Proposta quer flexibilizar prazo de validade de alimentos

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Medida tem como objetivo reduzir o desperdício; em 2020 descarte em supermercados superou R$ 2 bilhões

 

Alguns produtos alimentícios podem ter o seu prazo de validade flexibilizado para que sejam melhor aproveitados e evitar seu descarte ainda em condições de consumo. Essa é a proposta da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia), com objetivo principal de combater o desperdício. A mudança incluiria a adoção em alguns produtos de um termo similar a "consumir preferencialmente antes de", originado do conceito best before, já aplicado na União Europeia e em países como Estados Unidos e Canadá.

 

"O best before é um conceito já utilizado em diversos países, com o objetivo de reduzir o desperdício. Aqui, a regra é clara: se passou da data limite, o alimento não pode mais ser comercializado nem consumido, o que pode fazer com que muita comida, ainda em condições adequadas e seguras para o consumo, vá para o lixo", afirma João Dornellas, presidente executivo da Abia.

 

De acordo com a associação, os produtos com a data de validade vencida representam hoje uma das maiores causas de desperdício de alimentos nos supermercados. Conforme o Código de Defesa do Consumidor, no Brasil hoje são impróprios para uso ou consumo qualquer produto cujo prazo de validade esteja vencido. Apenas em 2020, segundo pesquisa da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), as perdas de produtos alimentares descartados por conta do prazo de validade representaram valor superior a R$ 2 bilhões.

 

"Os supermercados trabalham a administração e o manejo desses produtos da forma mais eficiente possível, mas a questão do descarte é sem dúvida um problema. Por isso, essa proposta da Abia, com a chancela de uma associação tão importante, deve ser analisada com consideração. O debate é certamente válido", comenta Antônio Cesa Longo, presidente da Associação Gaúcha de Supermercados (Agas). 

 

Mudança é viável apenas com produtos específicos

 

O best before é um conceito regulatório que indica um período mínimo em que um produto mantém sabor e valor nutricional, se armazenado adequadamente. Mas essa mudança se aplicaria apenas a alimentos não perecíveis e de baixo risco de contaminação, como biscoitos, chocolate, massas e conservas.

 

"Os produtos alimentícios que, mantidas as condições de armazenamento indicadas no rótulo, conservem suas propriedades específicas, podem utilizar best before. Alguns exemplos são os estáveis em temperatura ambiente, os que possuem atividade de água baixa, os que passam por processo de esterilização e os embalados a vácuo", destaca João Dornellas.

 

Por outro lado, a Abia não recomenda a aplicação em produtos que tenham aspectos microbiológicos muito perecíveis, como carnes in natura, leite pasteurizado e queijos, entre outros. A nutricionista Claudia Kirst, mestra em Endocrinologia, reforça esse entendimento.

 

"Alguns produtos estarão seguros após a data de validade, desde que mantidos na embalagem preservada. O que acontece é uma mudança no sabor. Muitas datas de validade referem-se à qualidade, não à segurança. Já alimentos de origem animal, incluindo os lácteos, e vegetais in natura, não são produtos com margem aceitável para essa mudança", avalia. No entendimento da Abia, a adoção do conceito pode trazer redução considerável nas perdas de alimentos, questão fundamental diante do agravamento da fome na pandemia.

 

Adoção deve ser vinculada a programas de qualidade

 

Para a nutricionista Claudia Kirst, o prazo de validade é definido a partir de estudos em laboratório, onde os alimentos passam por diferentes situações de temperatura e umidade, com avaliação das perdas de nutrientes, questões microbiológicas, qualidade sensorial, aparência e sabor. A especialista também alerta para possíveis riscos que uma alteração inadequada poderia acarretar.

 

"Primeiro, a não garantia do consumo integral dos nutrientes. Depois, a segurança no consumo do alimento, com relação à potencial liberação de substâncias tóxicas provenientes da degradação ou à presença de micro-organismos patogênicos. Muitas vezes, esses indícios podem não fornecer sinais visíveis de que o alimento se tornou inseguro para consumo", pondera.

 

De acordo com a própria recomendação da Abia, a adoção do best before deve ser obrigatoriamente vinculada a rígidos programas de qualidade, tais como análise de pontos críticos de controle e boas práticas de fabricação. Além disso, a associação também sustenta que a alteração seja acompanhada de uma campanha de comunicação para explicar a mudança ao público, e que a proposta seja adequadamente examinada pelas autoridades competentes.

 

"A Abia entende que a adoção do best before pode ser uma estratégia eficaz no combate ao desperdício de alimentos. No entanto, por se tratar de uma mudança regulatória, a entidade defende que seja devidamente estudada pelos órgãos competentes para que, caso seja entendida como uma boa proposta, possa ser regulamentada", reitera o presidente executivo da entidade, João Dornellas. A expectativa da associação é de que em alguns meses o governo federal possa apresentar uma proposta para a implementação do conceito no país.

 

Mathias Boni

 

Fonte: Jornal do Comércio RS – 05/12/2021


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