Tribunais regionais não seguem súmulas e geram recursos ao TST

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Milhares de processos são levados todos os anos ao Tribunal Superior do Trabalho (TST). Um dos motivos é o fato de parte dos juízes não seguir entendimentos consolidados pelos ministros – mesmo com a edição de súmulas. Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) – entre eles o da 2ª e o da 4ª Região, com sedes em São Paulo e Porto Alegre, respectivamente – mantêm orientações de jurisprudência contrárias a enunciados do TST.

Os regionais não são obrigados a seguir as súmulas do TST. Porém, entendimentos divergentes indicam, na prática, que decisões serão reformadas pelos ministros. "Cria uma dificuldade. O processo vai demorar mais e gera uma expectativa falsa para quem supostamente ganhou", afirma o advogado e professor de direito trabalhista da PUC-SP e da Fundação Getulio Vargas (FGV), Paulo Sérgio João.

 

Um dos temas em que há discordância trata da estabilidade provisória de gestantes em contrato por prazo determinado. Desde 2012, o TST afirma, na Súmula nº 244, que a empregada gestante tem direito à estabilidade provisória prevista na Constituição mesmo na hipótese de admissão mediante contrato por tempo determinado.

Porém, o TRT da 2ª Região, que abrange a região metropolitana de São Paulo e litoral, mantém desde 2015 uma "tese jurídica prevalecente" que diverge do entendimento. A tese é um enunciado aprovado por maioria relativa – e não absoluta como as súmulas – dos membros do Tribunal Pleno do TRT e não é obrigatória.

 

Na prática, a diferença de entendimentos estimula as partes a recorrer das decisões, segundo Caroline Marchi, sócia do escritório Machado Meyer. "O Judiciário reclama da quantidade de processos. Mas também é responsável por eles", afirma.

No caso específico da Súmula nº 244, o próprio TST reformou seu entendimento sobre o tema, segundo Caroline. "Isso gera insegurança jurídica, mas o Judiciário vai avançando nos seus entendimentos conforme as partes provocam", ponderou.

 

Outro tema que acaba gerando recursos ao TST, segundo a advogada Karine Loschiavo, do Peixoto & Cury Advogados, é o da Súmula nº 219. O texto traz dois requisitos para a concessão de honorários advocatícios – o trabalhador precisa estar assistido por representante do sindicato profissional e fazer jus à gratuidade processual. O TRT da 4ª Região (RS), porém, defende o pagamento mesmo quando a parte não estiver assistida pelo sindicato.

Karine afirma que as decisões sobre o tema que levou ao TST foram reformadas. O julgamentos têm sido rápidos. Em média, demoram seis meses. A advogada explica que não é necessário pagar custas para recorrer ao TST – apenas se a instância anterior elevar o valor da condenação.

 

Já o valor pago aos advogados pode variar. Normalmente, os profissionais cobram 30% do valor que vier a ser pago em ação trabalhista, segundo Karine. Mas eles têm a possibilidade de estabelecer percentuais de forma escalonada, conforme a parte recorra a instâncias superiores – não ultrapassando os 30%.

De acordo com o desembargador Wilson Carvalho Dias, do TRT da 4ª Região, regionais tentam com entendimentos divergentes fazer com que questões sejam rediscutidas pelo TST. Ela cita como exemplo a súmula editada sobre honorários. A intenção é fazer com que os ministros retomem o debate em recurso repetitivo – que, então, deverá ser adotado pelo tribunal regional. "A chance de prevalecer nosso entendimento é pequena. Mas a questão será rediscutida e nossos argumentos terão que ser analisados."

 

Outro tema que gera discordância é o sobre recolhimento de contribuições assistenciais por não associados. O Precedente Normativo nº 119 do TST afirma que são nulas as determinações de acordo ou convenção coletiva que estabeleçam contribuição em favor de entidade sindical a título de taxa para custeio e semelhantes para os trabalhadores não sindicalizados.

Na Súmula 86, o TRT da 4º Região defende, no entanto, que a contribuição assistencial prevista em acordo, convenção coletiva ou sentença normativa é devida por todos os integrantes da categoria, associados ou não do sindicato.

 

A última súmula aprovada pelo TST, de número 462, também não é seguida. Diz o texto que a multa imposta pela CLT quando há atraso no pagamento de verba rescisória incide mesmo que a relação de emprego tenha sido reconhecida apenas em juízo. Já a tese Jurídica Prevalecente nº 2 do TRT da 2ª Região afirma que o reconhecimento de vínculo empregatício em juízo não enseja a aplicação da multa, em razão da controvérsia.

Para o desembargador Manoel Antônio Ariano, presidente da Comissão de Uniformização de Jurisprudência do TRT da 2ª Região, as divergências são naturais e não são prejudiciais às partes. Ele explica que a Lei nº 13.015, de 2014, obriga os tribunais a consolidar teses com os entendimentos dominantes – que nem sempre serão unânimes e aplicados por todos.

 

O desembargador defende que o tribunal não tem nenhuma súmula contrária ao TST, apenas teses jurídicas prevalecentes, que não precisam de maioria absoluta para serem fixadas e não vinculam os juízes. Ele pondera, porém, que a tendência, na maioria dos casos, é o juiz seguir as súmulas do TST.

A divergência, segundo Ariano, faz as matérias chegarem mais amadurecidas às instâncias superiores. "Se você cerceia esse processo, acaba tomando o entendimento do primeiro que julgou o assunto", diz. "O direito não pode ser amarrado."

 

Procurados pelo Valor, o Ministério Público do Trabalho (MPT) e o Tribunal Superior do Trabalho (TST) não retornaram até o fechamento da edição.

 

Por Beatriz Olivon | De Brasília

 

 

Fonte: Valor Econômico (22.08.2016)


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