Crise? Isso não chegou às redes de farmácias

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O Brasil está em recessão, perdeu o grau de investimento e a confiança na economia  e na chefe do governo é uma das mais baixas da história. Os níveis de consumo estão deprimentes.

Em meio a esse completo caos, há um grupo de empresas que ainda passa ileso por tantas más notícias. As redes de farmácias estão crescendo acima dos dois dígitos, mesmo com um cenário econômico tão desfavorável – e prognósticos nada animadores.

O faturamento das 28 empresas reunidas pela Abrafarma, associação do setor, cresceu 12% nos últimos 12 meses terminados em junho, atingindo os R$ 34 bilhões. No primeiro semestre deste ano, a receita do grupo foi 17% maior em comparação com o mesmo período de 2014.

“Quem cresce 16% ao ano, como é o caso da Pague Menos, não está em crise”, afirma Francisco Deusmar Queirós, presidente da rede com 800 lojas espalhadas pelo país – e um faturamento da ordem de R$ 5 bilhões anuais.

Em um momento em que as projeções pessimistas se estendem até 2017, Deusmar afirma que a Pague Menos “vai muito bem, obrigado”. Para o ano que vem, a expectativa da rede é crescer mais ainda, entre 17% e 18%. “E essa ainda é uma projeção pessimista. A média de expansão anual da empresa foi de 22% nos últimos 15 anos.”

Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista com Deusmar Queirós.

Como está o varejo de medicamentos neste contexto recessivo?

O setor de medicamentos é o último a entrar na crise e o primeiro a sair. O varejo de remédios vai muito bem, principalmente para as grandes redes. A Pague Menos fechou o primeiro semestre deste ano com faturamento 16% maior, na comparação com igual período do ano passado. O lucro cresceu igualmente, no período. Então, não temos do que reclamar.

Os indicadores da economia estão bastante ruins neste ano em quase todos os setores. O varejo de medicamentos é uma exceção?

Os negócios, na verdade, não estão ruins para o Brasil como um todo, não. Isso é ditadura de economistas, dizer que tudo está ruim. Algumas regiões do país estão indo bem, algumas empresas estão indo bem, algumas pessoas estão indo bem. Você sabia que há filas de espera de sete meses para comprar carro de luxo?

Nossa empresa é de 1981. Atravessamos muitos planos econômicos: Bresser, Cruzado, Cruzado Novo, Verão, Collor, dos que eu me lembro. Nós já sofremos e, agora, estamos no céu, mas passamos pelo purgatório. Estudos mostram que, nos últimos 50 anos, o Brasil só registrou PIB abaixo de zero três vezes. Essa é a quarta vez. E todas elas não demoraram mais do que três anos. Daqui a um ano e meio estará tudo resolvido.

O que mudou no processo de gestão da Pague Menos por conta da crise?

Nada, não mudou nada. Na Pague Menos não tem crise. Pelo amor de Deus, quem cresce 16% ao ano não está em crise. No próximo ano, a expectativa da empresa é crescer mais, entre 17% e 18%. E ainda estou sendo pessimista, pois a média de crescimento dos últimos 15 anos foi de 22% ao ano.

A rede Pague Menos vai continuar investindo em abertura de lojas mesmo na recessão, mesmo com o orçamento cada vez mais apertado para oconsumidor?

Sim, vamos. Nós temos hoje 800 lojas e devemos fechar 2017 com 1.000. Você pode me cobrar isso. A Pague Menos é a única rede de farmácias que está presente em todas as unidades da federação. Costuma-se dizer que o cearense é o judeu brasileiro. Eu saí pelo mundo abrindo lojas. Nosso faturamento é da ordem de R$ 5 bilhões. A venda de medicamentos representa 70% desse valor.

Algumas empresas do setor informam que estão indo bem porque a receita está dividida entre a venda de remédios e de outros produtos, como linhas de higiene e beleza, que possibilitam uma margem de lucro maior. Esse não é o caso da Pague Menos?

Eu até gostaria que fosse meio a meio porque a linha de  não-medicamentos dá uma margem de lucro maior do que a de medicamentos, mas não é bem assim. Mas eu vendo também nas farmácias biscoitos, sorvetes, chocolates, refrigerantes, sandálias havaianas, bola de futebol. O que não vendo é o genérico do Viagra, pois não funciona, mas de resto...

A farmácia do futuro deverá ter clínicas médicas acopladas. Este foi um dos principais assuntos discutidos nesta semana no evento da Abrafarma, que reúne 28 redes de farmácias. A Pague Menos está preparada para prestar esse serviço?

Nós já temos 120 clínicas instaladas em 120 farmácias da rede, e vamos terminar o ano com 250 Clinic Farm. Esse é um modelo que funciona no mundo todo, no Canadá, nos Estados Unidos. O Minute Clinic da CVS (rede de farmácia norte-americana) já opera há anos com esse serviço.

A população brasileira também quer esse serviço no Brasil. Na verdade, eu me adiantei implantando isso em algumas clínicas, pois eu parto do princípio que não precisa ver para crer. Eu creio para ver. Faço para, depois, ver o resultado. Se não der, eu mudo para outra coisa. Não tenho parceria com clínicas. É o meu farmacêutico que dá o primeiro atendimento.

Nós vamos revolucionar na prestação de serviço para o cliente, como já fizemos. Em 1989, começamos a receber o pagamento de conta de água e luz nas farmácias. O Banco Central anunciou que queria desafogar as agências e criou a figura do correspondente bancário, 21 anos depois. A partir disso, lotéricas e supermercados começaram a receber as contas.

Como funcionam essas clínicas?

O farmacêutico que estava atrás do balcão fica, agora, em uma sala de 2,5 metros por 3 metros, e dá o atendimento para o cliente. Conversa com ele, mede a pressão, faz teste de glicose, e por aí vai. Ainda não fazemos exames laboratoriais porque isso ainda não é permitido.

É por isso que estamos pressionando a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para regulamentar a legislação o mais rapidamente possível. O que nós podemos fazer, o quanto nós podemos cobrar, enfim, como podemos fazer a prestação desse serviço para a população.

A Pague Menos está capacitando os farmacêuticos para atuarem nessas clínicas?

Um grupo da área de RH faz o treinamento dos funcionários. No ano passado, foram 298 mil horas de treinamento e este ano mais de 300 mil horas, incluindo treinamento de farmacêuticos.

Quais os principais desafios dos varejistas hoje?

Ainda é a regulamentação da lei que autoriza o farmacêutico a acompanhar o tratamento do paciente e aplicar vacinas.

Atualmente, falando de empresas estrangeiras, apenas a norte-americana CVS está no Brasil. Consultores de varejo afirmam que outras estão de olho no mercado brasileiro e poderão entrar quando a economia melhorar. Como o senhor vê a vinda delas?

A CVS tem cerca de 8.000 lojas nos Estados Unidos e 50 no Brasil, por meio da rede Onofre. Na verdade, considero que eles nem chegaram ainda aqui. Deus queira que outras redes venham com força, pois elas sabem fazer conta. É bom que venham para aumentar o nosso mercado.Mas não será fácil a adaptação para elas, não vamos dar moleza para elas, não. Essas redes estrangeiras possuem lojas de 2.000 metros quadrados, as lojas no Brasil são de 300 metros quadrados.

Existem muitas pequenas farmácias no país que, muito provavelmente, estão, neste momento, perdendo mercado para as grandes redes, que estão crescendo. Que dicas o senhor daria para elas enfrentarem da melhor forma este momento?

Inove. Aquela história de fazer a coisa do mesmo jeito durante 30 anos não dá mais certo. Tenha uma liderança muito forte para atravessar este momento de incerteza e de turbulência. Acredite na revolução digital, que está aí firme e forte. Fique atento à questão de produtividade. Faça mais com menos. Aí o pequeno dono de farmácia vai se sair bem neste período de crise.

Alguns consultores de varejo acreditam que, com essa crise, a tendência é de os pequenos lojistas de farmácias sumirem do mercado.

Existem grandes redes de supermercados no país, como Walmart, Carrefour, Cassino, Cencosud, e os pequenos supermercados continuam existindo, estão aí. O mesmo acontece no setor do varejo de medicamentos.

A rede de supermercados espanhola Dia tem operado no Brasil com modelo de lojas próprias e franquias. A Pague Menos já pensou em abrir franquia?

Não, no nosso setor isso é muito perigoso. Se alguém morre em um franqueado da Pague Menos, vão dizer que a pessoa morreu na rede. E se o farmacêutico aplicar uma injeção e o paciente sofrer um choque anafilático? Aí eu estou frito. E se a loja vender um abortivo? As nossas lojas precisam estar sob o nosso comando. O Boticário pode abrir franquia porque trabalha com produtos de beleza. No caso de venda de remédio é diferente.

O seu setor está indo bem, como o sr disse. Mas qual é a sua perspectiva para a economia?

Gostaria que a imprensa começasse a falar bem do Brasil. É um absurdo como a imprensa só destaca as notícias ruins. Os jornalistas precisam achar notícias boas. Há muita bandalheira no país, claro, há meia dúzia de corruptos que roubou a Petrobras e participou do Mensalão. Mas existem pessoas boas, empresários, empresas que estão fazendo um trabalho muito bom para o país crescer. Nós temos de ajudar o país. Não é brigando e criticando que vamos resolver o problema do Brasil. Vejo um futuro bom pela frente. Vamos atravessar um período ruim ainda em 2016 e 2017 e, depois, vamos embora.

Como estão as negociações de preços com as indústrias, até porque muitos medicamentos utilizam insumos importados. As indústrias têm repassado a alta do dólar para os preços?

As indústrias não se manifestaram ainda em relação a isso. Estão sendo parceiras. É verdade que eu compro grandes volumes e não sei como está essa questão no caso dos pequenos comerciantes. Sou diretor da Abrafarma e, por enquanto, não soube de dificuldade de negociação por conta da alta do dólar com qualquer rede.

A abertura de capital da Pague Menos está pronta?

Está pronta desde 2012, só que o mundo não quer comprar o Brasil. Isso não é só comigo, o mundo não quer comprar de ninguém no Brasil.

O nome da sua rede é Pague Menos. Os preços das suas farmácias fazem jus ao nome?

Sim, os nossos preços são mais baratos, por isso nós crescemos. A nossa ideia é cobrar menos e vender muitas unidades. Nós temos os melhores preços das farmácias do Brasil, vendemos com descontos, que variam de acordo com a concorrência, com a cidade, com a tributação do Estado.

Vender remédio dá dinheiro no Brasil?

Os preços são controlados, há um teto de preços, mas nós, inteligentemente, fazemos um preço que encanta as pessoas. Estou na Forbes, sou o 45º homem mais rico do Brasil, vendendo Melhoral e Cibalena (medicamentos para dor de cabeça).

 



Veículo: Site Diário do Comércio - SP


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