As empresas devem se preparar para a retomada de julgamentos pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) de centenas de processos atualmente parados - com andamento sobrestado. O Ministério da Fazenda alterou o regimento interno do conselho para permitir o julgamento de recursos que estavam à espera de decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) com efeito de repercussão geral.
Com a medida, um dos temas que deve voltar à pauta do CARF, por exemplo, é a cobrança de PIS e COFINS das instituições financeiras.
Em vigor desde ontem, a Portaria nº 545, do Ministério da Fazenda, revoga o dispositivo que determinava o sobrestamento dos processos e que tinha a seguinte redação: "Ficarão sobrestados os julgamentos dos recursos sempre que o STF também sobrestar o julgamento dos recursos extraordinários da mesma matéria". A alteração está na Portaria do Ministério da Fazenda nº 545, publicada ontem no Diário Oficial da União.
A paralisação dos processos sobre determinado tema tributário até manifestação do Supremo era estabelecida pelo relator do caso no conselho, depois de requerida pelo contribuinte ou Fisco.
A mudança pode levar uma quantidade maior de casos à Justiça. "Não faz sentido obrigar o contribuinte a ir ao Judiciário para obter uma decisão que poderia ser concedida desde logo pelo CARF", diz o advogado Francisco Giardina, do escritório Bichara, Barata e Costa Advogados. "Isso poderá abarrotar o Judiciário com ações que poderiam ser evitadas."
O objetivo dos dispositivos revogados era evitar decisões conflitantes do Supremo e do CARF. Mas o volume de processos parados no conselho, muito em razão do julgamento do mensalão ter atrasado a análise de temas tributários pelo STF, pode ter levado à alteração. Agora, o Carf volta a seguir apenas as decisões de mérito e definitivas do Supremo, sem considerar o sobrestamento indicado pela Corte superior.
Processos que discutem a quebra de sigilo bancário de contribuinte, por exemplo, estão sobrestados. Os ministros do Supremo estão para julgar o tema, com repercussão geral, desde 2011. Há dois anos, portanto, os processos em andamento no CARF sobre a questão estão parados à espera do julgamento pela Corte.
Não há como a mudança ser prejudicial para as empresas, segundo o advogado Luiz Paulo Romano, do Pinheiro Neto Advogados. "Em geral, como incide a Selic para corrigir o débito em discussão, não vale a pena para a empresa ficar muito tempo com o processo administrativo sem um julgamento", afirma.
Romano calcula que, em relação a teses tributárias novas, o prazo para julgamento no CARF, em média, é de três ou quatro anos. "No Judiciário isso continua levando, no mínimo, o dobro de tempo", diz o advogado. "Para o sistema, a revogação também é positiva porque confere maior autonomia ao conselho."
"Certamente, as empresas serão impactadas pela portaria porque muitos casos de alto valor, que elas não esperavam que fossem julgados tão cedo, devem vir a ser analisados no ano que vem em razão da nova portaria", afirma o advogado Flávio Eduardo Carvalho, do Souza, Schneider, Pugliese e Sztokfisz Advogados.
Para Carvalho, o aspecto negativo da portaria para as empresas é que o CARF não pode analisar constitucionalidade. Antes, o órgão paralisava os processos para aguardar o pronunciamento do STF a respeito. "Agora, se o CARF decidir pelo recolhimento do tributo e isso for declarado depois inconstitucional pelo STF, a empresa terá que ir à Justiça", diz.
Segundo o procurador-chefe da Fazenda no CARF, Paulo Riscado, o conselho voltará a julgar a incidência de PIS e Cofins para instituições financeiras com base na Lei nº 9.718, de 1998, por exemplo. Para ele, vários autos de infração relativos à matéria deverão ser mantidos em razão da legislação. "A não ser quando o STF declarar a sua inconstitucionalidade", afirma.
Com o tempo percebeu-se que, como o tribunal superior não tem prazo para apreciar os recursos, o Carf ficava esperando por decisões que poderiam não acontecer rapidamente. Isso foi o que motivou a alteração no regimento interno do conselho, segundo o presidente da 2ª Seção, Luiz Eduardo de Oliveira Santos, que falou em nome do Carf. "A partir de dezembro esses processos já podem voltar à pauta."
Por Laura Ignacio e Bárbara Mengardo | De São Paulo
Fonte: Valor Econômico (21.11.2013)