4ª Turma afeta à Corte Especial tese sobre Selic para condenações por dívida civil

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A 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu, mais uma vez, afetar à Corte Especial um processo que discute o afastamento da taxa fazendária (Selic) para correção de dívidas civis, conforme dispõe o artigo 406 do Código Civil.

 

O tema estava em julgamento em dois recursos especiais, de forma separada, desde novembro de 2020. Nesta quarta-feira (26/10), após voto-vista do ministro Raul Araújo e empate por dois a dois na votação, a ministra Isabel Gallotti propôs a afetação de um dos processos ao colegiado que reúne os 15 ministros mais antigos do STJ.

 

A afetação foi proposta no REsp 1.795.982, levando em consideração que seu resultado possivelmente confronta com o que a Corte Especial decidiu no EREsp 727.842, em que fixou que a taxa dos juros moratórios a que se refere artigo 406 do Código Civil é a Selic, porque incide como juros moratórios dos tributos federais.

 

Também estava em julgamento o REsp 1.081.149, que igualmente fora enviado para a Corte Especial. Em fevereiro de 2019, o colegiado decidiu pela desafetação, devolvendo à 4ª Turma por conta de óbices ao conhecimento do recurso.

 

Na discussão, ressaltou-se que o tema da Selic em condenações por dívida civil deveria ser firmado nas turmas de Direito Privado antes de chegar à Corte Especial. Foi o que motivou o relator dos dois processos, ministros Luis Felipe Salomão, a pautar a discussão na 4ª Turma.

 

Com a afetação do REsp 1.795.982, o REsp 1.081.149 fica paralisado com pedido de vista do ministro Raul Araújo, até que a Corte Especial faça o julgamento.

 

Para além desses recursos, essa mesma discussão já está, inclusive, na Corte Especial em sede de embargos de divergência admitidos em março de 2021, contra acórdão da 3ª Turma que manteve a aplicação da taxa Selic em caso de condenação por dívida civil. Esse processo é o EREsp 1.731.193.

 

Até a proposta de afetação, a 4ª Turma se mostrou dividida sobre o tema. O ministro Marco Buzzi, que seria o último a votar e desempataria o julgamento, não chegou a se pronunciar sobre o mérito do recurso.

 

Proposta de distinguishing

 

Relator, o ministro Luis Felipe Salomão propôs se adotasse uma distinção na correção de dívidas em casos relacionados a danos contratuais e extracontratuais no campo do Direito Privado.

 

Em vez da taxa Selic, a aplicação da taxa de 1% eleita pelo parágrafo 1º do artigo 161 do Código Tributário Nacional. A norma diz que, "se a lei não dispuser de modo diverso, os juros de mora são calculados à taxa de um por cento ao mês".

 

Segundo Salomão, a Selic não atualiza adequadamente os valores. Seu cálculo inclui simultaneamente juros moratórios e correção monetária, enquanto que, em casos de dívida civil, esses consectários fluem a partir de momentos diferentes.

 

Em caso de responsabilidade extracontratual, os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, segundo a Súmula 54 do STJ. Se a condenação decorrer de relação contatual, o termo inicial da contagem é a citação. Já quanto à correção monetária, o termo inicial é a data da prolação da decisão que fixou o seu valor, como dispõe a Súmula 362.

 

Além disso, a taxa Selic não é um espelho do mercado, mas o principal instrumento de política monetária atualizada pelo Banco Central no combate à inflação. Tem forte componente político e é fixada com objetivo de interferir na inflação para o futuro, e não de refletir a inflação apurada no passado.

 

"Sua adoção na atualização de dívidas judiciais conduz a uma oscilação anárquica dos juros efetivamente pagos pela mora, com grandes distorções em relação ao mercado e injustiça gritante", destacou o relator.

A posição foi acompanhada pelo ministro Antonio Carlos Ferreira.

 

Coerência sistêmica

 

Abriu a divergência o ministro Raul Araújo, para quem, conforme já definiu a Corte Especial, a taxa de correção de juros do artigo 406 do Código Civil é mesmo a Selic.

 

No voto, destacou que a norma civil não invoca a aplicação do artigo 161, parágrafo 1º, do CTN, tampouco exige que estejam juros de mora e correção previstos em índice oficiais separados e distintos. Assim, a proposta feita pelo relator não possui qualquer base legal e, com isso, não se sustenta.

 

Para o ministro Raul, essa definição pelo Judiciário deve observar a coerência do sistema econômico brasileiro. Desde 1999, a Selic é o principal instrumento de controle inflacionário. Sua taxa norteia todas as operações da economia brasileira que envolvem juros e correção, como empréstimos, investimentos estrangeiros, poupanças, aplicações e financiamentos.

 

Apontou que condenações civis com correção com taxa de 1% ao mês estariam destoando do contexto nacional e conduziriam a um cenário paralelo, em que credor civil faria jus a remuneração superior a qualquer aplicação financeira.

 

Com isso, os juros moratórios assumem função punitiva em relação ao devedor, quando servem apenas para compensar o deságio do dinheiro devido.

 

"Quando se cogita estipular, em decisão judicial, parâmetro próprio para os juros civis baseado em fator diferente do definido para toda a economia nacional, viola-se o artigo 406 do Código Civil e cria-se problema de ordem macroeconômica. A lógica é seguir a letra da lei que estatui a mesma taxa para juros de mora do pagamento de impostos federais, pois é o que diz legislador", afirmou.

 

A divergência foi acompanhada pela ministra Isabel Gallotti.

 

REsp 1.795.982

 

REsp 1.081.149

 

Danilo Vital – Correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.

 

Fonte: Revista Consultor Jurídico – 26/10/2021


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