Investimentos sobreviverão aos juros e às turbulências

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Nem a desaceleração da economia mundial, nem a alta doméstica da taxa básica de juros farão as empresas brasileiras postergarem projetos de investimentos ou mesmo desistir deles. Capitalizadas, as melhores entre as maiores empresas brasileiras planejam manter os programas já anunciados. No cenário traçado por elas, a economia brasileira continuará crescendo em 2009 e nos anos seguintes (em taxas entre 4% e 5%) e a inflação vai recuar para um percentual próximo da meta de 4,5% estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) e perseguida pelo Banco Central. Por isso, a grande maioria delas espera alcançar, este ano e no próximo, novos crescimentos de receita e rentabilidade. 

 

Luis Del Barrio, presidente da Atlas Schindler, conta que não existe intenção de reduzir os investimentos previstos para 2008 por conta do atual contexto econômico ou do aperto da política monetária do Banco Central. "O aumento dos juros não está afetando os negócios da empresa. Sempre tem uma ameaça inflacionaria. Os juros estão subindo e isso evidentemente não é o mais favorável, mas este ano devemos continuar crescendo." 

 

"O segmento de fabricação de elevadores novos está intimamente ligado ao setor de construção civil, que nos últimos tempos tem crescido acima do PIB. Automaticamente, seguimos essa melhoria e estamos obtendo resultados também acima da economia brasileira", diz ele. 

 

Também dirigindo uma companhia intimamente ligada ao setor de construção civil, Hélio Seibel, diretor-geral da cadeia de varejo Léo Madeiras, diz que a perspectiva de desaceleração econômica do país ainda não interferiu nos planos de crescimento da empresa. "Nem passa por nossa cabeça reduzir investimentos ou estancar nossa expansão, ainda vemos enormes possibilidades de crescimento", afirmou o executivo. 

 

A Leo Madeiras prevê um ano de forte crescimento em suas receitas, principalmente por conta da expansão da rede, que este ano deve superar a casa das 40 unidades. Seibel estima que deve encerrar 2008 com um avanço no faturamento entre 22% e 26% quando comparado a 2007. "E para 2009 continuamos muito otimistas, acreditamos que nossa receita deve ter um crescimento de no mínimo 15%", afirma. 

 

A fabricante de cabos Prysmian, que adquiriu a Pirelli do Brasil, aprovou recentemente um investimento de R$ 110 milhões para a construção de uma fábrica no Espírito Santo para atender a indústria de petróleo, lembra Armando Comparato, presidente da companhia. Sua expectativa é que a receita da companhia cresça entre 6% e 10% este ano, reflexo direto da expansão de certos setores da economia - petróleo e construção, principalmente. Para 2009, por conta de uma desaceleração de alguns setores, a Prysmian espera um crescimento de 3% a 4%. 

 

"Não vejo uma tempestade no horizonte", pondera Sérgio Veinert, presidente da filial brasileira da Borgwarner. O setor de autopeças, explica, está consciente de que 2008 é um ano acima da média, mas não prevê forte desaquecimento em 2009. Em 2007, a Borgwarner faturou R$ 300 milhões e as previsões são de crescimento de 15% este ano e de 9% em 2009. Apesar do aperto monetário promovido pelo BC, a empresa manterá os investimentos planejados. Veinert explica que dois pilares comandam esta decisão: a perspectiva para a produção de automóveis e a renovação tecnológica. 

 

De acordo com Milton Cardoso, diretor-presidente da Vulcabras, controladora da Azaléia Nordeste, a companhia está concluindo este ano os investimentos planejados, na ampliação das fábricas da Bahia e do Ceará. Foram gastos US$ 80 milhões em 2007 e 2008. Além disso, a empresa adquiriu a Azaléia e uma fábrica na Argentina. O executivo explica que um novo plano de investimentos nas fábricas do Nordeste está suspenso no aguardo dos avanços da reforma tributária. O setor de calçados teme perder os benefícios fiscais que possui no Nordeste. "Estamos mais cautelosos, menos pelos juros, e mais pela reforma tributária", disse. 

 

A Mineração Rio do Norte, fabricante de bauxita (matéria-prima para alumínio) deverá ter este ano uma queda de cerca de 10% em sua receita líquida em reais por conta da desvalorização do dólar. "Os preços da bauxita estabelecidos em contratos de longo prazo são fixados em dólares", explica o presidente da companhia, Júlio Sanna. Apesar disso, a mineradora não pretende reduzir seus investimentos nos próximos cinco anos. Os recursos serão utilizados principalmente para melhoria de processos. "A solidez da MRN permite que ela tenha acesso a linhas de crédito", diz, ressaltando que, para 2009, a expectativa é de que a receita seja mantida num patamar similar à de 2008, em torno de R$ 900 milhões. 

 

A Garoto também vai manter seus planos de expansão, apesar das perspectivas de desaceleração global da economia. "Nosso plano de expansão anunciado para os próximos três anos já está em andamento e será mantido. São investimentos de R$ 200 milhões, que aumentam em 25% a capacidade produtiva de nossa fábrica, gerando mais de 400 empregos diretos e de mil indiretos, em Vila Velha, no Espírito Santo", diz Fausto Costa, diretor-geral da Garoto. 

 

O presidente da White Martins, Domingos Bulus, disse que a companhia não está sentindo desaceleração da atividade doméstica. Segundo ele, a fabricante de gases industriais está comprometida com contratos de longo prazo com clientes que possuem compromissos de médio e longo prazo. 

 

Longo prazo também é o que faz a TAM manter planos. Seu presidente, David Barioni, observou que a empresa planeja investimentos para oito a dez anos e, por isso, mantém o programa de inversões intacto. "Se a empresa reduzir agora, corre o risco de não ter aviões daqui a oito anos, quando a demanda certamente estará mais forte", afirmou. A empresa planeja investir US$ 4,2 bilhões até 2020. 

 

O diretor presidente da CSN, Benjamin Steinbruch, é outro empresário que não vê desaceleração, nem mundial, nem local. Além da siderurgia, a CSN vem investindo em cimento (a fábrica de Volta Redonda deverá iniciar sua operação em dezembro), portos e minério de ferro. No total, o grupo prevê investimentos de US$ 12 bilhões até 2012. Steinbruch garante que esse número será mantido. "O que existe é uma crise financeira concentrada nos Estados Unidos, que está contaminando um pouco outras economias. Mas mesmo na China, passada a Olimpíada, veremos mais crescimento". 

 

Benjamin admite que o acesso ao crédito está mais difícil agora e crê que essa situação vai perdurar pelo menos até o fim de 2008, podendo se estender até 2009. "Estamos vivendo um momento de escassez. O dinheiro está mais caro e mais difícil", diz o empresário. 

 

As empresas do agronegócio também pretendem manter investimentos e produção em alta no próximo ano, apesar da desaceleração da economia global que pode afetar mercados consumidores do exterior. "Temos um orçamento para expansão de nossos negócios de R$ 180 milhões para 2008 e 2009 e deveremos mantê-lo", afirma o presidente da Cooperativa Agropecuária Mourãoense (Coamo), José Aroldo Galassini. "Nosso negócio não será afetado porque está ligado à energia, às commodities", acrescenta Rubens Ometto Silveira Mello, presidente do grupo Cosan, que tem orçamento de R$ 1 bilhão para a atual safra e deve aplicá-lo na expansão dos negócios e aquisição de máquinas. 

 

Nem a alta dos custos de produção do setor agrícola, provocada, sobretudo, pelo aumento dos insumos - fertilizantes e defensivos - afetará os resultados da Coamo, acredita Galassini. A companhia deve encerrar 2008 com faturamento de R$ 4,2 bilhões - 15% sobre 2007. Na safra 2008/09 (de maio a abril), a Cosan está preparada para crescer 15% em produção. 

 

Nem a Coamo, nem o grupo Cosan estão preocupados com uma eventual escassez de crédito e com o aumento da taxa básica de juros. Claudio Luiz Lottenberg, presidente da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein, também informa que o Hospital Israelita Albert Einstein não vem sofrendo com a alta das taxas de juros, já que a instituição tem alto índice de liquidez e, por isso, pouca dependência do crédito. "Esperamos que a nossa receita cresça cerca de 6,2% neste ano em relação a 2007 e a perspectiva para o ano de 2009 é de mais 6%." 

 

No cenário traçado pelo presidente da Brasil Telecom (BrT), Ricardo Knoepfelmacher, não há uma forte desaceleração da economia nacional. De qualquer forma, conta, a operadora de telefonia preparou-se para atuar num ambiente hostil devido à intensa competição que se estabeleceu no setor nos últimos anos - e isso deverá lhe ajudar a enfrentar uma eventual crise. Os investimentos programados pela BrT para 2008 - no valor de R$ 2,2 bilhões - estão sendo feitos normalmente. 

 

O presidente da Duratex, Paulo Setubal, diz que a economia brasileira terá uma recuperação após os impactos da alta de juros e das medidas de crédito para conter o crescimento. "Acredito que o Brasil sairá mais forte", afirmou Setubal. Segundo o empresário, os investimentos não só estão mantidos, como podem crescer no caso de boas oportunidades de aquisição. 

 

A AES Tietê tem um investimento fechado de R$ 250 milhões para a manutenção de hidrelétricas e construção de PCHs, explica Britaldo Soares, principal executivo da empresa. E para fazer frente a esses projetos, não há problema de liquidez e dividas de curto prazo. "Temos R$ 400 milhões em caixa", diz. 

 

Voltadas para o consumidor, a Spaipa, fabricante e distribuidora da Coca-Cola no Paraná e no interior paulista, e a Multiplan, também mantêm os planos para este ano. "Todos os investimentos para 2008 foram contratados desde o começo do ano e já estão em execução", afirma Avelino Nogueira Pereira, superintendente de finanças e desenvolvimento organizacional da Spaipa, que prevê alta de 12% a 13% na receita para este ano. Para 2009, em função das possíveis alterações de impostos previstas pelo governo, o cenário ainda está indefinido, diz Pereira. 

 

A Multiplan, uma das principais no segmento de shopping centers, vem monitorando com cuidado a evolução do mercado e as possibilidades de uma redução abrupta no crescimento econômico. "Temos uma geração de caixa forte, o que nos permite continuar investindo sem sermos afetados por essa temporária redução do crédito", afirma José Isaac Peres, presidente executivo da companhia. 

 

A Cálamo, distribuidora de produtos de beleza do grupo O Boticário, e a Natura, fabricante de cosméticos, não acreditam que o aumento dos juros vá gerar algum impacto sobre os negócios das empresas. "Vamos crescer 20% em 2008 e cerca de 15% no próximo ano", diz Fernando Modé, diretor executivo da Cálamo. Alessandro Carlucci, diretor-presidente da Natura, ressalta que a empresa não projeta vendas. "Mas, a julgar pelo crescimento da receita de 12,2% no primeiro semestre, estamos tendo um bom ano", afirma. 

 

O vice-presidente da Aracruz, Isac Zagury, disse que os planos de investimentos da fabricante de celulose são de longo prazo e que eles não tem sido modificados por conta da alta dos juros ou de escassez de crédito. "Exportamos 98% da nossa produção", afirmou o executivo. A Aracruz está erguendo uma nova fábrica no Rio Grande do Sul, que exigirá investimentos de mais de US$ 1,8 bilhão, que deve ficar pronta apenas em 2010. 

 

Veículo: Valor Econômico

 


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