Embalagens: A data de fabricação sumiu...

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Hoje, para os técnicos da Secretaria Nacional do Consumidor, a data de validade, para ser uma informação válida tem que, necessariamente, apresentar a data de fabricação

Nadja Sampaio

Há mais ou menos um mês, ao utilizar um produto que estava no motor home, verifiquei que a data de validade estava vencida. Achei estranho porque todas as compras tinham sido feitas no mesmo dia, em abril do ano passado, quando recebi o motor home. Pensei que os produtos teriam uns dois anos de garantia. Fiquei pensando, será que fui burra e comprei tudo já vencendo? Quando será que estes produtos foram fabricados? Olhei de novo as embalagens e, surpresa!, a data de fabricação sumiu.

Trouxe os produtos para jogar no lixo. Ao chegar, o porteiro da guarita e o zelador do prédio vieram me ajudar a carregar as sacolas e comentei com eles que ia jogar fora os produtos. E os dois disseram: mas a senhora vai jogar fora só porque acabou o prazo de validade? E complementaram, isso não quer dizer nada. Eles (as indústrias) colocam este prazo para as pessoas jogarem fora os produtos e comprarem de novo, mas pode usar que não faz mal não. A senhora olha, se tiver com jeito de estragado, não come. E levaram os produtos. Dia desses, um deles comentou comigo. Já comemos tudo o que a senhora deu e ninguém passou mal lá em casa. Não disse?

Fiquei matutando que há três problemas nesta questão. Um, é que a indústria, sorrateiramente, tirou a informação sobre a data de fabricação, o que eu, como consumidora, acho um absurdo. Em segundo, é que, se a indústria está diminuindo os prazos de validade para aumentar a rotatividade do produto e, consequentemente, seu lucro é, antes de tudo, má fé. Em terceiro, é que a data de validade tem que ser respeitada como uma garantia de segurança para o usuário do produto. Se ninguém acredita nesta data, de que vale a informação?

Curiosa sobre o assunto, fui para os supermercados pesquisar os produtos que perdi. Descobri que vários fabricantes não colocam mais a data de fabricação, apenas a data de validade e a indicação do lote. A Nestlé, por exemplo, não coloca a data de fabricação em nenhum dos seus produtos. A empresa diz que a Anvisa não exige mais a data de fabricação, portanto não há ilegalidade, porém a indústria é que resolve se vai colocar ou não esta informação no produto. Na área de creme de leite e leite condensado, a Mococa, Itambé, Elegê, Camponesa e Shefa colocam as duas datas e o lote. Nesta pesquisa, aprendi que estes produtos, em lata, a validade é de um ano, e na embalagem Tetrapack, é de seis meses, portanto, para o motor home não vale a pena comprar em embalagem Tetrapack. Nos setores de chocolate em pó, bolo pronto gelatina em pó, café em pó e biscoitos, praticamente nenhum dos fabricantes coloca a data de fabricação. Na área de macarrão, alguns fabricantes continuam a colocar a data, outros já tiraram. Na seção de queijo parmesão ralado, todos os fabricantes colocam as duas datas. E na parte de leite pronto em embalagem Tetrapack, todas as indústrias colocam as duas datas, e surpresa de novo, até a Nestlé. Ou seja, não há mais padrão.

Depois da pesquisa, resolvi olhar o que diz o Código de Defesa do Consumidor. O artigo 31 diz que “A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores”.

Quando eu comecei como repórter na área de Defesa do Consumidor acompanhei muitas blitz com fiscais da vigilância sanitária e do Procon nos supermercados e, naquela época, a data de fabricação era exigida, pois os técnicos entendiam que “origem” incluía esta data. Hoje, para os técnicos da Secretaria Nacional do Consumidor, a data de validade, para ser uma informação válida tem que, necessariamente, apresentar a data de fabricação. Para eles, origem é entendido como local de fabricação, endereço, país.

A Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) explica que a RDC nº 259/2002 dispõe que a data de fabricação não é uma informação de declaração obrigatória para os alimentos em geral. A única data obrigatória, segundo esta norma, é a data de validade do produto. Assim, a data de fabricação pode ser declarada de forma opcional pelos fabricantes ou mesmo ser utilizada como uma forma de declaração do lote do produto. Porém, a data de fabricação é exigida para alguns produtos específicos, especialmente os regulamentados pelo Ministério da Agricultura.

A Anvisa esclarece ainda que o prazo de validade é a data até a qual um produto, nas condições de conservação indicadas pelo fabricante, conserva suas propriedades e características, mantendo-se seguro para o consumo. Já a data de fabricação é a data na qual o produto se tornou descrito e apresentado ao consumidor. Essa informação fornece ao consumidor uma ideia do frescor do alimento. E por fim, a agência diz o fabricante do produto é responsável por realizar os testes necessários para determinar o prazo de validade do seu alimento e não é possível estabelecer um prazo de validade geral para categorias de produtos.

Para mim, enquanto profissional que acompanha a Defesa do Consumidor há 24 anos, foi uma surpresa saber que não há mais exigência da colocação da data de fabricação. E como consumidora, acho um absurdo que esta informação tenha sido retirada. O ideal é sabermos as duas datas para analisarmos se vale a pena comprar. Isso é um retrocesso na legislação. E fico pensando se a Anvisa pode criar uma norma que é contrária ao que diz o CDC, uma lei federal. E se a agência pode “entender”, de forma diferente, o que significa “origem” no artigo 31. Com a palavra, os advogados do setor.


 
Veículo: Brasil Econômico


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