Por Arícia Martins | De São Paulo
As famílias paulistanas de renda mais alta têm uma avaliação pior do que as ganham menos sobre temas como emprego, salário atual, crédito e perspectivas para os próximos meses. É o que mostra o índice de Intenção de Consumo das Famílias (ICF), calculado pela Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP).
Na passagem de junho para julho, o indicador que mede o interesse dos consumidores paulistanos por compras recuou 1,2%, para 109,5 pontos, mantendo-se no nível mais baixo desde o início da série, em agosto de 2009.
A quinta retração consecutiva foi influenciada principalmente pelas famílias que ganham mais de dez salários mínimos. Nessa faixa, o ICF diminuiu 2,2% na passagem mensal, para 103,3 pontos. Já no grupo cujos rendimentos vão até dez mínimos, o indicador seguiu em terreno mais otimista, em 111,6 pontos, mesmo com retração de 0,9% em relação a junho.
O assessor econômico da FecomercioSP, Guilherme Dietze, observa que, desde maio de 2013, o índice referente às famílias com renda maior só superou o do outro segmento em um mês: em março de 2014, quando ficou em 125,8 pontos, ante 121,9 pontos no estrato de rendimento mais baixo. Naquele período, os consumidores das duas faixas consideraram março um bom momento para a aquisição de bens duráveis, devido às liquidações. Por isso, diz, aquele resultado pode ser analisado como pontual.
Já em julho, o momento atual foi classificado por mais da metade das famílias como ruim para a compra de bens duráveis, mas o percentual foi mais elevado no segmento de renda maior (53,6%), do que entre aqueles que recebem até dez mínimos (52%). O acesso ao crédito também é melhor avaliado pelos consumidores de renda mais baixa: no mês passado, 55,6% daqueles que ganham até dez mínimos afirmaram que contratar crédito está mais fácil do que em igual período de 2013. Nas famílias com renda acima desse patamar, essa fatia foi de 47,6%.
A percepção menos otimista das famílias mais ricas se estende a quase todos os quesitos analisados pela Fecomercio no ICF. Quando perguntados sobre seu emprego atual, 39,9% apontam que estão mais seguros, abaixo da parcela de 46,2% observada no estrato de renda menor. Olhando o mercado de trabalho, a perspectiva para os próximos meses é positiva para 47,6% dos pesquisados com renda maior. Nas famílias que ganham até dez mínimos, esse percentual chega a 53,1%.
Na faixa de renda mais baixa, 24,5% das famílias afirma que está comprando mais no momento atual, também em relação a igual período de 2013, e 36,2% pretende consumir mais neste segundo semestre do que entre julho e dezembro do ano passado. Nas famílias com rendimento superior a dez salários mínimos, esses dois percentuais caem para 22,1% e 28,4%, respectivamente.
Para o economista da Fecomercio, a situação traçada pelos novos resultados da intenção de consumo das famílias de São Paulo é diferente da de 2013, quando era possível fazer uma relação de causa e efeito entre o aumento dos juros e a piora das avaliações sobre o crédito, por exemplo. Neste ano, Dietze acredita que o indicador capta uma insatisfação geral dos consumidores, que se reflete em todos os componentes do ICF.
Apesar do sentimento negativo ser generalizado, o assessor afirma que a percepção dos consumidores de renda menor é mais determinada pela trajetória do rendimento e do emprego. Já as famílias que ganham mais de dez mínimos são mais suscetíveis ao noticiário sobre outros aspectos da economia, como o mau desempenho da bolsa de valores, o avanço do déficit em transações correntes e os resultados das contas públicas. "Como o PIB está crescendo pouco, a balança comercial tem resultados negativos e o déficit em conta corrente também, o nível de satisfação das famílias que têm renda maior diminuiu."
Sem expectativa de melhora do ambiente macroeconômico nos próximos meses, ao mesmo tempo que a inflação deve continuar pressionada, mesmo com algum alívio na parte dos alimentos, Dietze avalia que a demanda das famílias seguirá em ritmo fraco. Nesse cenário, o relaxamento das medidas macroprudenciais terá impacto muito pequeno sobre o comércio, já que os consumidores estão mais cautelosos.
Veículo: Valor Econômico