Tribunal paulista cancela protesto de dívidas de ICMS

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A 11ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) determinou que a Fazenda paulista cancele protestos de dívidas de ICMS. Apesar de o Órgão Especial já ter considerado a prática constitucional, os Desembargadores aceitaram o argumento de que a cobrança deveria ser feita pelo meio menos prejudicial ao Contribuinte.

Especialistas afirmam que a decisão, favorável a uma fabricante de produtos escolares e de escritório, abre precedente para uma nova discussão sobre o protesto de certidões de dívida ativa (CDAs) e a inclusão do nome de contribuintes em órgãos de proteção ao crédito. Isso porque desta vez, ao contrário de outros julgados, não foi discutida a legalidade da prática.

 

Relator do caso, o Desembargador Ricardo Dip afirma, no Acórdão, que "ainda que se reconheça a admissibilidade legal do protesto", deve-se observar o artigo 620 do Código de Processo Civil (CPC). O dispositivo – que no novo CPC consta no artigo 805 – determina que "quando por vários meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor".

O Advogado Marcelo Annunziata, do Escritório Demarest, chama a atenção que as discussões judiciais, até agora, abordavam a questão da legalidade do protesto de dívida ativa, se era ou não possível. Advogados de contribuintes argumentavam, principalmente, que a certidão de dívida ativa já é um título executivo extrajudicial para promover a execução. Os tribunais, no entanto, vinham se manifestando em favor do Fisco.

 

No ano passado, o Órgão Especial do TJ-SP reconheceu a constitucionalidade do protesto. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) também já tratou do assunto. A 2ª Turma decidiu pela legalidade. O caso envolvia a Prefeitura de Londrina, no Paraná, e uma empresa de engenharia.

O sócio da área tributária do Veirano Advogados, João Agripino Maia, entende, no entanto, que a discussão – após essa nova abordagem – seguirá "completamente renovada" ao STJ. "Os desembargadores do TJ-SP abordaram a questão da onerosidade. Então, quando essa questão chegar ao STJ, os Ministros terão de analisá-la por este fundamento, não mais se é constitucional ou não", diz.

 

Para o especialista, a legislação protege o credor – garantindo a execução da dívida ao fim do processo – e devedor, que ao fim da ação pode sair vencedor e não dever nada ao Fisco. Ele destaca ainda que, no caso do protesto, a única forma de retirá-lo é pagar os valores supostamente devidos em dinheiro, ou via depósito judicial.

"E essa é a forma mais onerosa ao devedor. O processo se estende por cinco, seis anos. Imagine uma Empresa ter de retirar R$ 50 milhões do seu fluxo de caixa e deixar lá parado por todo esse tempo. Isso pode ser a morte para ela. Diferentemente da ação, em que a dívida pode ser garantida com uma carta-fiança ou com um bem imobilizado", afirma o tributarista.

 

Até 2012 o Fisco levava a protesto somente dívidas menores que o custo de um processo de execução. "Era uma alternativa de cobrança", diz a advogada Gabriela Jajah, do escritório Siqueira Castro. "Depois o que era alternativa passou a ser regra geral."

O entendimento mudou após a edição da Lei federal nº 12.767, que acrescentou parágrafo único ao artigo 1º da Lei nº 9.492, de 1997 – que trata sobre protesto de títulos e outros documentos de dívidas. O dispositivo incluiu "entre os títulos sujeitos a protesto as certidões de dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos municípios e das respectivas autarquias e fundações públicas".

 

A norma é bastante contestada por advogados e entidades empresariais. O argumento é o de que a prática foi autorizada em uma medida provisória que alterava as regras do setor elétrico. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) ingressou com uma ação direta de inconstitucionalidade contra o artigo que foi acrescentado à Lei nº 9.492, mas ainda não houve julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Representante da indústria envolvida no caso julgado pelo TJ-SP, Frederico Loureiro, do escritório Loureiro, Cione, Simionato e Carvalho Advogados, diz que o principal problema para as empresas protestadas é a dificuldade de obter crédito. "Só serve [o protesto] para deixar a posição do contribuinte muito prejudicada perante o mercado", afirma o advogado.

 

O governo de São Paulo já recorreu da decisão. Por nota, a Procuradoria-Geral do Estado afirma que "a possibilidade do protesto de certidão da dívida ativa de ICMS já foi declarada constitucional pelo Órgão Especial do TJ-SP" e considera "como isolada" a decisão da 11ª Câmara de Direito Público.

 

Por Joice Bacelo

 

De São Paulo

 

 

Fonte: Valor Econômico (08.03.2016)


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