Tomate comprova que aparência não é tudo

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Os produtores de tomate dominaram a arte de tornar o produto durável, atraente e disponível durante todo o ano. Agora, conseguir torná-lo saboroso é outra história.



Com o paladar dos americanos cada vez mais sensível ao sabor, as empresas de sementes e os agricultores vêm recebendo várias queixas sobre os tomates vendidos no varejo - a aparência é ótima, mas o gosto é insípido. As empresas de agronegócios vêm despejando milhões de dólares em investimentos para melhorar o produto. Discussões de grupo foram promovidas para apontar os traços que dão a um bom tomate seu sabor e também se adotaram novas tecnologias para acelerar o cultivo.

Mas os obstáculos são numerosos - desde saber equilibrar os conceitos do que é um bom sabor até identificar que genes os determinam. "Consigo ver uma luz no fim do túnel", diz Harry Klee, geneticista de plantas e especialista em tomates na Universidade da Flórida. "[Mas] ainda não chegamos lá".

Em primeiro lugar, como é que fomos parar nesse túnel? Por anos, pesquisadores e empresas de semente criaram tipos de tomates pensando em quase todos os aspectos, exceto no sabor. Os varejistas queriam tomates que tivessem boa aparência e vida longa nas prateleiras. Os agricultores queriam plantas que tivessem alta produtividade. Em meio a essas demandas, a questão do gosto do consumidor, mais difícil de determinar, acabou assumindo grau de prioridade bem menor. E, por décadas, o sabor foi piorando.

Alguns pesquisadores dizem saber o momento exato em que a situação começou a degringolar. Em junho, um estudo na revista científica "Science" sustentou que uma mutação genética descoberta há 70 anos foi incluída nas plantas porque fazia os tomates amadurecerem de forma uniforme e lhes dava coloração de um vermelho mais intenso. A mesma mutação, porém, desativou o gene responsável pelos açúcares que dão ao tomate grande parte de seu sabor, de acordo com o estudo.

Naturalmente, ainda é possível encontrar tomates com ótimo sabor em feiras, plantações de quintal e até em supermercados. Essas variedades normalmente são mais caras e não têm produção em massa nem resistem ao transporte da forma como os tomates que chegam às nossas saladas ou hambúrgueres.

Kent Shoemaker, executivo-chefe da Lipman, maior empresa de cultivo de campos de tomate do mundo, diz que uma coisa é produzir uma dúzia de tomates no quintal no auge da temporada "e outra, muito diferente, é colher milhões deles durante o ano inteiro".

Empresas de semente e produtores sabem que as pessoas não estão satisfeitas. Shoemaker diz que sua empresa entendeu o recado dos consumidores, de que "eles querem mais que um produto só bonito". A empresa respondeu, em parte, com o desenvolvimento de um tomate que diz ser o mais saboroso que já produziu até hoje. Consuelo Madere, presidente da divisão de sementes de vegetais da Monsanto, diz ter consciência da percepção pública negativa dos tomates comuns. "Meus amigos e minha família dizem 'Quando vamos ter tomates com melhor sabor?'".

Entre os projetos da Monsanto há um, de longo prazo, para incluir componentes do sabor do tomate-cereja nos tomates comuns. As apostas, assim como as oportunidades, são grandes. Entre as sementes vegetais, um mercado de US$ 5 bilhões, as de tomate são as mais vendidas, representando 25% do total, segundo Mark Nelson, da consultoria Context Network, de Des Moines, Iowa.

Os esforços para aprimorar o sabor passam por um processo longo e lento, que envolve técnicas convencionais de cultivo. Apesar do alarde neste ano quando o tomate teve seu genoma sequenciado, não há tomates transgênicos no mercado.

A Bayer passou dez anos desenvolvendo um tomate polpudo para evitar molhos muito aguados ou sanduíches que ficam umedecidos demais com as fatias. A empresa também levou anos para desenvolver outro tomate mais doce e cuja superfície lembra gomos, lançado na Espanha em abril.

Shoemaker, da Lipman, diz que sua empresa pode demorar três anos para desenvolver uma "biblioteca" de plantas para reprodução no início do processo de criação de novas variedades. E ainda são necessários testes de campo que também podem levar anos. Ainda assim, a variedade pode não chegar ao mercado. Shoemaker diz que a empresa recentemente abandonou um projeto depois dos testes de campo, porque os tomates não produziam açúcares suficientes para equilibrar a acidez.

Um fator que pode ajudar o processo é a seleção assistida por marcadores moleculares, que vem acelerando a descoberta dos genes que determinam o sabor. A técnica consiste em testes genéticos para identificar quais plantas devem ser cruzadas, praticamente eliminando o processo de intermináveis tentativas e erros, que era o principal método.

Isso é algo de muita ajuda, segundo pesquisadores, em função das grandezas envolvidas. Apesar do estudo na "Science", são vários genes juntos que determinam o sabor, dizem os pesquisadores. Açúcares, ácidos, aromas e textura influenciam a percepção do gosto, segundo Ira Stein, que comanda as operações de cultivo de tomate na Nunhems, a divisão de sementes vegetais na Bayer.

Mantendo o foco em um único gene, os pesquisadores podem, por exemplo, proteger os tomates contra doenças como a fusariose, diz Klee, da Universidade da Flórida. Há, porém, ao menos 20 diferentes compostos que influenciam o sabor do tomate e quase uma dúzia de genes. Klee orienta grupos de discussão de 80 a 90 pessoas para testar dezenas de variedades e identificar as de melhor sabor. Daí ele recolhe as preferidas, as desconstrói e tenta identificar os genes específicos que as tornam mais saborosas. "Se o sabor fosse um só gene, estaríamos feitos", afirma.



Veículo: Valor Econômico


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