TRF cancela arrolamento de bens de empresa com débito

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O arrolamento de bens de contribuintes pode ser cancelado mesmo que ainda existam débitos pendentes com o Fisco. Esse foi o entendimento do Tribunal Regional Federal (TRF) da 2ª Região ao julgar um caso em que, após discussão administrativa, houve redução dos valores dados como devidos pela fiscalização e o montante atualizado não mais atingia os requisitos previstos para o procedimento.

 

Pela Lei nª 9.532/97, o arrolamento é permitido sempre que a dívida tributária for maior que R$ 2 milhões e, ao mesmo tempo, ultrapassar 30% do patrimônio conhecido do contribuinte.

 

Quando isso ocorre, a Receita Federal pode já após a autuação fazer uma lista de bens que sejam suficientes ao pagamento de tais débitos e enviar comunicado aos órgãos de registro (Detran e cartório de registro de imóveis, conforme o caso). O arrolamento fica averbado na documentação dos veículos e nas matrículas dos imóveis.

 

Esse é um procedimento, segundo especialistas, de monitoramento – para evitar a dilapidação de patrimônio do devedor e, dessa forma, resguardar os valores da dívida. Não impede, na teoria, a venda dos bens, mas, na prática, prejudica.

 

"É o pior efeito para os contribuintes. Cria um óbice. É muito difícil fechar negócio quando os bens estão arrolados", diz o representante da empresa que teve o caso julgado pelo TRF da 2ª Região, Giuseppe Pecorari Melotti, do escritório Bichara Advogados.

 

O caso envolve uma companhia do setor de energia que teve arrolados os veículos de sua frota. A empresa não conseguiu cancelar o procedimento mesmo depois de demonstrar ao Fisco que os seus débitos não se enquadravam mais nos parâmetros estabelecidos ao procedimento.

 

O contribuinte havia conseguido, no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), reduzir a dívida em R$ 560 milhões – caindo de mais de 30% para 10,2% do patrimônio conhecido. Após a decisão tentou o cancelamento por via administrativa. A resposta que obteve do Fisco, no entanto, foi que só ocorreria "quando todos os débitos que o motivaram estivessem extintos ou garantidos".

 

No processo judicial a Receita manteve o argumento de que não há previsão legal para desfazer o procedimento. Citou que existe somente a possibilidade de cancelamento proporcional à dívida, conforme consta em Instrução Normativa (IN nº 1.565/2015).

 

O Fisco teve decisão favorável em primeira instância. Já no tribunal, os desembargadores da Turma Especializada em Direito Tributário entenderam, de forma unânime, que a manutenção da medida administrativa quando já não estão mais presentes os seus pressupostos "fere o princípio da legalidade".

 

"A ideia do legislador foi a de monitorar eventual dilapidação patrimonial, que se inexistente, não permite a manutenção da penalidade", afirma em seu voto o relator Marcus Abraham. "Nem se diga que a medida não caracteriza restrição apta a causar prejuízo à parte. Não se desconhece que se a existência de averbação de arrolamento não impede a venda em leilão pretendida, certamente a dificultará ao extremo", acrescenta.

 

O advogado Marcelo Annunziata, do escritório Demarest, lembra que há jurisprudência pacífica no Superior Tribunal de Justiça (STJ) no sentido de cancelar o arrolamento no caso da venda dos bens. Destaca, entretanto, que um de seus clientes teve negado o pedido, recentemente, tanto pelo Fisco como pela primeira instância da Justiça Federal.

Ele representou, nesse caso, o comprador dos imóveis que estavam arrolados. "Uma empresa que nada tem a ver com os débitos está sendo prejudicada", pondera.

 

A juíza que analisou o caso aceitou a argumentação do Fisco de que o arrolamento não poderia ser cancelado porque o contribuinte havia comunicado sobre a venda dos bens depois do prazo determinado – o que, segundo o advogado, não ocorreu. Ele ingressou com recurso no tribunal, mas o caso não foi ainda analisado.

 

O advogado Felipe Renault, sócio do Salusse Marangoni Advogados, chama a atenção que existe um caminho alternativo ao Fisco para os casos em que o contribuinte devedor tenha deixado de comunicar sobre a venda de bens arrolados. Trata-se da chamada ação cautelar fiscal.

 

"Tem justamente o objetivo de evitar um dano. Então, o Fisco pode ir a juízo e pedir, por exemplo, a anulação da venda ou mesmo uma penhora sobre o faturamento do contribuinte a quem responde o débito", diz.

 

Procurada pelo Valor, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informou por meio de nota que não se manifestaria porque ainda não foi intimada da decisão do TRF da 2ª Região.

 

Por Joice Bacelo | De São Paulo

 

Fonte : Valor Econômico (29.06.2017)


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