Tributos sobre renda ganham peso na União

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Os tributos sobre a renda de empresas e pessoas físicas ganharam participação nas receitas do governo federal na última década. Especialistas atribuem esse movimento não ao aumento dos lucros das companhias ou aos ganhos salariais, mas aos esforços extras de combate à sonegação e renegociação de dívidas, associados à defasagem na tabela do imposto de renda.

 

Aliados à política de desonerações, esses fatores mudaram o desenho das fontes de arrecadação, com os impostos sobre a renda, juntos, passando de uma fatia de 11% para 14% em dez anos.


Segundo analistas, a defasagem no imposto de renda, em especial, provocou distorções na contabilidade dos tributos ao incentivar o trabalho autônomo e, dessa forma, valores que a princípio seriam retidos na fonte passaram a ser ajustados na declaração anual de pessoa física.


Dados da Receita Federal mostram que a participação do Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF) nas receitas administradas pelo órgão passou de 1,6% em 2004 para 2,5% em 2012 e, de janeiro a setembro deste ano, representou 2,7%. O Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ), que em 2004 equivalia a 9,5% das receitas públicas sob responsabilidade da Receita Federal, subiu para 11% no ano passado e, nos nove primeiros meses deste ano, avançou para 11,6%.


A fatia da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) também engordou, passando de 5% em 2004 para 5,8% em 2012 e chegando a 6,1% de janeiro a setembro deste ano. Em compensação, a participação do grupo "outras receitas administradas", que engloba diversos itens, como receitas obtidas com loterias, multas por atraso de declaração, depósitos judiciais, além de tributos já extintos, como a CPMF, baixou de 8,1% em 2004 para 1,3% em 2012 e se situou em 1,2% nos nove primeiros meses deste ano. A mudança brusca de patamar ocorreu na virada de 2007 para 2008, quando a CPMF deixou de ser cobrada. O imposto recolhido sobre rendimentos de capital também teve sua contribuição reduzida nos últimos dez anos, passando de 4,3% em 2004 para 3,3% em 2012 e 2,9% de janeiro a setembro de 2013.


Rodrigo Massud, advogado do Choaib, Paiva e Justo Advogados Associados, afirma que nos últimos dez anos não houve aumento de alíquota ou mudanças na base da tributação que justifiquem a maior contribuição das empresas na arrecadação. "Também não houve elevação significativa nos ganhos das empresas. O que temos visto nos últimos anos é uma forte ação de contencioso tributário e de fiscalização", diz.


Uma fonte da Receita Federal admite que a maior participação do IR da Pessoa Jurídica sobre as receitas federais não deriva de aumento no lucro das empresas, mas afirma que há a expectativa desses avanços ocorrerem ainda neste ano, o que poderia levar a um incremento adicional na participação do IRPJ na arrecadação. De janeiro a setembro, foram recolhidos R$ 91,5 bilhões a título de IRPJ, 2,7% mais que os R$ 89 bilhões contabilizados no mesmo período de 2012, considerando os valores corrigidos pela inflação até setembro de 2013. Neste mesmo intervalo, a receita com a CSLL cresceu 1,5%, passando de R$ 47,1 bilhões para R$ 47,8 bilhões.


Segundo Massud, o governo está combatendo com mais afinco a sonegação e tem demonstrado interesse em reforçar seu caixa por meio de renegociações de dívidas e antecipações de receitas. Prova disso, diz ele, foi a sanção, por exemplo, no início de outubro, da lei que reabre o Refis da crise e cria mais dois programas de refinanciamento de dívidas.


Com a medida, o governo criou condições especiais para o pagamento de R$ 680 bilhões em tributos, sendo que sua expectativa é receber entre R$ 7 bilhões e R$ 12 bilhões ainda neste ano. "Isso poderá fazer com que a arrecadação continue crescendo mesmo sem uma expansão robusta da economia. Mas eu não acredito que haverá uma grande adesão aos programas de refinanciamento porque ainda não há um entendimento do Supremo Tribunal de Federal (STF) a respeito de pontos como a bitributação", comenta o tributarista Antonio Francisco Julio II, do Regis de Oliveira, Corigliano e Beneti Advogados, referindo-se aos descontos dados às firmas brasileiras com subsidiárias no exterior para pagamento de tributos que deixaram de ser recolhidos no Brasil e estão sendo questionados na Justiça.


Os incentivos dos programas de refinanciamento de dívidas, segundo Massud, são bastante atraentes e, por isso, ele espera uma adesão consistente. Mas, em sua opinião, não é possível saber se eles farão com que a fatia das empresas no total da arrecadação continue crescendo. "Como são apenas medidas pontuais para tentar driblar o desaquecimento econômico, e não fruto de uma política fiscal de longo prazo, fica difícil fazer qualquer projeção", diz.
Para Francisco Julio, a fiscalização da Receita Federal está sendo "bastante efetiva", principalmente por conta da informatização dos sistemas tributários. Por isso, a tendência é que a participação das empresas na arrecadação siga em alta, compensando as desonerações concedidas pelo governo. "Não há perspectiva de aumento na lucratividade das empresas no curto prazo. O cenário de incerteza atual desestimula o investimento e, portanto, só é possível pensar em avanço na tributação por conta de fiscalização e contencioso", diz.


Mesmo com a renúncia fiscal de R$ 58,1 bilhões de janeiro a setembro - muito acima dos R$ 34,5 bilhões verificados no mesmo período de 2012 -, a arrecadação cresceu 0,9% sobre igual intervalo do ano passado, totalizando R$ 816,4 bilhões em valores corrigidos pela inflação. Se forem consideradas apenas as receitas administradas pela Receita Federal, o aumento real foi maior, de 1,2% no período, para R$ 788,3 bilhões. Pelas contas da Receita Federal, a arrecadação sob sua responsabilidade deve aumentar entre 2,5% e 3% neste ano.


O resultado da política de desonerações sobre a arrecadação pode ser notado pelo Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Sua participação nas receitas do governo, que era de 5,7% em 2004, caiu a 4,6% em 2012 e, nos nove primeiros meses de 2013, ficou em 4,4%. O desconto do IPI, que ainda é válido para automóveis e materiais de construção, foi aplicado também a móveis e eletrodomésticos. Para estes produtos, entretanto, as alíquotas do imposto voltaram a subir nesse mês.


Por Francine De Lorenzo | De São Paulo

Juridico -28-10

 

Fonte: Valor Econômico (28.10.2013)

 


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