Pão de Açúcar, 60, tem novos desafios

Leia em 5min 50s

Após reestruturação, Diniz afirma que empresa está pronta para voltar a crescer e enfrentar gigantes estrangeiros.Para celebrar data, todas as redes do grupo fazem liquidação, e vinhos comemorativos com o nome do fundador são lançados

Cada uma das 575 lojas do Grupo Pão de Açúcar tem, num pequeno altar, a imagem de Nossa Senhora de Fátima, abençoada por um padre no dia da inauguração.
Para manter a tradição católica, iniciada pelo fundador Valentim Diniz, em 1948, a empresa resolveu abrir as comemorações dos 60 anos da empresa com uma missa de Ação de Graças no Mosteiro de São Bento, celebrada na noite de sexta-feira.

 

Para manter outra tradição da família, que tem varejo no sangue, foi organizada uma grande promoção para celebrar os 60 anos completados hoje. Nela, foram unidos em esforços de venda, pela primeira vez, todas as redes do grupo: Pão de Açúcar, CompreBem, Sendas, Extra, Extra Fácil, Extra Perto, Extra Eletro e os canais de comércio eletrônico.

 

"Estamos prontos para crescer novamente", afirma Abilio Diniz, presidente do conselho do grupo, que anunciou investimentos de R$ 1 bilhão para 2009, com a abertura de cem novas lojas. "É um momento excelente o que a companhia está vivendo."

 

A campanha de aniversário recebeu investimentos de R$ 12 milhões e prevê aumentar as vendas da rede em 15%, em relação ao mesmo período de 2007, nos primeiros dez dias da promoção. Apenas em um dia da campanha, foram vendidos 1.500 televisores.

 

"Poucas empresas chegam aos 60 anos fortes, jovens, com sucesso, como o grupo, principalmente com forte desempenho em resultados e vendas", diz Diniz. "Não somos de muita comemoração, mas temos de vibrar um pouquinho com o momento que estamos vivendo."

 

Novo caminho

 

Em meio às celebrações pelos 60 anos, no entanto, a empresa que nasceu como uma doceria na rua Brigadeiro Luís Antônio, nos Jardins, tenta encontrar seu caminho.

 

Única rede varejista de alimentos de capital aberto, a empresa sofre cobranças mais fortes do que seus concorrentes, que não abrem números. "O Grupo Pão de Açúcar vem perdendo posições relativas no mercado de bens de consumo corrente", diz Claudio Felisoni, coordenador do Provar (Programa de Administração de Varejo), da USP (Universidade de São Paulo). "Tanto em alimentos como em bens duráveis e semiduráveis."

 

Enquanto isso, os concorrentes avançam. O Brasil é prioridade para o grupo francês Carrefour há muitos anos. O gigante varejista conquistou a liderança no país após comprar o Atacadão, em 2007.

 

Já o maior grupo varejista do mundo, o americano Wal-Mart, que por anos dedicou pouca atenção a mercados fora dos Estados Unidos, resolveu voltar-se para emergentes diante das incertezas na maior economia do mundo e do avanço dos países em desenvolvimento.

 

No mês passado, o Wal-Mart anunciou investimentos de R$ 1,8 bilhão, a serem aplicados na abertura de novas lojas no Brasil. O Pão de Açúcar reagiu.

 

"Também temos poder de investimento", diz Diniz. "Estamos atentos ao movimento da concorrência, mas nos preocupamos muito com a rentabilidade e o valor ao acionista."

 

Reestruturação

 

Foi exatamente essa preocupação que levou à troca de comando da rede, no fim de 2007.

 

O reestruturador Cláudio Galeazzi assumiu a presidência executiva cortando algumas posições-chave e fornecedores, investindo em tecnologia e distribuição e dando maior independência a cada loja. "O Cláudio é um comandante como deve ser", diz Diniz. "O líder tem de ser equilibrado, tem de ter humildade, saber ouvir, conciliar, negociar e, ao mesmo tempo, ser tolerante e firme."

 

Mais do que direcionar as bandeiras a determinados públicos, Galeazzi criou um sistema no qual o abastecimento da loja é adequado ao bairro, e não apenas à marca que a unidade carrega. Até então, todas as compras e as entregas eram feitas sem diferenças locais.

 

"Estamos de volta às origens", diz Diniz, que afirma lembrar-se do dia da abertura da primeira loja, quando acompanhava seu pai. "É difícil encontrar time que conheça tanto o que está fazendo e que esteja lutando e trabalhando tão unido. Só pode ser uma equipe vencedora e sair um trabalho vitorioso."

 

O empresário tinha feito mea-culpa durante a troca de comando, em dezembro: preocupado em deixar a empresa menos dependente de sua figura, acabou ficando distante do dia-a-dia. Decidiu, então, ficar mais próximo, fazendo valer seu papel de representante dos acionistas.

 

"O dono sempre tem de estar presente", diz Diniz. "Os acionistas atuam por meio de governança corporativa, mas nunca deixam de exercer seu papel, que é de comando da empresa."

 

Os primeiros resultados puderam ser sentidos no último trimestre, quando a rede apresentou forte redução de despesas e crescimentos importantes em receita, lucro operacional e, também, lucro líquido.

 

"Acreditamos que o Grupo Pão de Açúcar está empenhado na sua proposta de melhorias operacionais", escreveu o analista Renato Prado, do Banco Fator. Houve avaliações semelhantes de outros bancos, que também destacaram as dificuldades futuras esperadas para a empresa em seus relatórios.

 

Crise

 

Maior empresa do setor nos anos 1980, com mais de 600 lojas, o grupo chegou à beira da insolvência dez anos depois. Mais de cem lojas foram fechadas -inclusive a operação internacional- e quase 40% dos funcionários foram demitidos.

 

Entre os motivos da crise, estavam a expansão desenfreada da empresa, desgovernos nas políticas macroeconômicas durante o período e uma intensa disputa familiar pela sucessão do grupo.

 

O seqüestro de Abilio, no fim de 1989, foi outro marco dos anos difíceis do grupo. Mas, depois de cortes e reestruturações, a empresa voltou a se tornar uma potência, ocupando a liderança do mercado de 2000 até o ano passado.

 

No auge da crise, Diniz tentou vender a rede por US$ 200 milhões. Não encontrou compradores. Em 1999, vendeu parte do grupo para o francês Casino e, em 2005, 50% do controle, por US$ 860 milhões. A rede vale hoje cerca de US$ 3 bilhões.

 

O fundador Valentim, morto em março, aos 94 anos, também está sendo homenageado nos 60 anos da rede.
Foram lançados vinhos comemorativos com a marca Valentim, nas versões malbec e espumante.

 

"Estamos trabalhando num cenário de continuidade do crescimento em 2009, com inflação em queda e tranqüilidade para continuar investindo", diz Diniz. "Nosso plano para o ano que vem será bastante agressivo."

 


Veículo: Folha de S.Paulo


Veja também

Mão-de-obra e adubo encarecem a agricultura

O cultivo de hortaliças demanda muita mão-de-obra manual para as operações de preparo de sol...

Veja mais
Da terra à mesa, preço do alface aumenta cinco vezes

Comprar um pé de alface na feira, na quitanda ou no supermercado é, à primeira vista, barato. O pre...

Veja mais
Na cabeça

Pouco mais de um ano após o relançamento, o xampu Clear, da Unilever, já desponta como case de mark...

Veja mais
Fumaça

O deputado estadual Giancarlo Tomelin (PSDB) vai procurar o governador de São Paulo, José Serra, para pedi...

Veja mais
Playmobil está de volta

Após quase 10 anos, o Playmobil volta ao país como novidade para as crianças e para a alegria da ga...

Veja mais
Conseguir aumento real está mais difícil

Inflação em alta teve impacto negativo nas negociações salariais do primeiro semestre A ...

Veja mais
Brasil pode garantir direitos trabalhistas aos estrangeiros

Projeto para ratificar Convenção 143 da OIT será enviado ao Congresso; país tem 800 mil lega...

Veja mais
Nestlé anuncia expansão no Estado

Investimento poderá chegar até R$ 80 milhões para captação de leite   Enquanto...

Veja mais
Divisão de riscos

A tendência de terceirização de processos de negócios ainda está em crescimento no Pa&...

Veja mais