Sem crédito, varejo do Dia das Mães não reagiu

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O desempenho do comércio no Dia das Mães, a melhor oportunidade de negócio para o varejo depois do Natal, foi especialmente fraco neste ano. Pesquisa do Indicador Serasa Experian de Atividade do Comércio mostrou que na semana que antecedeu o Dia das Mães neste ano o comércio cresceu apenas 1,9%, frente ao mesmo período de 2008. Esta foi a menor taxa de expansão nacional de vendas desde 2001, quando a alta registrada não excedeu 1%. Vale notar que em 2008 o crescimento do comércio no Dia das Mães foi 7,7% maior na comparação com 2007.

 

Este frágil resultado foi alcançado apesar da decisão do governo de conceder redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre bens duráveis de forte consumo nessa ocasião, de fogões, máquinas de lavar, geladeiras e tanquinhos. Esta política, portanto, parece ter esgotado seu potencial de acelerar o consumo. É preocupante a avaliação do movimento comercial do período. A Associação Comercial de São Paulo (ACSP) revelou que a média diária de consultas para vendas a prazo, no mercado paulista, caiu 12,5%, na referência dos doze primeiros dias de maio, na comparação com o mesmo período de 2008. Já nas vendas pagas com cheque, esse recuo foi menor, queda de 3,2%, na mesma comparação.

 

A direção da ACSP reconheceu que o máximo que se poderia admitir é que o corte no IPI ajudou a diminuir o ritmo de queda, mas não reverteu o quadro. É fato que os números do comércio eram ainda piores antes da redução do IPI, por exemplo, em abril, as consultas para vendas a prazo fecharam o mês 19,8% menores que as registradas no mesmo período do ano passado. Já nos negócios pagos com cheque, esse recuo foi de 10%, nas mesmas bases de comparação. Porém, a direção da entidade também reconheceu a raiz do problema, colocando o dedo na ferida: "A crise é de crédito".

 

Esse é o ponto: a oferta de crédito não se recuperou, com raras exceções absolutamente pontuais. As mais recentes estatísticas do Banco Central (BC), referentes a fevereiro, indicam que todas as queixas, tanto das pessoas físicas como das pequenas e médias empresas, quanto ao refluxo da oferta de crédito permanecem bem justificadas. Pelos números do BC, em fevereiro, as novas concessões de crédito caíram 7,7% em relação a janeiro, apesar de todas as pressões do governo e das ameaças de que os bancos públicos iriam abrir novas linhas de financiamento e forçar tanto a queda dos juros como a volta do fluxo de crédito. Analistas de mercado apontam diferentes razões para que as operações de crédito ainda não tenham voltado aos padrões anteriores ao início da crise (na segunda quinzena de setembro antes da quebra do banco norte-americano Lehman Brothers), mas a primeira delas é a permanência dos altos spreads cobrados pela rede bancária.

 

Como a realidade do crédito é a que é, as fortes restrições ao consumo permanecem, apesar de todos os esforços e medidas de renúncia fiscal anunciadas pelo governo. O mercado nota e se ressente exatamente dessa incapacidade das autoridades econômicas de fazer o crédito voltar até as mãos do consumidor. Não é por outra razão, aliás, que o Boletim Focus, a pesquisa semanal elaborada pelo BC com os 100 principais agentes do mercado financeiro, voltou a apontar uma piora na retração da economia brasileira para 2009. Nesta segunda-feira, o mercado considerou que o PIB neste ano deve recuar 0,44%. Na semana passada, essa previsão era de 0,30%, a primeira melhora depois de duas semanas seguidas de piora nas estimativas de retração, que chegaram a prever um recuo do PIB de 0,49%. O mercado agora voltou a identificar um risco de grave queda no PIB, principalmente depois que saíram os números da produção industrial. Em março a indústria até cresceu 0,70% na comparação com fevereiro, mas sofreu uma brutal queda de 14,7% no acumulado do trimestre em relação ao mesmo período de 2008. O mercado antecipou o que o varejo do Dia das Mães apenas confirmou: sem crédito, o consumo não avança e a produção industrial não cresce.

 

A economia brasileira tem um amplo espaço para estimular o consumo, como reconheceu o prêmio Nobel Joseph Stiglitz, em um seminário em São Paulo, porque a política monetária brasileira "deixou um amplo espaço de manobra". O problema é que esse espaço não está sendo convenientemente aproveitado. Como os resultados da produção industrial e do varejo decididamente confirmam.

 

Veículo: Gazeta Mercantil


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