Crise e dólar alto vão frustrar Natal da tecnologia

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Todos os equipamentos eletrônicos estão mais caros e as vendas em 2015 em queda; se o desempenho previsto para o terceiro trimestre for tão ruim quando se projeta, o mercado de smartphones no Brasil terá o seu primeiro ano de retração na história.

No lugar de filas, fãs e animação, havia apenas um homem. O engenheiro Marco Tomazini era o único a aguardar em frente à loja da Apple, em São Paulo, para comprar o novo iPhone 6S. “Eu meio que sabia que não ia ter muita gente. As pessoas não estão querendo gastar por causa da crise”, diz Tomazini, ao levar para casa dois aparelhos com 64 GB de armazenamento, cada um por R$ 4,3 mil.

Lançado no Brasil na última sexta-feira, o smartphone da Apple ficou mais caro em 2015: o modelo mais básico do smartphone, com 16 GB, teve aumento de 13% (descontada a inflação) em relação ao iPhone 6. Sonho de consumo, o iPhone pode ser um produto para poucos, mas simboliza o momento do mercado de smartphones: após dois anos de crescimento forte, a expectativa é que o Natal de 2015 seja o triste fim do primeiro ano de queda nas vendas do segmento no Brasil.

De acordo com a consultoria IDC Brasil, a estimativa é de que os fabricantes vendam 48,8 milhões de smartphones no Brasil em 2015 – ou cerca de 10% a menos que os 54 milhões vendidos em 2014. No 4º trimestre, a previsão é que 12,5 milhões de aparelhos sejam vendidos. O resultado coloca o período de festas abaixo do 1º trimestre – que teve 14,1 milhões de unidades comercializadas. “Historicamente, o primeiro trimestre é o que tem vendas mais fracas. Em 2015, ele vai ser o melhor do ano”, diz o analista de pesquisas da IDC, Leonardo Munin.

Os smartphones também estão mais caros: o preço médio dos aparelhos saltou cerca de 30% – de R$ 678 para R$ 880, segundo a análise da IDC. A alta do dólar é o principal motivo. “Nos celulares fabricados no Brasil, 85% dos componentes são importados. Se o dólar aumenta, o custo cresce”, diz Munin. Os smartphones de entrada, com preços abaixo de R$ 499, desapareceram das lojas, já que os fabricantes não conseguiram manter preços baixos.

Já a inflação – que está perto dos 10% no acumulado dos últimos 12 meses, segundo o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) – causa um impacto direto no preço dos celulares pelo custo da mão de obra. “A produção no Brasil tem que incluir o custo do dissídio salarial, que varia de 8% a 10%”, diz Oliver Roemerscheidt, diretor da unidade de negócios de tecnologia da consultoria GfK.

Lembrancinhas. “Esse Natal tende a ser de lembrancinhas e não de grandes presentes”, prevê o assessor econômico da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomercio-SP), Vitor França. Segundo ele, o principal problema é a falta de confiança dos consumidores. “Mesmo quem tem renda está evitando comprar bens que não são de primeira necessidade.”

A nova classe média é a principal afetada pela crise. Este segmento da população, principal responsável por alavancar a venda de eletrônicos nos últimos anos, perdeu poder de compra, o que derrubou as vendas. Para tentar se recuperar, o varejo mira a Black Friday e o Natal. “Os varejistas estão com os estoques cheios. Quem estiver com dinheiro no bolso pode fazer bons negócios”, diz França.

Segundo uma fonte do varejo que preferiu não se identificar, o ano de 2015 terminará bem se o resultado for igual ao de 2014, que já foi considerado “ruim”. “O consumidor tem optado por modelos mais baratos ou por adiar a compra, porque não sabe se vai manter seu emprego”, diz a fonte.

Para analistas de mercado, o cenário pode ficar ainda pior se o fim da Lei do Bem – que isenta o varejo dos 9,25% das taxas de PIS/Cofins para smartphones com preço de R$ 1,5 mil – não for adiado. Inicialmente, o prazo de isenção termina em 1º de dezembro de 2015, mas tramita no Senado uma proposta para que seja prorrogado até 2016.

“Com o fim da isenção, teríamos um Natal super ruim. Se ela permanecer, talvez tenhamos um Natal ‘só’ ruim”, diz Munin, da IDC. Apesar disso, 2016 pode ser um ano bom para os smartphones. “É um mercado que tem potencial para continuar encantando o consumidor”, diz Roemerscheidt, da GfK.

Tablets e PCs. Se a situação dos smartphones é ruim, o momento é pior para os tablets: segundo a IDC, 6,5 milhões de aparelhos serão vendidos no Brasil, uma queda de mais de 30% em relação a 2014.

Com a alta do dólar, muitas empresas – especialmente chinesas – deixaram o País. “Tínhamos mais de 40 marcas no Brasil em 2014. Hoje são pouco mais de dez”, diz analista de pesquisas da IDC Brasil, Pedro Hagge. O mercado também sofre com a perda de interesse do consumidor, frustrado com a baixa qualidade dos produtos.

O setor de PCs, em queda no País desde 2012, sofre ainda mais. Em 2015, os fabricantes devem vender 7 milhões de notebooks e desktops no País, até 32% a menos que em 2014. Em janeiro, a IDC previa uma queda de apenas 3%. “É um mercado que tem que se reinventar”, diz Roemerscheidt. Ele aponta os “conversíveis” – notebooks que podem se transformar em tablets – como uma saída interessante. De acordo com a GfK, esse tipo de PC representa 4,2% das vendas de PCs no País.

Para a Microsoft, que lançou em junho o Windows 10, nova versão do sistema operacional, e vê os primeiros PCs com o sistema chegarem ao Brasil, há uma luz no fim do túnel. “O lançamento do Windows 10 pode alterar a curva a partir do ano que vem”, diz o diretor de vendas e marketing da Microsoft Brasil, Francisco Simon.

 



Veículo: Jornal O Estado de S. Paulo


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