Recessão e seca levam polo têxtil a colapso no Nordeste

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                                Além da falta de matéria-prima, beneficiadora de jeans sofre com estoques elevados, em razão da queda da demanda - Atacadistas calculam perdas de até 30% desde o início do ano, cortam pessoal e fecham lojas de revenda


FERNANDO CANZIAN ENVIADO ESPECIAL A PERNAMBUCO

Bairros inteiros com apenas dois dias por mês com água. Vinte e oito sem.

É assim que cidades de um dos maiores polos produtivos do Nordeste vivem há meses. Em colapso, ou à beira dele, 2 milhões de pessoas em um raio ampliado. E toda uma cadeia têxtil que abastece o maior centro comercial do ramo da América Latina.

A região de Caruaru, em Pernambuco, tem duas cidades vitais para a indústria têxtil do Nordeste e do Norte: Santa Cruz do Capibaribe, onde o Moda Center reúne mais de 15 mil pontos de venda e chega a atrair 100 mil pessoas por dia em junho; e Toritama, segundo maior polo no Brasil para o beneficiamento de jeans. Principal matéria-prima em falta: água.

"Na zona urbana as pessoas não estão acostumadas a isto: chegar a uma rua e ver aquela fila de moradores, cada um com um balde, para pegar dez, vinte litros, é um negócio constrangedor, para quem pega, para quem distribui", diz Roberto Tavares, presidente da Compesa, estatal pernambucana responsável pelo abastecimento no Estado.

O regime de chuvas na região de Caruaru está abaixo do normal há quatro anos. Com o fenômeno El Niño configurado em 2015, a seca deve prevalecer mais uma vez no agreste pernambucano.

A falta de água na região veio em cima da crise geral na vendas de vestuário. Alguns atacadistas contabilizam perdas de até 30% desde o início do ano, demitem e fecham lojas de revenda.

Em lugar das centenas de camionetes Toyota levando compradores pelas estradas em Santa Cruz (100 mil habitantes) e Toritama (41 mil), a paisagem está coalhada agora de carros-pipa, que precisam buscar água para as cidades cada vez mais longe. As maiores represas da região secaram, como em Poço Fundo e Jucazinho.

Em alguns casos, a distância fez aumentar em até 60% o preço dos carros-pipa, que chegam a custar R$ 160 para entregar 11 mil litros de água não potável. Com a barragem seca em Poço Fundo, a população recorre diariamente a baldes e vasilhas para pegar água dos carros-pipa.

A situação é mais grave em Toritama, que vive basicamente de beneficiar jeans que vêm do Sul e do Sudeste. A Mamute, maior lavanderia local, usava 8 bilhões de litros de água por mês para os jeans (cerca de 40 litros por peça). Hoje, tem à disposição apenas 4 bilhões de litros (grande parte reciclada), diminuiu turnos de trabalho de 3 para 1, cortou 16 funcionários (de 84) e prevê mais demissões.

"À crise econômica veio se somar a falta de água", diz Edilson Tavares, dono da Mamute, que fornece peças para grandes redes do Nordeste e do país, como a Marisa.

Na mesma rua da Mamute, a Rone Jeans passa por drama igual. "Pensamos seriamente em demitir já. Mesmo sem água e produção menor, nossos estoques estão abarrotados de roupas que saem de moda rapidamente", diz José Ronaldo Silva, dono da empresa de 75 funcionários.

O Arranjo Produtivo Local na região próxima a Caruaru gera 150 mil empregos diretos em 18 municípios e movimenta 700 milhões de peças ao ano em artigos de moda.

Em Santa Cruz do Capibaribe, onde funciona o Moda Center, com 120 mil m? de área coberta para revenda de roupas, lojistas falam em "colapso" de vendas em razão da economia em geral e da falta de água na região.

O revendedor Nivaldo dos Santos Costa diz que suas vendas e faturamento mensal de R$ 8.000 caíram 50% desde o fim do ano passado. Sua vizinha Lucinete Sobral reclama de que os custos de fabricação subiram, mas que não teve condições de repassá-los.



Veículo: Jornal Folha de S.Paulo


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