Varejo e indústria negociam repasse do dólar

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Varejo e indústria estão buscando mecanismos para destravar negociações num ambiente de extrema instabilidade da taxa de câmbio. Com a forte alta do dólar nas últimas semanas, alguns fabricantes de bens de consumo já trabalham com tabelas de preços que embutem aumentos de 2% a 15%, a depender do produto. No entanto, como não se sabe em que nível a moeda vai se estabilizar, uma prática que começa a ser adotada é condicionar o valor do reajuste à evolução futura do câmbio.

 

A Lojas Cem diz que os fabricantes da linha branca (como geladeiras) e de móveis querem repassar uma alta de 2% a 3% nos preços de seus produtos nas vendas relacionadas ao fim do ano. Segundo o supervisor-geral da Lojas Cem, Domingos Alves, a empresa confirmou os pedidos, mas o percentual de reajuste efetivo vai depender do nível em que se acomodar a taxa de câmbio. Como as mercadorias serão entregues a partir do fim deste mês, elas serão faturadas gradualmente. Os preços levarão em conta o patamar do câmbio, diz ele. 

 

Os fabricantes de colchão querem um aumento de 9%, mas, como a empresa tem um bom estoque, tenta limitar o percentual a 5%. "No caso dos colchões, nós ainda não fechamos os pedidos", afirma Alves, segundo quem alguns produtos de áudio e vídeo tiveram queda de 2% a 3%. 

 

A indústria de eletroeletrônicos também planeja repassar a alta do dólar para os preços, mas as condições do reajuste estão em negociação. Os lojistas não querem aceitar o reajuste integral do dólar porque há expectativa que a cotação poderá recuar nas próximas semanas, devido às atuações do Banco Central. A percepção é de que o câmbio esteja no seu pico de alta. "O Banco Central demonstrou que tem bala na agulha para agir", afirma Nabil Sayon, presidente da Associação Brasileira dos Lojistas de Shopping Centers (Alshop). 

 

Segundo ele, os varejistas estão incluindo nos contratos com as indústrias uma cláusula de "rebate" para se proteger. O fornecedor precisará devolver a diferença de preços caso a taxa de câmbio recue no futuro. Esse mecanismo já é utilizado pelo varejo nas negociações envolvendo produtos inovadores, como os televisores de LCD, cujos preços costumam cair nos meses seguintes ao seu lançamento. 

 

O presidente da rede Berlanda, Nilso Berlanda, com 104 lojas de móveis e eletrodomésticos em Santa Catarina e Rio Grande do Sul, diz que, devido à turbulência, houve pedidos de aumento de preços por parte de diversos fornecedores. "Tínhamos muitas encomendas programadas para o fim do ano, mas quando houve o aumento do dólar, muitas fábricas ligaram avisando que não manteriam os preços para os pedidos de novembro e dezembro que já haviam sido feitos." Segundo ele, fornecedores de linha branca e marrom pediram aumentos de 8% a 10% nos preços que vinham sendo praticados. O mesmo percentual foi pedido por um fabricante de linha branca para uma rede varejista do Rio Grande do Sul. 

 

Berlanda diz ainda que produtores de colchões, cuja matéria-prima é importada, pediram aumentos em torno de 15%. "Com aqueles fabricantes que eu consegui diálogo, antecipei as compras que estavam programadas para novembro para este mês e coloquei no estoque para vender no Natal." Nos itens em que não conseguiu manter o preço, Berlanda buscou fornecedores similares. 

 

Já o presidente da Lojas Colombo, Adelino Colombo, diz que ainda não recebeu nenhuma nova tabela de preços dos fornecedores. A empresa também não alterou suas políticas de juros e prazos, que em alguns casos alcançam 12 vezes sem acréscimo. De acordo com ele, alguns fabricantes de equipamentos de informática, que têm os custos integralmente vinculados ao dólar, suspenderam as entregas nos últimos dias à espera de uma definição do cenário cambial. Segundo o empresário, a empresa ainda tem estoques de produtos de informática e as vendas no segmento estão de 20% a 30% maiores em relação a setembro. 

 

A varejista baiana Le Biscuit, que vende brinquedos, utensílios de casa e artigos de papelaria, conseguiu, por ora, escapar de aumentos de preços. A empresa já estava com os pedidos para o Dia das Crianças e o Natal feitos desde o segundo trimestre deste ano. "Por isso não vamos precisar reajustar, mas já estou ouvindo dos fornecedores que haverá aumento em breve", explica Álvaro Santanna, diretor-presidente da Le Biscuit. Segundo ele, apesar de ter se livrado de reajustes agora, se o dólar continuar a subir, é bem possível que repasses nos preços sejam feitos a partir de fevereiro, quando começa as vendas de volta às aulas. 

 

A FNAC informou que, mesmo com a forte turbulência, não aumentou preços e que não há previsão para fazê-lo, além de não ter mudado as condições de financiamento. Os produtos importados que estão hoje nas gôndolas foram comprados há dois meses, de acordo com a empresa. 

 

Nilso Berlanda diz que espera um cenário de mais longo prazo para decidir se pisa no freio das encomendas em relação ao Natal. Segundo o empresário catarinense, as vendas em outubro já demonstram queda de 8% em relação ao mês de setembro, e uma desaceleração do crescimento em relação ao desempenho de 2007. "As vendas caíram violentamente principalmente nesta semana, passado o Dia das Crianças. O consumidor está mais retraído", diz Berlanda. Até setembro, o crescimento real de vendas da Berlanda era de 20% na comparação com o mesmo período de 2007. 

 

Com a alta do dólar, a Fresnomaq, que havia suspendido as vendas ao varejo no começo do mês, promoveu reajustes de preços, segundo o gerente de vendas, Emerson José Zaleski. Ele não revela a magnitude dos aumentos. Fabricante de lavadoras de alta pressão e aspiradores de pó da marca Wap, a empresa, que trabalhava com um câmbio de R$ 1,70, elevou as cotações com base num dólar de R$ 2,10. Segundo ele, houve alguma retração nas vendas em outubro. 

 

A Semp Toshiba, que suspendera os negócios no dia 6, informou que os retomou no dia 10. A empresa não relatou se houve ou não aumentos de preços. 

 

O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Brinquedos (Abrinq), Synesio Batista da Costa, diz que as empresas do setor não elevaram as cotações, ainda que o plástico tenha aumentado 15% nas últimas duas semanas. Segundo Costa, não deverá haver aumentos neste ano. 

 

Ele acredita que o varejo deve estar com estoques baixos depois do bom resultado no Dia das Crianças, embora afirme que ainda há incertezas em relação aos pedidos que os lojistas farão para o Natal. 

 

Veículo: Valor Econômico


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