Pesquisa anual mostra indústria com alta bem superior à do PIB

Leia em 6min 30s

Por Denise Neumann | De São Paulo



Os dados da Pesquisa Industrial Anual (PIA) de 2012, divulgados sem alarde pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no dia 24 de julho, mostram que a trajetória da indústria brasileira desde 2009 pode ter sido mais benigna do que aquela até agora contabilizada pelo Produto Interno Bruto (PIB). Pela pesquisa, o valor da produção industrial do setor de transformação cresceu entre 36% e 40% no acumulado desde 2009, enquanto no PIB o valor do mesmo setor cresceu 4%, ambas comparações em valores nominais, sem descontar a inflação.

Os dados do PIB de 2010, 2011 e 2012 são considerados preliminares pelo IBGE. Os valores e as variações conhecidas, no caso da indústria, foram obtidos principalmente de dados extrapolados a partir da Pesquisa Industrial Mensal-Produção Física (PIM-PF) antiga (a nova pesquisa entrou apenas no PIB de 2013), cuja variável pesquisada é o volume de produção física (quantidade) de uma série de produtos, considerando o critério de valor agregado, onde a produção de um bem "desconta" o que foi produzido na etapa anterior. A partir do dado físico, o instituto atribui um valor a essa produção. O IBGE considera o dado definitivo justamente após incorporar aos dados trimestrais as informações das pesquisas estruturais, entre outras fontes. Como o instituto está reformulando o sistema de contas nacionais, optou por "atrasar" a divulgação dos dados definitivos, agora prevista para o primeiro trimestre de 2015.

O IBGE também faz pesquisas anuais para o setor extrativo, construção, comércio e serviços, mas a diferença mais "gritante" de dados aparece no setor de transformação. E se a comparação for feita com 2008, os números mudam bastante. Na PIA, o crescimento acumulado até 2012 desacelera para 30% (porque na pesquisa o setor encolheu na recessão de 2009), e no PIB, ele sobe para 12% porque foi positivo naquele ano. Como 2009 é considerado definitivo na conta do PIB, a disparidade posterior chama mais atenção.

O PIB olha o critério de valor adicionado, que é obtido pelo valor bruto da produção de um setor menos seu consumo intermediário, como na PIM-PF. A informação principal já é um valor monetário. No caso de uma camisa, por exemplo, o cálculo do valor da confecção precisa descontar o tecido (produzido em outro lugar) e a energia elétrica (gerada em outro setor), entre outros custos. Na PIA existem dois conceitos considerados uma "proxy" do cálculo usado no PIB industrial do setor de transformação. Alguns economistas olham o valor da transformação industrial, que mostra aumento de 40% entre 2010 e 2012. Outros consideram mais correto o valor adicionado, no qual o crescimento foi de 36% - ambos muito acima dos 4% do PIB do mesmo setor em igual período.

A diferença dos dois critérios da PIA é quanto cada um desconta dos "outros custos". O valor da transformação industrial (conhecido como VTI) tira os custos diretamente envolvidos na produção, como insumos, energia e manutenção. O critério por valor adicionado também desconta aluguéis, publicidade, frete, entre outros.

No final de julho, o IBGE liberou os dados das pesquisas anuais da indústria, construção e comércio de 2012. Com base nessas três pesquisas - falta divulgar a de serviços -, a LCA recalculou o PIB dos últimos anos e concluiu que o crescimento desde 2009 (último dado definitivo) pode estar subestimado. A maior diferença aparece em 2012 e no setor de transformação.

O estudo elaborado pela LCA Consultores utilizou o critério de VTI e mostra que, em 2012, de acordo com a Pesquisa Industrial Anual (PIA), o segmento de transformação produziu R$ 900 bilhões, crescimento de 6,8% sobre 2011, em valores correntes. De acordo com o PIB, o valor adicionado do setor foi de R$ 480 bilhões, queda de 6,4% sobre o resultado de 2011. "Desde 2007, se olharmos para o PIB, a indústria andou de lado. Se olharmos para a PIA, ela continuou crescendo", pondera Borges. "Os dados, olhados ao longo do tempo, mostram uma diferença muito grande de tamanho de setor e de dinâmica", diz o economista. Procurado, o IBGE apenas respondeu, por meio da assessoria de imprensa, que as diferenças são "metodológicas". Pelo critério de valor adicionado da PIA, a produção de 2012 somou R$ 611 bilhões e subiu 4,2% sobre 2011.

Borges lembra que a recente alteração na pesquisa mensal da indústria - que mudou para acrescentar produtos e fábricas e reponderar os pesos de cada setor na produção- só foi incorporada ao PIB provisório de 2013. De 2012 para trás, nada foi alterado. Em 2013, a mudança na PIM-PF fez a produção do setor ser revista de alta de 1,2% para 2,3%. O economista-chefe da LCA acredita que a indústria pode estar subestimada no PIB. "Se tomássemos o valor da indústria pela PIA e o resto do PIB ficasse constante, o peso do setor de transformação na economia brasileira seria de 25% e não de 13%, e talvez o país não estivesse discutindo se há ou não desindustrialização", pondera Borges.

"A PIA é o principal instrumento de pesquisa sobre o setor. É nela que os pesquisadores se debruçam quando querem entender a indústria de transformação", observa o economista. Borges considera mais correto usar o dado do valor da transformação industrial para comparar com a evolução da indústria no PIB porque é ele que foi adotado pelo próprio IBGE para definir o peso de cada segmento dentro da pesquisa industrial mensal. "E o IBGE, em diferentes documentos, usa VTI como sinônimo de valor adicionado", argumenta.

Outro economista consultado pelo Valor considera o dado de valor adicionado mais próximo do cálculo adotado pelo IBGE no PIB industrial. Como o PIB é dado pela variação de um ano para o outro - e o crescimento nos dois conceitos da PIA é muito próximo e igualmente distante do PIB -, qualquer um dos dois critérios sustenta a tese de variação subestimada. O peso dentro do PIB, contudo, seria de 16%.

Em nenhum dos outros setores, a diferença entre as pesquisas estruturais e o PIB é tão significativa como na indústria de transformação. Além da diferença ser menor, nos outros três segmentos, o valor adicionado medido pelo PIB é maior do que o revelado pela pesquisa, o que é mais "compreensível", dado que o PIB é mais amplo que as pesquisas setoriais. No setor extrativo, a PIA indica um valor adicionado 40% inferior ao do PIB. Na construção, a diferença é de 25% e no comércio, de 10%, sempre a favor do PIB, segundo o estudo da LCA. A trajetória desses setores, contudo, também mostra, desde 2010, crescimento superior ao registrado pelos dados preliminares do PIB.

O trabalho da LCA Consultores recalculou o PIB incorporando essas pesquisas aos dados conhecidos. Pela série até agora divulgada, o PIB cresceu 35% na soma de 2010, 2011 e 2012, em termos nominais. No PIB recalculado pela LCA, esse crescimento chega a 41,5% no mesmo período - uma diferença de 6% nominais. Embora o PIB de 2009 seja definitivo, a LCA também recalculou aquele dado usando as pesquisas. E no caso de 2009, as pesquisas mostraram que a queda poderia ter sido maior do que o 0,2% apontado pelo PIB.

"Nosso exercício sugere que a revisão do cálculo do PIB e a incorporação de novos dados aos preliminares pode revelar que o PIB brasileiro é maior e cresceu mais do que se imagina nos últimos anos", pondera Borges. O economista-chefe da LCA lembra que quando saírem os dados definitivos eles já virão dentro do novo sistema, o que torna mais difícil o exercício de estimar o novo tamanho do PIB. O estudo da LCA considerou o modelo antigo das contas nacionais porque o "novo" ainda não é conhecido.



Veículo: Valor Econômico


Veja também

Rússia barra compra de alimentos de EUA e UE e beneficia Brasil

Por Gregory L. White e Laurence Norman | The Wall Street Journal, MoscouO presidente russo, Vladimir Putin, reagiu ontem...

Veja mais
Inflação dos alimentos no mundo cai 2,1% em julho em quarto mês consecutivo de queda

Tomas Okuda - Agência EstadoO Índice de Preços de Alimentos da Organização das Na&cced...

Veja mais
Preço da cesta básica recua na Grande Belém

O feijão foi o produto que mais registrou queda, com índice de 21,5%Pela primeira vez este ano, a alimenta...

Veja mais
Décimo terceiro de aposentados não chegará ao comércio

Recursos serão usados para pagamento de dívidasAndréa RochaNem mesmo a injeção de R$ ...

Veja mais
Sobe o custo da cesta básica em Blumenau

Café moído e açúcar foram os principais responsáveis pela alta   O Índi...

Veja mais
Presidente do BC aponta 'progressos' no combate à inflação

Por Alex Ribeiro e Eduardo Campos | De BrasíliaO presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, reforçou ...

Veja mais
Empresas fecham semestre com balanço positivo apesar de indicadores ruins

Lucratividade de 51 empresas que já divulgaram seus balanços fechou em alta. Juntas, elas lucraram R$ 23,3...

Veja mais
Faturamento e horas trabalhadas do setor industrial caem no 1º semestre

Por Lucas Marchesini e Flavia Lima | De Brasília e São PauloA indústria registrou queda no faturame...

Veja mais
Alta da energia preocupa empresas de Santa Catarina

A partir desta quinta-feira, 7 de agosto, a maioria dos catarinenses pagará, em média, 22,62% a mais na co...

Veja mais