Companhias vivem o desafio de se arriscar no metacommerce

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Jogos eletrônicos com seus avatares são o passaporte para zona virtual de negócios

 

O mundo do consumo vive de ondas e há boas chances de o varejo estar assistindo, agora, o início de um novo movimento que tentará deixar para trás o que se conhece hoje por comércio eletrônico.

 

Está em andamento a construção do “metacommerce”, plataforma proveniente do metaverso, o espaço virtual coletivo e hiperrealista, oriundo dos “games”, e os grandes grupos de consumo e tecnologia desenham ações para tentar ganhar dinheiro com isso.

 

No comércio, isso ganhou força a partir da metade do ano passado, depois que o Facebook anunciou foco total no metaverso, e a partir da acelerada entrada de novos usuários em ambientes 3D, em salas de jogos e em redes sociais. Há 2,8 bilhões de “gamers” no mundo que gastaram US$ 200 bilhões em jogos em 2021. Na linha de frente desse pelotão com projetos no “metacommerce” estão a Epic Games, com seu Fornite, a Microsoft, dona do Minecraft, o Roblox e a rede social Imvu.

 

Neles, as pessoas (no caso, os seus avatares) conversam, jogam, assistem shows e fazem compras virtuais – com moeda digital e real, em alguns casos. No formato em discussão, alguém numa plataforma de jogos qualquer poderá assistir a um megaconcerto, e, usando seu avatar, fazer um pedido num fast-food instalado na arena do show – para, então, receber em casa o seu combo com sanduíche. As empresas estão de olho nessa venda de produtos e serviços, ainda muito incipiente. A discussão hoje está em como estruturar esse modelo complexo e fazer isso ganhar velocidade.

 

Em relatório de setembro, de 12 páginas, o Morgan Stanley diz que se acharem um formato rentável, as vendas digitais pelas plataformas 3D podem adicionar 10% às receitas das marcas de luxo até 2030, atingindo 50 bilhões de euros. E aumentar os lucros em até 25%. Isso inclui as NFTs, espécie de certificado digital que confirma a posse de um bem virtual. Gucci, Channel, Balenciaga, Dolce & Gabanna e Ralph Lauren vêm, entre 2020 e 2021, lançando ações com marcas ou produtos (parte deles pagos) em plataformas de jogos.

 

Em 2021 foram US$ 2 bilhões gastos em headsets de realidade ampliada e virtual no mundo. Para 2026, a Omdia Research projeta alta de 148%, para US$ 16 bilhões. Segundo o Morgan, 53% desses headsets são usados em “games”, a porta de entrada do metacomércio.

 

Para consultores, está claro que o formato atual de venda on-line está ficando ultrapassado, especialmente para as gerações Z e Alpha, com menos de 25 anos. É nesse vácuo que o metacomércio quer avançar. “Enquanto vocês se ocupam pensando no seu ‘omnichannel’ [unificação do físico e on-line], a geração com pouco mais de 20 anos é ‘app first’ desde sempre, vive e gasta o equivalente ao PIB da Islândia no TikTok e já abraçou realidade aumentada e realidade virtual faz tempo”, diz Kate Ancketill, CEO da consultoria GDR, em apresentação sobre metacomércio na semana passada, em Nova York.

 

Para Dedrick Boyd, consultor que estuda tecnologia e consumo há 15 anos, o modelo de venda on-line no mundo hoje é pouco interativo e sem graça – e as novas gerações querem fazer compras se divertindo. “Os clientes clicam em páginas intermináveis de descrição de produtos sem nunca se conectar emocionalmente com eles”, diz Boyd em artigo. “Até 2035, estima-se que 80% da atividade de compra será online, e não será no modelo atual, pouco imersivo”.

 

Na visão de Luiz Marinho, sócio-diretor da consultoria Gouvêa Malls, “o ‘metacommerce’ não é só outro ambiente de compras, mas um novo estilo de vida, de relações pessoais, que une tudo o que a tecnologia oferece à indústria de consumo, como 5G, blockchain, realidade virtual e aumentada e inteligência artificial”.

 

Para não se tornar uma venda de nicho, o seu desenvolvimento depende da entrada de mais pessoas nos mundos virtuais e aumento nas opções de equipamentos que possibilitem a experiência virtual. Facebook, Microsoft e Apple vêm estudando isso. Hoje, os “heasets” de realidade ampliada custam até US$ 2 mil (há os de US$ 299 do Facebook, mas de baixa resolução). Ainda é preciso ter banda larga potente, com 5G mais disseminado.

 

Em outras palavras, é algo caro e leva tempo. O Facebook, que em 2021 mudou seu nome para Meta, anunciou gastos de até US$ 10 bilhões para construir o seu metaverso, que incluirá ações em consumo. Mas para analistas, é difícil acreditar que essas plataformas sobreviverão, no longo prazo, bancando esses mundos 3D de graça por muito tempo, sem entrada de marcas parceiras.

 

“Além disso, cada rede social ou ‘game’ quer ter o seu próprio ‘meta’. Alibaba e Tencent registraram vários nomes nos últimos meses, por garantia. Serão gastos bilhões, e as pessoas pularão de um metaverso a outro. É confuso, e vai criar uma guerra de ações e de preços. Não é sustentável”, diz Marinho.

No Brasil, além dos custos dos equipamentos em dólar, há outras barreiras de aspectos práticos.

 

O 5G só estará espalhado pelo território nacional em 2029, segundo o governo. E há limitações logísticas. “Uma coisa é você atrair multidões para seu ambiente digital, fazendo shows ou instalando lojas dentro de jogos. Outra coisa é oferecer a experiência completa, com a venda pelo metaverso e a entrega do produto na casa do cliente, em poucas horas”, diz Eduardo Terra, sócio da BTR Educação e Consultoria, que abordou o tema num seminário dias atrás.

 

Terra lembra que, o que se vê hoje, tem muita relação com a proposta do “app” Second Life, que nasceu em 1999, mas perdeu popularidade. O fundador Philip Rosedale voltou à empresa neste mês para acelerar seu projeto de metaverso. “O Second Life foi uma primeira tentativa de metaverso, mas faltava tecnologia e maturidade dos consumidores para que evoluísse. E a pandemia também ajudou agora a explodir a discussão do ‘metacommerce’ ”, diz ele.

 

Por aqui, no varejo as experiências são basicamente com assistentes virtuais, como a Lu do Magazine Luiza, e o personagem Baianinho da Casas Bahia, além das ações de venda on-line ao vivo, algo bem distante do metaverso.

 

Maren Lau, vice-presidente de América Latina da Meta diz que “muitas das estratégias que já funcionam em 2D seguirão sendo aplicáveis em 3D”. E acredita que, num prazo de 10 a 15 anos, as marcas poderão criar experiências mesclando vida real e virtual e “abrindo possibilidades de negócios hoje desconhecidas”.

 

No Brasil, ela diz que a Avon patrocinou uma das provas da edição 2021 do Big Brother Brasil (BBB), com um jogo em realidade aumentada que levava a experiência do programa para o Instagram e Facebook. E a Fiat lançou o Fiat Pulse, com um filtro de realidade ampliada que permite aos clientes “visualizar” o carro em sua garagem.

 

Para citar outros exemplos mais avançados no mundo, o Carrefour vem promovendo a sua loja ecológica de produtos saudáveis no jogo Fortnite há cinco meses. Nela, jogadores podem se curar com vegetais e frutas, recuperando pontos e continuando na partida (não há venda de itens ainda). O Alibaba criou ações no seu site de compras chinês, o Taobao – onde consumidores testaram roupas 3D em seus avatares, em agosto passado. Havia roupas de marcas como Prada, Hugo Boss e Alexander McQueen. Em outubro, a Hyundai lançou o Hyundai Mobility Adventure, um espaço virtual no Roblox no qual os avatares podiam experimentar carros e interagir entre si.

 

Redação SuperHiper 


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