Produtividade cresce só 1,2% e indica ajuste no emprego

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A produtividade na indústria brasileira cresceu apenas 1,2% no ano passado, um resultado muito inferior ao ganho de 4,1% obtido em 2007. Este aumento não permitiu ao setor compensar toda a elevação dos gastos com a folha de pagamento, fazendo o custo unitário do trabalho subir 2,8%, o que indica que a indústria deve fazer ajustes ao longo de 2009 para compensar este custo. Para empresários e economistas, o tamanho deste ajuste futuro (via demissões e redução das horas pagas) é uma incógnita, pois depende do próprio patamar de produção no qual o setor vai se estabilizar após o período de ajuste de estoques e da própria demanda.

 

O pífio resultado da produtividade em 2008 decorreu de um aumento de 3,1% na produção e de 1,9% no total de horas pagas aos trabalhadores. O resultado do ano foi bastante comprometido pela retração da atividade industrial em dezembro, quando a produção caiu 12,4% e o total de horas pagas recuou 1,8%. Isso levou a uma queda de 10,9% na produtividade do mês em relação a novembro, feito o ajuste sazonal, de acordo com a Tendências Consultoria Integrada. 

 

Até outubro, os ganhos de produtividade ainda cresciam com força, avançando 3,4% acima do mesmo período do ano passado. O ciclo positivo foi interrompido em novembro, quando a indústria registrou queda de 5,2%. Em 2008, os gastos das indústrias com a folha de pagamento subiram 3,97%, superando a alta de 1,2% da produtividade, combinação que levou ao aumento de 2,8% do custo unitário do trabalho. Apenas em dezembro, o custo aumentou 13,3%, segundo cálculo da Tendências. 

 

Para o economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, os números de produtividade e do custo do trabalho indicam tanto uma desaceleração do crescimento da renda quanto uma possibilidade de aumento do desemprego. "As duas coisas devem acontecer - aliás, já estão em andamento." Vale não acredita que o grosso do ajuste no mercado de trabalho tenha ocorrido em dezembro e janeiro. "Como é um movimento de desaceleração de demanda por conta da crise de crédito e de confiança, mesmo que ela comece a ser restaurada, as quedas de atividade em relação ao ano passado continuam fortes", diz ele, estimando que, em janeiro, a indústria tenha caído 9% em relação ao mesmo mês do ano passado. "A percepção de atividade fraca deve continuar, só agravando o cenário de emprego."

 

O economista Rogério César de Souza, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), observa que o mercado de trabalho responde com atraso às mudanças na conjuntura. Para ele, certamente haverá ajustes no nível de emprego em muitos setores. O aumento do custo do trabalho superior à elevação da produtividade indica a necessidade de reduzir gastos com folha. "O cenário para o emprego industrial no futuro próximo ainda é negativo." 

 

Souza diz que os cortes no setor automotivo, por exemplo, possibilitaram ajustes na indústria de materiais de transporte, que encerrou o ano com queda no custo do trabalho de 0,7%. As demissões, contudo, ficaram muito concentradas em São Paulo. "Estados como Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul, que têm indústria metalúrgica forte, ainda apresentaram redução pequena no emprego em dezembro, o que sinaliza que essas regiões ainda farão ajustes." Para ele, os setores de bens duráveis, máquinas e equipamentos e ligados à cadeia automotiva serão os primeiros a realizar novos ajustes. Os setores têxtil, de vestuário, calçados, madeira e fumo, que já tiveram resultados ruins ao longo de 2008, também devem cortar, mas em menor nível. 

 

Para a economista da Tendências Ariadne Vitoriano, o aumento do custo unitário não é tão preocupante quanto parece, pelo menos do ponto de vista inflacionário. "O aumento do custo poderia gerar pressão sobre os preços. Mas como os dados da atividade estão ruins, é pouco provável que haja repasse." Ela diz que houve um grande número de negociações de redução de jornada com corte de salários e suspensão temporária de contratos de trabalho, medidas que já ajudaram a reduzir gastos com folha de pagamento em janeiro. 

 

O mais otimista é o economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges. Ele cita a alta de 92,7% na produção de automóveis em janeiro sobre dezembro (85% com ajuste sazonal). "Como foi um dos setores que mais contribuíram para a queda da produção em dezembro e como em janeiro mais do que recuperou a queda anterior, é provável que a produção aumente em janeiro e, com ela, a produtividade." Ele observa, porém, que a produção automotiva ficou 27,1% abaixo da de janeiro de 2008. 

 

Para Borges, a melhora na produção de veículos, somada à redução do emprego, deve proporcionar uma redução no custo do trabalho. Ele lembra também que outros custos - como os preços do aço e do petróleo e derivados - caíram bastante nos últimos meses, o que permite às indústrias acomodar parte do aumento de despesas com o custo da mão-de-obra. 

 

Os empresários mostram uma visão cautelosa ao falar das tendências do emprego. Pedro Passos, sócio-fundador e membro do conselho da Natura, vê uma "repactuação" no mercado de trabalho. Até um pouco antes do agravamento da crise, havia uma "tendência muito forte em alguns setores de contratação de mão-de-obra e aumentos reais de salários", diz ele. "Agora há uma acomodação no uso de recursos, e não apenas da mão-de-obra." Passos acredita que essa "repactuação e reorganização das forças de produção" pode se estender ao longo de 2009. 

 

Para Miguel Sampol Pou, membro do conselho consultivo da Klabin, a duração do processo de ajuste no mercado de trabalho vai depender da reação do mercado de bens e serviços: "Se houver alguma reação nesses mercados, nós também veremos essa reação na questão da mão-de-obra." 

 

O presidente do conselho da Gerdau, Jorge Gerdau, diz que é difícil dizer se o processo de redução dos postos de trabalho vai se estender ao longo dos próximos meses. Para Gerdau, uma vez concluído o processo de ajuste de estoques, a economia pode se normalizar, o que poderia conter o impacto negativo sobre o mercado de trabalho. Isso não quer dizer, porém, que ele se sinta confiante em dizer que a situação vai se tranquilizar. "Não dá para ter previsões muito claras", afirma ele, citando as incertezas sobre a evolução global e mesmo sobre o ajuste de estoques. 

 

Veículo: Valor Econômico


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