superam barreiras protecionistas

 


Em rápido crescimento, as marcas brasileiras de calçados esportivos e sandálias caíram no gosto dos argentinos, numa estratégia de negócios bem-sucedida que superou até mesmo a imposição de barreiras protecionistas pelo governo. Com ações agressivas de marketing e uma aposta recente na produção local, adotada em parte dos casos como resposta às licenças não automáticas, que tornaram mais difíceis as importações provenientes do Brasil, marcas como Penalty, Olympikus, Havaianas e Ipanema se popularizaram na Argentina. Antes meras exportadoras, suas fabricantes aceleraram o processo de internacionalização e estão expandindo os investimentos no país vizinho.

 

Desde o ano passado, quando o governo da presidente Cristina Kirchner freou a liberação das licenças para importar calçados, quem já estava na Argentina resolveu aumentar a produção. No período mais problemático, em meados de 2009, as licenças chegaram a demorar até 270 dias para serem liberadas - o prazo fixado pela Organização Mundial do Comércio (OMC) é de 60 dias. Segundo relato de empresários brasileiros, o governo deixou claro que liberaria mais rapidamente as importações de quem também expandisse a sua produção local. Foi o que aconteceu, mas as calçadistas brasileiras aproveitaram a circunstância para reforçar suas marcas próprias no mercado argentino, que produziu 95 milhões de pares de calçados em 2009 - o Brasil fabrica, por ano, quase oito vezes mais.

 

Um exemplo é o da Penalty, que praticamente quadruplicou seu faturamento na Argentina, saindo de 13 milhões de pesos em 2003 para 48 milhões de pesos no ano passado - um real vale aproximadamente dois pesos. A meta para este ano é dar um novo salto e alcançar 70 milhões de pesos, produzindo 900 mil pares de calçados esportivos, 70% mais que em 2009.

 

E pelo menos metade das vendas na Argentina será atendida com a produção local, principalmente de chuteiras para futebol society e futsal, o ponto forte da companhia. Há pouco mais de um ano, 90% dos calçados vendidos eram importados do Brasil. "As licenças não automáticas de importação reconfiguraram o mercado argentino de calçados", diz o diretor internacional da Penalty, Alexandre Estéfano.

 

Para o executivo, trata-se de "dançar conforme a música". A Penalty não abriu fábrica própria na Argentina e optou por fazer uma "associação estratégica" com uma indústria local, mas é responsável por todos os investimentos na linha de produção. "Por mais que estejamos aqui há 12 anos, operando de forma direta, é melhor ter um parceiro local que saiba bem como tudo funciona", argumenta.

 

Conhecendo bem a eficácia dos patrocínios esportivos, a empresa fechou um contrato de US$ 2 milhões, por três anos, para estampar sua marca na camisa do Vélez Sarsfield. Em pleno centenário, o clube tentará conquistar novamente o título mais importante do continente e tem - deixando a rivalidade de lado - a torcida da fabricante brasileira. "No Brasil, patrocinamos nove times e não colocamos nenhum na Libertadores da América", lamenta.

 

Tradicional patrocinadora das seleções masculina e feminina de vôlei, a Olympikus entrou também na camisa de dois times de futebol na Argentina: a do Racing (um dos mais populares do país e cujo torcedor mais ilustre é o ex-presidente Néstor Kirchner) e a do Lanús (que disputa a Libertadores).

 

A marca é xodó da Vulcabrás, que comprou em 2007 a fábrica da calçadista Indular em Coronel Suárez, na Província de Buenos Aires. De menos de 500 empregados na época, a indústria emprega hoje 4 mil funcionários e produz 15 mil pares por dia. "O caminho natural da empresa é a internacionalização e a Argentina foi o nosso primeiro passo", diz o presidente da Vulcabrás, Milton Cardoso.

 

Além da Olympikus, a Vulcabrás fabrica calçados da Reebok, sob licenciamento. A empresa atua desde 2002 no país vizinho, vendendo seus produtos, e resolveu instalar-se diretamente por causa do bom desempenho das vendas. Em outubro, completou a terceira fase de ampliação de sua planta argentina, após investimento de US$ 8,3 milhões. "Queremos estar perto dos nossos principais mercados", afirma Milton Cardoso. "É a melhor forma de melhorar o abastecimento e acompanhar a preferência dos consumidores."

 

Neste ano, a meta da Vulcabrás é fabricar em Coronel Suárez 70% dos calçados que vende na Argentina. Em 2008, primeiro ano completo de produção local, a unidade era responsável por apenas 30% das vendas. O restante provinha de importações. Essa relação praticamente se inverteu. Com linhas para uso casual, futebol, vôlei e corrida, a Olympikus tem ganhado cada vez mais espaço no país vizinho, segundo Cardoso.

 

As sandálias Ipanema, da Grendene, também tem sido produzidas na unidade argentina da Vulcabrás. Neste verão, a Ipanema, que tem a modelo Gisele Bündchen como garota-propaganda, inclusive na Argentina, chegou pela primeira vez às lojas do país por meio de produção local. "Na Argentina, há uma concentração da demanda no verão", afirma o diretor de relações com investidores da Grendene, Francisco Schmitt.

 

A Ipanema disputa a preferência do consumidor argentino com a Havaianas, da Alpargatas, com presença farta nas lojas de Buenos Aires - do comércio popular aos shoppings mais badalados. A Alpargatas Argentina é a maior empresa de têxteis e calçados do país e abriu a filial brasileira em 1907. As duas empresas se separaram em 1983. Em 2007, a São Paulo Alpargatas, controlada pela Camargo Corrêa, adquiriu 60% da calçadista argentina e agora busca fechar o capital da companhia na Bolsa de Buenos Aires, com uma oferta pública de compra de ações válida até 12 de março e que deverá exigir investimentos de US$ 25 milhões.

 

"Queremos investir mais, continuar crescendo e gostaríamos de ter controle total da administração", diz o presidente da Alpargatas, Márcio Utsch. Com a marca Topper - originalmente da Argentina, mas que ganhou vida própria e agora tem sido revitalizada no país de origem -, a Alpargatas diz ter 32% do mercado local de calçados esportivos. No Brasil, sua fatia nas vendas é bem mais modesta e ronda os 10%. A Havaianas, apesar da liderança no segmento, enfrenta na Argentina um desafio curioso: ao contrário do que ocorre no Brasil, ela ainda não é sinônimo de sandálias de dedo, conhecidas no país como "ojotas". Mas a história já começa a mudar, garante Utsch, graças ao avanço de 30% a 40% das vendas nos últimos quatro anos. "Em lugares como Palermo ou Recoleta o nome Havaianas está pegando", diz, referindo-se aos bairros mais nobres de Buenos Aires.
 

 

Veículo: Valor Econômico


Veja também

Inflação e dados do varejo são destaques nesta semana

Indicadores poderão influenciar nas decisões do Banco Central na próxima reunião do Copom so...

Veja mais
Classe A ganha mais 303 mil famílias

Crescimento, porém, não muda participação no total da população: mais ricos ai...

Veja mais
Comércio: R$ 55 bi perdidos com feriados

As perdas sofridas pelo comércio de bens, serviços e turismo por causa dos 12 feriados ocorridos em dias &...

Veja mais
Quase 17 mil empresas já importam da China

Comércio exterior: Em 4 anos, perfil dos grandes compradores mudou   O avanço da China no fornecime...

Veja mais
Demanda doméstica pode fazer Brasil crescer 7% este ano, diz criador do Bric

O Brasil pode alcançar um crescimento próximo a 7% em 2010, devido à força "excepcional" da ...

Veja mais
Brasil tem 15 marcas entre as 500 mais valiosas do mundo

O número de marcas brasileiras presentes na lista das 500 mais valiosas do mundo saltou de apenas seis em 2009 pa...

Veja mais
Brasil e Argentina vão estudar integração em setor industrial

Encontro entre a delegação brasileira, liderada pelo secretário de Comércio Exterior do Mini...

Veja mais
Vendas crescem acima de 7% na primeira quinzena

As vendas a prazo cresceram 7,8% na primeira quinzena de fevereiro, na comparação com o mesmo perío...

Veja mais
Indicadores mostram que recuperação econômica ainda é frágil

O ano de 2010 foi saudado como sendo aquele no qual o Brasil se destacaria no cenário global e enterraria de vez ...

Veja mais