Consumidor vence ação sobre troca de produto

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Os consumidores conseguiram um importante precedente no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para exigir o reparo ou a substituição de produto após o período de garantia. Em decisão unânime, os ministros da 4ª Turma entenderam que o cliente pode reclamar de defeito oculto durante toda a vida útil do bem. O prazo de prescrição, porém, começa a contar com a descoberta do problema. "Pouco importa que ele [o defeito] tenha se exteriorizado depois de esgotado o prazo de garantia contratual, desde que dentro do que se esperava ser a vida útil do bem durável", afirma na decisão o ministro Luis Felipe Salomão, relator do caso.


No recurso analisado, a empresa catarinense Sperandio Máquinas e Equipamentos cobrava R$ 6,8 mil de um cliente pelo reparo de um trator agrícola, comprado três anos antes por R$ 43,9 mil. A garantia, de oito meses ou mil horas de uso, já havia expirado. Em depoimento, o mecânico que fez o reparo e um empregado da empresa atestaram que a vida útil do trator era de, pelo menos, 12 anos. Contaram ainda que diversos compradores tiveram o mesmo problema com o trator.


O STJ cancelou a cobrança. Os ministros interpretaram que, nos casos em que o defeito não é aparente, o prazo de 30 dias (bens não duráveis) ou 90 dias (bens duráveis) para o consumidor pedir a reparação ou troca do produto começa a ser contado a partir do momento em que fica evidenciado o defeito. Na interpretação deles, entre a compra e a apresentação do defeito, o consumidor está protegido com a garantia de que terá o produto reparado.


O Código de Defesa do Consumidor (CDC) determina, em seu artigo 26, os prazos para reclamar defeitos. A contagem é feita a partir da entrega do produto, exceto quando há o chamado "vício oculto". Neste caso, o parágrafo 3º do artigo 26 prevê que a contagem do prazo começa "no momento em que ficar evidenciado o defeito". Mas ainda havia dúvida sobre até quando a empresa estaria obrigada a responder pelos defeitos do produto. "De fato, o fornecedor não está para sempre responsável, mas, a meu juízo, sua responsabilidade não se limita pura e simplesmente ao prazo contratual de garantia, estipulado unilateralmente por ele próprio", diz Salomão.


A extensão da garantia para os casos de defeito não aparente foi permitida com base em uma dinâmica muito conhecida no mercado, mas pouco utilizada nas decisões judiciais: a da obsolescência programada. Criada entre as décadas de 20 e 30, a estratégia foi adotada por algumas empresas para reduzir a durabilidade ou o ciclo de vida dos componentes do produto para que haja nova compra. "É com olhos atentos ao cenário atual - e até com boa dose de malícia dada a massificação do consumo -- que o Judiciário deve analisar a questão do defeito do produto", afirma Salomão em seu voto.


As opiniões dos advogados se dividem sobre o impacto que a decisão terá na relação entre consumidores e empresas de bens duráveis, como computadores, celulares e eletrodomésticos. Para Brunno Giancoli, do Viseu Advogados, o precedente é uma sinalização importante do STJ ao mercado. "O consumidor pode começar a ajuizar ações de indenização pela baixa qualidade e durabilidade do produto", afirma. Na opinião de Giancoli, abriria-se ainda a possibilidade de uma empresa prejudicada pela obsolescência programada discutir a prática do concorrente no Judiciário ou no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).


Para a advogada Ana Paula Corrêa da Silveira Gomes, sócia do Marcelo Tostes Advogados, porém, a decisão não inova. "Parece-me que a obsolescência não é a motivação da decisão, mas apenas uma reflexão do ministro", diz, acrescentando que a primeira e a segunda instâncias e os juizados especiais não utilizam esse fundamento nas decisões de direito do consumidor. "Temos mais de 60 mil ações em andamento e nenhuma decisão se baseia nessa questão."


Procurado pelo Valor, o advogado da Sperandio Máquinas e Equipamentos, Michel Oliveira Braz, informou que não foi notificado, mas que vai estudar se recorrerá da decisão.



Por Bárbara Pombo | De Brasília


Fonte: Valor Econômico (11.10.12)

 


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