Ministro Luís Roberto Barroso se despede do Supremo após 12 anos de atuação

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No discurso em que anunciou o pedido de aposentadoria, o ministro destacou compromisso com a democracia e o país

O ministro Luís Roberto Barroso se despediu nesta quinta-feira (9) do Supremo Tribunal Federal (STF), encerrando uma trajetória de mais de 12 anos na Corte, os dois últimos como presidente. Em discurso emocionado na sessão plenária, ele afirmou que deixa o cargo com o sentimento de dever cumprido e sem apego ao poder. “Deixo o Tribunal com o coração apertado, mas com a consciência tranquila de quem cumpriu a missão de sua vida”, disse. “Não foram tempos banais, mas não carrego comigo nenhuma tristeza, nenhuma mágoa ou ressentimento. E começaria tudo outra vez, se preciso fosse”. Ao fim do pronunciamento, foi aplaudido de pé.

Barroso ressaltou que sua passagem pelo Supremo foi marcada pela dedicação à Constituição, à Justiça e à democracia. “A vida me proporcionou a bênção de servir ao país, retribuindo o muito que recebi”, afirmou, acrescentando que sempre buscou agir de forma justa e legítima.

O ministro reafirmou sua confiança de que o STF continuará sendo “guardião da Constituição e protagonista na preservação da estabilidade institucional e da democracia”. Barroso anunciou que permanecerá por mais alguns dias na Corte para concluir as pendências antes de formalizar o pedido de aposentadoria, após mais de quatro décadas de serviço público.

Aproximação com a sociedade

Durante sua Presidência, Barroso destacou-se por iniciativas de aproximação entre o Judiciário e a sociedade, com visitas a magistrados e cidadãos em todas as regiões do Brasil. “Conversei com todos: indígenas e produtores rurais, patrões e empregados, situação e oposição. Conheci mais profundamente o país na sua pluralidade e diversidade e vi aumentar o meu amor por essa terra e sua gente”, relatou.

Ao justificar sua saída, Barroso ponderou que pretende dedicar mais tempo à vida pessoal, à espiritualidade e à literatura. Disse ainda que reconhece o impacto das exigências do cargo sobre os familiares dos ministros. “Os sacrifícios e os ônus da nossa função acabam se transferindo aos nossos familiares e às pessoas queridas, que não têm sequer responsabilidade pela nossa atuação”, afirmou.

Em tom de reflexão, o ministro reiterou sua crença na força do bem e na importância da civilidade. “Reafirmo a minha fé nas pessoas, no bem, na boa-fé, na boa vontade, no respeito ao próximo e na gentileza sempre que possível”, disse. Ressaltou que continuará a trabalhar “por um tempo de paz e fraternidade” e reafirmou que “a integridade, a civilidade e a empatia vêm antes da ideologia e das escolhas políticas”.

Barroso dedicou parte de seu pronunciamento aos colegas de Corte, expressando admiração e gratidão pelas trajetórias compartilhadas e citando nominalmente cada um, em tom afetuoso. Ele também agradeceu ao procurador-geral da República, Paulo Gonet, aos servidores do Tribunal e aos assessores que o acompanharam na trajetória.

Imprensa

Fez ainda um tributo à imprensa, destacando sua importância no combate à desinformação e na preservação da verdade: “Nunca precisamos tanto da imprensa que se move pela ética e pela técnica jornalística. Mentir precisa voltar a ser errado de novo.” Ao final, agradeceu à ex-presidente Dilma Rousseff pela nomeação, “sem pedidos, insinuações ou cobranças”, e ao presidente Lula pela defesa do Supremo “com altivez e sem bravatas” nos momentos de crise.

“Compreensão da alteridade”

O presidente do STF, ministro Edson Fachin, destacou a contribuição de Barroso para a democracia brasileira. Em seu pronunciamento, disse que o legado de Barroso transcende seus votos e suas decisões e que isso já se manifestava da tribuna, quando atuava como advogado.

Segundo Fachin, Barroso ajudou a construir uma cultura constitucional mais sólida, mais consciente, mais comprometida com os direitos fundamentais. “Vossa Excelência nos recordou que ninguém nessa vida é bom sozinho. É o outro, na sua diferença, que nos completa”, assinalou. “Essa compreensão da alteridade permeia toda a sua atuação jurisdicional e nos ensina a nunca formar uma opinião sem antes ouvir os dois lados – tradução prática do contraditório e do devido processo legal.

“História vai reconhecer seu papel”

Ao homenagear o colega, o ministro Gilmar Mendes, decano do STF, lembrou que Barroso esteve à frente da instituição em um dos momentos mais difíceis enfrentados. “Tenho certeza de que a história vai reconhecer o seu papel, não só a sua judicatura marcante, mas também os dois anos que, de modo bastante desafiador, marcaram a sua gestão”, afirmou. Segundo Mendes, o compromisso tem que ser com a instituição. “Essa é a lição que devemos ter e cultivar: olhemos para frente e saibamos ser dignos das funções que recebemos, das dádivas que tivemos de poder contribuir para a construção de um país melhor”.

“Meu amigo Beto”

O ministro Luiz Fux pediu licença para falar não do ministro Luís Roberto Barroso, mas do “meu amigo Beto”, em razão da amizade de longa data entre eles. Fux que, como juiz, celebrou o casamento de Barroso, rememorou os momentos que passaram juntos na Universidade do Estado do Rio de Janeiro e sua “cumplicidade espiritual”. “Você tem a marca do grande homem, um homem solidário, uma sabedoria ímpar. Um amor incondicional por todas as pessoas. Humildade, como agora demonstrou, e a capacidade de agir de acordo com a sua consciência e seus valores. E, acima de tudo, me inspirando e transformando a vida de tantas pessoas”, concluiu.

Diálogo

O procurador-geral da República, Paulo Gonet, reiterou as palavras de reconhecimento manifestadas quando Barroso deixou a Presidência do Tribunal. “Acho que todos encontramos consolo no fato de que, se perdemos o magistrado, o país continuará a se beneficiar do jurista sempre culto, sempre aberto ao diálogo e sempre buscando o justo e o certo”, afirmou.

Leia a íntegra dos pronunciamentos dos ministros Barroso e Fachin.

(Cezar Camilo e Jorge Macedo//CF)

Fonte: STF – 09/10/2025


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