Cai fatia argentina nas importações do Brasil

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Relações externas: Participação de produtos "made in Argentina" nas compras brasileiras recua de 9,7% para 8,8%


    
Em meio às turbulências do Mercosul, a Argentina vive uma deterioração no comércio com o Brasil, que é seu principal parceiro mundial. De 2003 a 2009, período que coincide com o governo Lula, os produtos argentinos perderam participação nas importações brasileiras. E pior: em sete dos nove setores mais dinâmicos, que representam 80% do crescimento das importações nos últimos sete anos, houve perda da fatia dominada por bens " made in Argentina " .

 

É isso o que revela um levantamento feito pela consultoria portenha Abeceb.com, a pedido do Valor. Do total de mercadorias importadas pelo Brasil, a fatia dos produtos argentinos caiu de 9,7% para 8,8%. Até 2009, ano de forte encolhimento do comércio bilateral, a queda havia sido ainda maior e a participação havia chegado a 7,8%.

 
 
Isso não significa que, durante o governo Lula, tenha havido redução nas importações da Argentina. Pelo contrário. Elas aumentaram 141%, passando de US$ 4,6 bilhões em 2003 para US$ 11,2 bilhões em 2009. Mas o crescimento foi bem menor do que o de outros fornecedores, como a Ásia (305%), os demais países da América Latina e do Caribe (170%), a África (157%) e a Europa Oriental (156%). Só as importações oriundas da União Europeia (124%), dos Estados Unidos (111%) e do Oriente Médio (93%) aumentaram menos.

 

Para o economista Dante Sica, diretor da Abeceb.com e ex-secretário de Indústria da Argentina, os números comprovam a existência de uma série de " restrições não tarifárias que ainda existem no Mercosul " e podem desestimular o crescimento do comércio intrabloco. O fato, porém, na opinião de Sica, é que o Brasil está diversificando seus parceiros - também nas exportações - em velocidade muito maior do que o vizinho. " E o resultado disso é que a Argentina está cada vez menos no foco de atenção dos brasileiros " , avalia.

 

Enquanto o fluxo de comércio do Brasil com a China e a União Europeia é maior do que com a Argentina - e a Venezuela já rivaliza como maior destino das exportações na América do Sul -, o mesmo não ocorre do lado de baixo da fronteira. O Brasil continua sendo, para a Argentina, o principal mercado para seus produtos e o maior país fornecedor de suas importações.

 

Dos dez setores em que o Brasil mais aumentou suas compras externas no governo Lula, oito tiveram queda da participação argentina: máquinas e aparelhos mecânicos, combustíveis minerais, máquinas e aparelhos elétricos, produtos químicos orgânicos, instrumentos e aparelhos óticos e de fotografia, produtos farmacêuticos, plásticos e suas manufaturas. A Argentina ganhou mercado em apenas dois setores: automóveis e suas partes - atualmente 51 de cada 100 veículos fabricados no país, favorecidos pelo acordo automotivo, são vendidos para o Brasil - e adubos e fertilizantes.

 

Para o secretário de Comércio Exterior do Brasil, Welber Barral, a perda de participação argentina pode ser explicada por três fatores distintos. A imposição de travas ao comércio bilateral, como as licenças não automáticas, estimula compradores brasileiros a buscar fornecedores com maior previsibilidade. Além disso, restrições do governo argentino a exportações de alguns produtos para todo o mundo, não só ao Brasil, diminuíram sua participação no mercado brasileiro - foi o caso recente do trigo, por exemplo, no qual os moinhos têm buscado se abastecer com matéria-prima da França e Rússia.

 

Por último, afirma o secretário, o real forte e o crescimento da classe média sofisticaram hábitos de consumo. " A Argentina investiu e tem produzido excelentes produtos de consumo, como o azeite de oliva, mas o câmbio facilitou a procura, pela nova classe média, de produtos de outras partes do mundo " , explica Barral, que participará nesta semana de uma série de reuniões bilaterais, em Buenos Aires.

 

Na quinta e sexta-feiras, os ministros Miguel Jorge (Desenvolvimento), Celso Amorim (Relações Exteriores) e Guido Mantega (Fazenda) se reunirão com seus equivalentes argentinos para discutir o comércio entre os dois países. O encontro faz parte da agenda definida em novembro pelos presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Cristina Kirchner, que prometeram aumentar a frequência das reuniões de altos funcionários para evitar os atritos bilaterais. Em março, Lula e Cristina devem ter nova reunião, também em Buenos Aires.

 

Nesta semana, o governo deverá acenar com a retirada de produtos argentinos, como alho, do sistema de licenciamento não automático das importações. Para isso, no entanto, pretende obter sinais de que a Argentina reduzirá o número de produtos brasileiros sob o mesmo mecanismo. Outro argumento de Brasília é que, com a recuperação da economia e o real ainda forte, as multinacionais brasileiras veem oportunidade de compra de ativos argentinos. Mas, para isso, precisam de previsibilidade no comércio.

 

Nos últimos meses, produtos como calçados e autopeças do Brasil começaram a ter liberação mais rápida na alfândega argentina, que já chegou a demorar 240 dias para emitir as licenças não automáticas. O Ministério da Produção, na Argentina, também pode anunciar a aceleração dos trâmites para o setor de pneus.
 

 

Veículo: Valor Econômico


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