Normas de segurança e saúde facilitam abertura de empresa e compra de equipamento

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Com a proposta de simplificar a regulação, o Governo do Presidente Jair Bolsonaro alterou as NRs (Normas Regulamentadoras) relativas a questões de segurança e saúde no ambiente de trabalho. Nessa reformulação do arcabouço legal, publicada em 31 de julho, as normas mais modificadas foram a NR 1 (que serve como uma disposição geral para outras normas), a NR 2 (relativa à inspeção prévia em qualquer tipo de empresa) e, a mais debatida e criticada delas, a NR 12 (sobre segurança no trabalho no uso de máquinas e equipamentos).

 

O balanço dos especialistas é que as alterações facilitam a abertura de empresas e a compra de equipamentos. As NRs surgiram em 1978, quando o governo brasileiro criou 28 normas de uma só vez. Até a publicação da portaria do governo Bolsonaro, o País tinha 36 normas, mas agora, com uma delas revogada, passa para 35.

 

O objetivo dessas regras é estabelecer obrigações, tanto a trabalhadores quanto a empregadores, para evitar e prevenir acidentes e doenças no trabalho.

 

Como ato do executivo, as portarias do governo federal entram em vigor imediatamente após a publicação. Apenas quando há a necessidade de adaptações, é fixado um prazo para que a Portaria passe a vigorar. Neste caso, as portarias são de vigências imediatas.

 

O objetivo geral das regras é estabelecer obrigações para trabalhadores e empregadores a fim de evitar e prevenir acidentes e doenças no trabalho. No caso da norma regulamentadora 1, a mudança principal veio na liberação do microempreendedor e da empresa de pequeno porte na elaboração de programas sobre prevenção de risco ambiental e sobre controle médico de saúde.

 

Para isso, porém, é preciso que esses estabelecimentos estejam entre grau de risco 1 e 2 e não possuam riscos físicos, biológicos, químicos e ergonômicos. Na avaliação do advogado trabalhista do escritório NHMF, Henrique Soares Melo, a mudança será benéfica para as pequenas empresas que não apresentavam risco ao trabalhador.

 

Segundo Melo, até então, um escritório de pequeno porte, que tinha 20 ou 30 pessoas trabalhando, precisava todo ano contratar uma consultoria para fazer esses programas. "Não faz sentido um escritório, cujo maior risco é cortar a mão no papel, ter um documento complexo desses que tem custos e precisa de renovação anual", diz o especialista.

 

A definição desses riscos, no entanto, ainda não está clara, segundo o médico e diretor do Instituto Paulista de Segurança e Saúde no Trabalho João Opitz Neto. "Por exemplo, uma pessoa que trabalha muito tempo sentada ou muito tempo em pé se enquadra em risco ergonômico", adverte Opitz Neto.

 

Outro ponto preocupante é levantado pela advogada Adriane Bramante, especializada em direito previdenciário, e diz respeito às aposentadorias especiais. Adriane diz que, para a solicitação dessas previdências, é exigido que a empresa apresente um laudo chamado LTCAT (Laudo Técnico das Condições do Ambiente de Trabalho). Quando a companhia não possui esse documento, o INSS aceita o programa de prevenção de risco ambiental, que agora deixa de ser exigido das empresas de risco 1 e 2.

 

"A empresa pode alegar que não tem os riscos [químico, físico, biológico e ergonômico] e não fazer o programa. Então isso fica sob responsabilidade da fiscalização, que hoje, na verdade, é bem pouca", afirma Adriane.

 

Conforme Adriane, por um lado é bom ter alterações e modernizações nas leis, por outro precisa ter mais critério técnico. "O que acontece aqui não é modernização, e sim desburocratização", disse a advogada.

 

Vale lembrar, entretanto, que essa dispensa não desobriga as empresas de realizar exames médicos admissional e demissional. Além disso, as informações sobre segurança e trabalho precisarão ser declaradas digitalmente pelos estabelecimentos. Por enquanto, não há um sistema da Secretaria do Trabalho para receber tais dados, e enquanto não houver essa plataforma, o documento estabelece que as empresas mantenham uma declaração de inexistência de riscos em suas sedes.

 

Já em relação à revogação da NR 2, o que houve foi o fim da exigência de inspeção prévia antes da abertura de estabelecimentos. Para o advogado André Fittipaldi, do escritório TozziniFreire, a mudança é positiva, uma vez que tira um entrave para abrir o próprio negócio, sem extinguir a fiscalização.

 

Além das alterações das normas, o governo também criou um grupo para revisar a política de segurança e saúde no trabalho. Esse grupo será composto por três representantes indicados pela Secretaria do Trabalho, dois representantes indicados pela Secretaria da Previdência, três representantes dos empregadores e três dos trabalhadores.

 

O grupo terá 60 dias (após publicação de portaria com os nomes dos membros) para desenvolver uma proposta de revisão da PNSST (Política Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho). A participação dos membros no grupo será considerada prestação de serviço público relevante, sem remuneração.

 

Mudanças põem fim a especificidades de outras regras

A NR 1 funciona como um guia para a aplicação das demais NRs. Na prática, ela já tinha esse caráter. O que ocorre, agora, é uma atualização.

 

O fim de especificidades dentro de cada norma, porém, pode atrapalhar a fiscalização, segundo a presidente da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), Noemia Porto. "Essa norma vinha na mesma linha da Convenção nº 155 da OIT (Organização Internacional do Trabalho). Agora, não. Ela desorienta a fiscalização do trabalho quanto à rigidez laboral", destaca Noemia.

 

"A questão da certificação de aprovação de instalações, por exemplo. Antes você tinha uma série de critérios, e, agora, elas se tornaram mais gerais. Então como você vai saber que uma empresa está adotando instalações consideradas seguras?", questiona a especialista.

 

Outra das regras universais dessa norma é que o microempreendedor e a empresa de pequeno porte não precisam mais elaborar programas sobre prevenção de risco ambiental e sobre controle médico de saúde. Para isso, porém, é preciso que esses estabelecimentos estejam entre grau de risco 1 e 2 (confira no quadro 1 o grau de sua empresa) e não possuam riscos físicos, biológicos, químicos e ergonômicos.

 

Na avaliação do advogado trabalhista Henrique Soares Melo, do escritório NHMF, a mudança será benéfica para as pequenas empresas que não apresentavam qualquer tipo de perigo ao trabalhador. A definição desses riscos, no entanto, ainda não está clara.

 

Na avaliação do diretor do Instituto Paulista de Segurança e Saúde, João Opitz Neto, sem um acompanhamento médico, o trabalhador pode ficar desassistido, enquanto a empresa fica sem provas a seu favor em disputas judiciais. "Para a empresa de menor porte, o custo desses programas é mesmo elevado, mas não ter esse controle e fazer documentos avulsos, como é proposto agora, vai ser um procedimento meramente protocolar, porque o médico não conhecerá a empresa nem os riscos operacionais", afirmou.

 

Segundo o médico, para o trabalhador, a alteração é ruim, porque não vai haver alguém acompanhando a sua saúde no ambiente de trabalho, e para as pequenas empresas também, pois, em uma eventual ação na Justiça do Trabalho, não terá documentos para conseguirem comprovar determinadas situações.

 

A Norma Regulamentadora nº 1 estabelece, ainda, que treinamentos de capacitação poderão ser aproveitados de forma total ou parcial por uma empresa diferente daquela que forneceu o curso. O treinamento, no entanto, precisa ter sido feito há menos de dois anos, e o trabalhador precisa ter cumprido toda a carga horária e conteúdo exigidos.

 

Termina a necessidade de aprovar instalações para início das atividades

A Norma Regulamentadora nº 2 foi revogada nas mudanças feitas pelo governo. Em seu primeiro item, essa NR exigia que todo estabelecimento novo, antes de iniciar suas atividades, devesse solicitar aprovação de suas instalações, o que deixa de valer. Sobre a necessidade dessa inspeção prévia, há quem concorde com a mudança e quem discorde.

 

Para o advogado André Fittipaldi, do escritório TozziniFreire, a mudança é positiva, uma vez que tira um entrave para abrir o próprio negócio, sem extinguir a fiscalização. "Na prática, tira uma burocracia que existe para abrir uma empresa, mas não muda o fato de que a fiscalização pode, a qualquer momento, ocorrer", segundo Fittipaldi.

 

Para o advogado Henrique Soares, essa norma já não era seguida à risca pelos órgãos fiscalizadores. "Era um documento muito raro de encontrar. Era uma obrigação um tanto em desuso. O que acontece é que a própria fiscalização do trabalho já estava deixando de solicitá-lo. Em resumo, estamos falando quase de uma letra morta", informa Soares.

 

Acabar com a exigência dessa inspeção em todas as empresas, contudo, não seria o ideal, de acordo com o médico João Opitz Neto. "O bom senso seria um meio termo. Por exemplo, para empresas de grau de risco 1 e 2 não teria inspeção prévia, e para as de grau de risco 3 e 4 teria. Tirar totalmente é complicado", defende o também diretor do Instituto Paulista de Segurança e Saúde no Trabalho.

 

"Para uma lanchonete e para atividades sem risco, tudo bem não ter essa inspeção prévia. Para uma grande indústria, o mais coerente seria que tivesse", disse Opitz Neto.

 

A revogação dessa norma "foi assustadora", segundo a presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Noemia Porto. "Sempre que se fala em saúde e segurança no ambiente do trabalho, fala-se em prevenção. Com o cancelamento disso, estamos recuando em políticas de prevenção de acidentes e adoecimentos em segmentos econômicos que são conhecidos por serem perigosos", lamenta a juíza. 

 

Alterações na Norma Regulamentadora nº 12 eram as mais esperadas

Desde 2010, quando ocorreu um maior detalhamento no uso de máquinas e equipamentos, os empresários vêm reclamando da dificuldade em cumprir o exigido. A NR 12 é a mais debatida e polêmica entre as normas regulamentadoras, segundo os especialistas. Isso porque ela estabelece exigências em relação a máquinas e equipamentos que as empresas utilizam.

 

Com a publicação da portaria, as principais alterações passam a ser a não exigência de certificação de determinadas máquinas importadas (aquelas em que a lei brasileira não entra em detalhe) e de máquinas já certificadas pelo Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia).

 

O advogado do escritório TozziniFreire, André Fittipaldi, diz que a burocracia exigida para seguir todos os dispositivos da NR 12 dificultava o trabalho das empresas. Agora, segundo o advogado, o País "passa a se comunicar com as regras de fora".

 

Já para a presidente da Anamatra, Noemia Porto, as modificações estão tirando a segurança que a norma garantia. "Máquinas que recebem certificação internacional serão consideradas automaticamente seguras. O que é um problema hoje, antigamente não era assim. Agora, há uma presunção inicial de segurança", defende Noemia.

 

Até a publicação da portaria do governo Bolsonaro, máquinas e equipamentos comprados no exterior precisavam passar por uma avaliação interna no Brasil e receber a certificação de que aquele instrumento seguia todas as exigências da NR 12. Com a nova portaria, algumas máquinas (aquelas em que a lei brasileira não entra em detalhe) não precisam mais se adequar à norma.

 

Antes da portaria publicada pelo secretário Rogério Marinho, empresas que compravam máquinas já certificadas pelo Inmetro tinham que adequá-las também com as regras da NR 12. Agora, a certificação do Inmetro já basta para a utilização desses equipamentos.

 

Como a Norma Regulamentadora nº 12 era abrangente, máquinas que não tinham nenhum movimento (as estáticas) tinham de passar por certificação. O mesmo ocorria com ferramentas de pequeno porte, como parafusadeiras. A nova portaria especifica que esses equipamentos não precisam mais se enquadrar nas normas da NR 12. 

 

Confira os reflexos das alterações promovidas pelo governo federal

 

O que muda com a nova NR 1:

  • Regra que permite ao trabalhador suspender o serviço em caso de risco, que antes estava detalhada em diferentes normas, agora está prevista como conceito geral;
  • Pequena empresa de risco 1 e 2 (de menor grau) deixa de ser obrigada a realizar programas de prevenção de risco ambiental e programa de controle médico;
  • Sem tais programas, porém, essas companhias podem ficar desprotegidas em ações trabalhistas;
  • Trabalhadores das pequenas empresas podem ficar desprotegidos sem acompanhamento médico;
  • Aposentadoria especial para trabalhador de pequena empresa fica ameaçada;
  • Trabalhador que fizer cursos de segurança em uma área específica em uma empresa não precisa fazer outro curso com o mesmo conteúdo se trocar de emprego (em menos de dois anos) e assumir área correlata.

 

O que muda com a revogação da NR 2:

  • Não é mais obrigatória a inspeção prévia de órgãos do trabalho para qualquer estabelecimento abrir as portas;
  • A fiscalização pode ocorrer após o início das operações;
  • A não exigência dessa análise prévia em companhias de risco 3 e 4 (de maior grau) pode colocar trabalhador em perigo.

 

O que muda com a nova NR 12:

  • Máquinas compradas no exterior e que têm certificação internacional não precisam se adequar a normas da NR 12, quando lei brasileira não fizer detalhamento;
  • Quando máquinas e equipamentos são certificados pelo Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia), não é preciso mais adequação às regras da NR 12;
  • Equipamentos estáticos e ferramentas portáteis não precisam mais ser certificados pela NR 12.

 

Fonte: Jornal do Comércio – 21/08/2019.

 

*Confira os documentos abaixo, disponibilizados no site da Secretaria de Trabalho, no Ministério da Economia, no dia 30/07/2019:

 

Apresentação - Modernização das NRs e Consolidação Normativa

 

Aviso de Consulta Pública 

 

Instrução Normativa Nº 001, de 30 de julho de 2019 - SIT

 

Portaria Nº 915, de 30 de julho de 2019 - NR1

 

Portaria Nº 916, de 30 de julho de 2019 - NR12

 

Portaria Nº 917, de 30 de julho de 2019 - Revisão da Política Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho

 

Decreto sobre Conselho Nacional do Trabalho / Comissão Tripartite Paritária Permanente

 

Acordo de Cooperação Técnica com a Fiesp

 

Acordo de Cooperação Técnica com a Firjan 

 

Acordo de Cooperação Técnica com a Fiesc

 

 


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