Reforma da CLT deve impedir herdeiro de cobrar danos morais

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Uma polêmica previsão que consta na lei da reforma trabalhista poderá impedir herdeiros de buscar na Justiça, como espólio, indenização por danos morais sofridos por trabalhador. O texto, que deixa margem para interpretação, segundo advogados, é contrário à jurisprudência. Hoje o entendimento predominante no Tribunal Superior do Trabalho (TST) é o de que os familiares têm direito a entrar com ação judicial para fazer a cobrança.

 

A Lei nº 13.467, de 13 de julho, que altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), entra em vigor no mês de novembro. O artigo 223-B da norma determina que "causa dano de natureza extrapatrimonial a ação ou omissão que ofenda a esfera moral ou existencial da pessoa física ou jurídica, as quais são as titulares exclusivas do direito à reparação".

 

Para a advogada Juliana Bracks, do escritório Bracks Advogados Associados, professora da FGV-RIO e PUC-Rio, a redação do artigo é clara e encerra a polêmica. "A família pode cobrar danos morais sobre o sofrimento que teve com a perda de um ente querido. Mas o espólio não poderá mais ajuizar ação entendendo que o trabalhador tinha um dano moral a cobrar da empresa e não o fez", diz. De acordo com ela, não daria para dizer que o empregado tinha mesmo a intenção de cobrar uma indenização.

 

No Tribunal Superior do Trabalho, os ministros têm garantido o direito aos herdeiros por meio da aplicação do artigo 943 do Código Civil. O dispositivo estabelece que "o direito de exigir reparação e a obrigação de prestá-la transmitem-se com a herança".

 

Agora, porém, com lei específica, a perspectiva, segundo Juliana, é de mudança de entendimento no tribunal superior. A previsão é reforçada pelo fato de o artigo 223-A da norma determinar que "aplicam-se à reparação de danos de natureza extrapatrimonial decorrentes da relação de trabalho apenas os dispositivos deste título".

 

Porém, para outros especialistas da área trabalhista, a redação do artigo da Lei nº 13.467 não é tão clara e poderia dar margem para interpretação. O problema é quem seriam esses titulares do direito: apenas o trabalhador ou os autores da ação, no caso os herdeiros.

 

Na opinião do advogado trabalhista Arthur Cahen, sócio do escritório Cahen e Mingrone Advogados, a redação da forma como está trata apenas do caráter personalíssimo do titular do direito, sem dizer claramente se ele seria intrasmissível aos seus herdeiros, o que acabaria com controvérsias.

 

Um dos casos analisados pelo Tribunal Superior do Trabalho, segundo Cahen, tratou de um ex-empregado de uma empresa que teria sofrido assédio moral e depois se suicidou. "A família depois de alguns anos ajuizou ação pedindo reparação por danos morais pelo assédio que o trabalhador sofreu e o TST entendeu que esse direito era transmissível aos herdeiros", diz.

 

Para o advogado, a nova previsão não será suficiente para os magistrados reverterem esse entendimento. "A mudança na lei não faz com que exista uma alteração automática no pensamento de quem julga. O magistrado pode usar a interpretação de um conjunto de leis e deixar de aplicar um dispositivo que trata de um tema específico."

 

A advogada trabalhista Daniela Yuassa, do escritório Stocche Forbes Advogados, também concorda que o texto ainda pode trazer as mais diversas interpretações. "O texto apenas diz que é direito exclusivo do titular. Não está excluindo de forma explícita o espólio. Ainda existe margem para discussão", afirma.

 

Todo esse capítulo da lei que trata do dano extrapatrimonial e de sua precificação, segundo a advogada, traz previsões polêmicas, que podem ainda ser alteradas por medidas provisórias pelo governo federal. Sem ajustes no texto, acrescenta, deverão gerar controvérsias no Judiciário. "Tudo isso deve ser ainda muito questionado daqui para frente", diz Daniela.

 

Por Adriana Aguiar | De São Paulo

 

Fonte: Valor Econômico (12.09.2017)


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