Bolas da Copa: China goleia no preço

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Bolas produzidas na Ásia têm custo muito inferior às nacionais. Qualidade é baixa, mas preço menor derruba a concorrência e faz cair drasticamente a produção no Brasil

Nascido em Muzambinho, no Sul de Minas Gerais, Antônio Carlos Dini montou uma fábrica de bolas, a Saga, em Tapiratiba (SP), cidade com cerca de 13 mil moradores. Embora seja um município pacato, o lugarejo ganhou o rótulo de capital das bolas em razão da qualidade das pelotas feitas nas fábricas da cidade. A fama das redondas foi tanta que o lugar passou a sediar a Expobola, uma das principais feiras do setor na década de 1990. Nos últimos anos, porém, a produção de pelotas no lugarejo caiu bastante. Resultado: algumas fábricas fecharam as portas.

Os empresários locais atribuem boa parte da reviravolta em Tapiratiba ao que muita gente chama de produtos ling-ling. Trata-se da importação de bolas feitas na China. Fabricadas a custo bem mais baixo, uma vez que os tributos e a lei trabalhista no país asiático pesam menos no custo que os impostos e as regras empregatícias no Brasil, as mercadorias feitas do outro lado do globo são vendidas a preços bem mais em conta que as de Tapiratiba.

Diante disso, muitos empresários brasileiros transferiram suas linhas de montagem para o país asiático. É o que fez a Centauro, maior rede de artigos esportivos da América Latina, que produz as bolas Adamf na China. Dini, o dono da Saga e que não tem capital para isso, viu sua produção despencar nos últimos anos. “Eu produzia cerca de 15 mil bolas por mês. Atualmente, fabrico cerca de 5 mil”, compara.

A invasão de bolas chinesa no Brasil e como essa importação afetou a indústria nacional são o tema do segundo dia da série “O Negócio da Bola”, que o Estado de Minas publica desde ontem. Uma pesquisa da Organização das Nações Unidas (ONU) estimou que as exportações de bolas tenham alcançado US$ 1,2 bilhão em 2012, sendo a China responsável por mais da metade desse valor: US$ 665 milhões. Os chineses responderam, naquele ano, por 53% das exportações do setor. Em 2002, esse percentual era bem menor (31%).

“Havia mais de 20 empresas que fabricavam bolas na cidade. Atualmente, são quatro. É difícil concorrer com os chineses”, lamenta Ester Maria Rosa Rangel, presidente da Associação Comercial e Industrial de Tapiratiba (Acit) e sócia da REHR, que fabrica material esportivo em geral. “A caneleira que vendo a R$ 6, por exemplo, o chinês traz para o Brasil a R$ 0,50”.

A própria Brazuca, a bola oficial da Copa do Mundo de 2014, foi projetada pela Adidas na Alemanha, onde está a sede da empresa, mas partes dela são feitas na China e em outros países do Oriente. A Brazuca tem quatro modelos: o de R$ 39,90, destinado a colecionadores e ao público infantil), o glider (R$ 69, costurado a máquina e com câmara butil), o top replique (R$ 99, feita sem costuras) e o oficial (R$ 399, semelhante às que serão usadas nas partidas da Copa).

A maioria das bolas enviadas do outro lado do planeta ao Brasil, contudo, custa bem menos que as feitas em Tapiratiba. “Vendemos essas bolas, feitas de GVA, a R$ 6. As fabricadas na China são vendidas por R$ 2, R$ 3”, explica Mário Sato, dono da Mania Sport.

A empresa dele em sociedade com a esposa, Elizabeth Sato, chegou a produzir 5 mil unidades por mês na década passada. “Hoje fazemos em torno de 2,5 mil. Não aumentamos o preço das bolas há muito tempo, o que só reduz a margem de lucro”, reclamou a companheira. Para enfrentar a concorrência asiática, o casal começou a produzir redondas com a marca Izuki, destinadas a escolas de futebol. “É um produto bem mais resistente. Nesse nicho, os chineses não têm grande aceitação, pois a qualidade da mercadoria deles é inferior”, explica o empresário.

ESPERANÇA A proximidade da Copa do Mundo, contudo, trouxe um alento aos empresários de Tapiratiba: a produção, embora ainda menor do que a de anos anteriores, subiu no primeiro trimestre de 2014. O casal Sato, por exemplo, acredita num aumento de 50%. Percentual igual espera Vitória Maria de Jesus da Silva, dona da fábrica que leva seu primeiro nome. A empresa fabrica as bolas Zico, de uma escolinha de futebol que tem contrato com o ex-jogador da seleção para usar o nome do ex-atleta.

“Produzimos cerca de 7 mil bolas por mês, sendo 2 mil costuradas e 5 mil GVA. Nessas, aguardamos um aumento em torno de 50%”, disse a empresária. Adriana Silva, gerente da Kaemy, também está animada com a proximidade da Copa do Mundo no Brasil. Ela calcula que a produção tenha crescido em torno de 80%. Em média, a empresa produz 12 mil bolas por mês. “Só uma fábrica nos encomendou 6 mil unidades”, disse ela.

Os empresários de Tapiratiba querem reconquistar o mercado nacional. Para isso, o grupo está estudando a viabilidade de montar uma loja virtual coletiva. “Fizemos uma parceria com o Sebrae. A loja na internet é uma das propostas para combater a invasão dos produtos chineses”, acredita Ester Rangel, a presidente da associação comercial e industrial da cidade.


Verdadeiras relíquias

As bolas usadas na Copa do Mundo são grafadas com os nomes das seleções que se confrontam em cada jogo, além da data da partida. Em média, a Adidas produz 25 unidades para cada jogo. Em 2012, uma das bolas usadas na Copa do Brasil, em 1950, foi leiloada, em Porto Alegre, por R$ 45 mil. O comprador foi um uruguaio – o país dele venceu o Brasil, na final, por 2 a 1. Já em 2010, poucas semanas após Espanha e Holanda terem disputado a final da Copa na África do Sul, uma das redondas usadas naquela partida, que foram batizadas de Jabulani (foto), foi leiloada por 48,2 mil libras (cerca de US$ 74 mil). O dinheiro foi revertido para uma campanha contra a Aids promovida, na época, pelo então presidente da África do Sul, Nelson Mandela.



Veículo: Estado de Minas


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