Cláusulas potestativas são aquelas que submetem os efeitos de um contrato ao puro e livre arbítrio de uma das partes.
Assim, por constatar que a cláusula contestada era potestativa, a 22ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo suspendeu, em liminar, a rescisão unilateral de um contrato da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) com um shopping center.
Em outubro do último ano, três meses depois da privatização da estatal, a Sabesp informou a rescisão do contrato de fornecimento de água e coleta de esgoto de forma unilateral, com base em uma cláusula que previa essa possibilidade para qualquer uma das partes depois de seis meses do início do contrato, sem qualquer compensação.
Como a cláusula também exigia que isso fosse comunicado com uma antecedência mínima, a rescisão aconteceu de fato 60 dias depois.
O shopping argumentou que a cláusula era abusiva e que não se tratava de uma rescisão, mas, sim, da imposição de um reajuste não previsto no contrato, pois a Sabesp passou a impor uma tarifa superior ao dobro do serviço nos meses seguintes, antes da efetiva rescisão. A 4ª Vara Cível do Foro Regional de Pinheiros, na capital paulista, negou o pedido de liminar.
Monopólio privado
O desembargador Nuncio Theophilo Neto, relator designado, explicou que, embora a cláusula permitisse a rescisão unilateral por qualquer uma das partes, o shopping “jamais teria como exercitar esse direito”, pois a Sabesp “tem a seu favor o controle do mercado específico, condizente com serviços essenciais”.
Segundo ele, mesmo se o autor pudesse contratar outros serviços de fornecimento de água, nunca conseguiria contratar outro serviço de esgoto, cujo monopólio é da Sabesp no estado de São Paulo, mesmo após a privatização da empresa no último ano. Para o magistrado, a “desestruturação das finanças” do shopping não poderia “ser acudida no curto prazo por outro prestador de serviços”.
Theophilo Neto ainda apontou o aumento das tarifas após o shopping denunciar a rescisão unilateral. A fatura vencida em dezembro de 2024 mais que dobrou com relação à fatura de novembro, o que representou um aumento de R$ 30,7 mil.
Ele ainda ressaltou que o contrato estava vigente desde 2012, sem ter causado a “ruína” da Sabesp ao longo dos anos. Por fim, destacou que, caso o pedido do autor não seja confirmado no julgamento do mérito da ação, ainda será possível retornar ao status do contrato anterior à liminar.
O desembargador Roberto Mac Cracken, relator sorteado, inicialmente teve um posicionamento distinto, mas, ao fim, acompanhou Theophilo Neto. Para Mac Cracken, a cláusula que prevê a rescisão unilateral imotivada “pode, eventualmente, vir a ser considerada abusiva, tendo em vista a natureza essencial do serviço de fornecimento de água e esgoto e a atuação da agravada fora do regime de concorrência, já que, ao menos do que consta dos autos, é fornecedora única da referida utilidade”.
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Processo 2040185-75.2025.8.26.0000
José Higídio – Repórter da revista Consultor Jurídico.
Fonte: Revista Consultor Jurídico – 29/04/2025