Descolamento entre preços no atacado e no varejo deve diminuir até o fim do ano, avalia FGV

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Uma inversão no comportamento de preços do varejo que já era prevista por economistas começa a ocorrer em abril. O grupo de preços administrados (combustíveis, energia elétrica, telefonia, medicamentos, educação), que desde abril de 2007 vinha contribuindo para aliviar a pressão inflacionária, acelera a partir de abril e passa a impedir uma queda maior do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) até o fim do ano. Já o grupo de preços livres, que no ano passado elevou o IPCA acima da meta de 4,5%, segue trajetória de desaceleração, influenciado pela queda de longo prazo nos preços das commodities e pela demanda mais fraca, os mesmos fatores que já pressionam para baixo os preços no atacado apurados pelo Índice Geral de Preços (IGP).

 

Em abril e maio, reajustes nos preços de energia (6,21% pela Cemig, 14,5% pela AES Sul e de 5,94% pela RGE), medicamentos (2,85%) e cigarros (0,86%) sustentarão uma alta mais significativa dos preços administrados, elevando o IPCA para uma taxa entre 0,4% e 0,5%, conforme as consultorias LCA Consultores, MB Associados, Rosenberg & Associados, SLW Asset Management e Tendências Consultoria Integrada.

 

Por conta de tais reajustes, Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados, estima para os preços administrados uma alta de 0,6% em abril, contra 0,14% em março. Para os preços livres, ele prevê alta de 0,39% ante 0,23% em março, devido à recuperação nos preços das commodities e de uma leve melhora na atividade econômica. No acumulado de 12 meses, os preços monitorados acumularão alta de 4,2%, ante 3,7% nos 12 meses até março. Os preços livres recuarão 0,4 ponto percentual, para 6,1%. No acumulado do ano, Vale espera uma alta de 5,2% nos administrados e de 3,8% nos preços livres - bem abaixo dos 7,05% de 2008. "A apreciação recente do real pode interferir um pouco nos IGPs, mas não deve produzir efeito sobre a inflação no varejo", avalia.

 

O economista-chefe da SLW Asset Management, Carlos Thadeu de Freitas Gomes Filho, também descarta a possibilidade de a valorização do real influenciar os preços livres. "Os contratos de importação são fechados em um câmbio fixo. E se a desvalorização ocorrida no fim do ano não foi repassada ao varejo, acho difícil que a apreciação de agora, que foi bem menor, exerça influência", afirma. Para ele, a maior pressão de preços no varejo virá de hortaliças e frutas.

 

Para o economista da LCA Fábio Romão e o analista da Rosenberg Francis Kinder não apenas o câmbio deixa de ser um fator de pressão. A redução do IPI sobre eletrodomésticos da linha branca também deverá ajudar a aliviar a inflação no varejo já em abril. "A curto prazo a inflação deve aumentar. Alguns preços estão refletindo a inflação passada, incluindo preços administrados que impedem um recuo mais forte", resume o analista Gian Barbosa, da Tendências. Ele projeta para o índice de abril uma alta de 0,5% , acima do esperado para maio, que é um IPCA de 0,40%. Para o ano, Barbosa prevê inflação de 3,9% para o IPCA em 2009 ante os 5,9% de 2008.

 

O economista Luiz Roberto Cunha, da PUC-RJ, lembra que o grupo de preços monitorados responde por 40% do IPCA. São serviços, muitas vezes ligados ao salário mínimo, que têm vinculação com a inflação passada e que não foram tão afetados pela crise. "A composição do IPCA, com peso maior de preços administrados e de serviços, funciona como um amortecedor para altas e baixas", diz Cunha. O IPCA no Brasil, observa, não cai tanto quanto outros índices de preços em países da Europa e Estados Unidos, por exemplo, porque sofre menos influência dos preços internacionais das commodities. "Mesmo que haja recuperação da economia, o espaço para aumento de preços é pequeno", diz Cunha.

 

"O que se vê é um descolamento entre (os preços) no atacado e no varejo, que está forte agora mas vai ceder um pouco. Não haverá uma convergência, mas a divergência (entre os índices ) começará a diminuir. Esse é o cenário até o fim do ano", afirma Salomão Quadros, coordenador de Análises Econômicas do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

 

Segundo Quadros, o IGP está desacelerando rápido e até o meio do ano esse cenário deve se manter. Ele observa que os preços ao consumidor, sobretudo de alimentação, já estão desacelerando e isso vai se acentuar ao longo de 2009. Essa tendência nos alimentos irá se contrapor, em certa medida, às altas de preços administrados como energia, que teve reajuste médio de 6% em três capitais.

 

A queda da inflação só será mais acelerada quando se confirmar a redução, pela Petrobras, nos preços do diesel e da gasolina. O diesel tem peso de 3,27% no Indice de Preços no Atacado (IPA), sendo o segundo item mais importante na composição do indice, atrás dos automóveis. Já a gasolina tem peso de 1,52% no IPA e de 3,08% no Indice de Preços ao Consumidor (IPC). "Uma redução de 10% no preço do diesel se refletiria em uma queda de 0,32% no IPA e no caso da gasolina, cada 10% de redução no preço representa queda de 0,15% no IPA e de 0,31% no IPC", explicou Quadros. O IPA é 60% do IGP-M. O economista-chefe da Concórdia Corretora, Elson Teles, acrescentou que uma queda no preço do minério também reduziria a inflação já que o produto tem peso de 1,82% na formação do IPA. Nesse caso, uma queda de 30% a 40% no preço do minério representaria um recuo entre 0,54 % e 0,72%, no índice.

 

Veículo: Valor Econômico


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