Mensalão atrasa julgamento de causas bilionárias

Leia em 3min 30s

O governo federal e as empresas esperam que o julgamento do mensalão atrase a resolução das principais questões tributárias que estão à espera de decisão no Supremo Tribunal Federal (STF) e a tendência é a de que elas fiquem para 2013.

Os tributaristas que atuam diretamente na Corte estão sentindo os efeitos do mensalão desde o começo do ano. A pauta do STF foi invadida pela Ação Penal nº 470, desde fevereiro, com questões de ordem e sessões administrativas para tratar de detalhes do caso. Diante da proximidade do julgamento, os ministros passaram a dar prioridade para receber os advogados dos 38 réus do mensalão e, com isso, os tributaristas perderam espaço e muitos simplesmente não conseguem marcar audiência para discutir causas empresariais com os ministros. Para completar, o clima de tensão prévia ao mensalão, com discussões sobre a melhor maneira de conduzir o caso de grande repercussão política, também prejudica o julgamento dos demais processos.


"A dimensão do julgamento do mensalão deu o tom da rotina do STF nesse ano", afirmou o advogado Saul Tourinho Leal, professor de direito constitucional. Ele avaliou ainda que até os processos de repercussão social - e que são da preferência do presidente da Corte, ministro Carlos Ayres Britto - devem ser postergados por causa do mensalão. Entre eles está a validade da Lei Seca (exigência do bafômetro) e o decreto que regulamentou a concessão de terras aos quilombolas no Sul da Bahia.


O próprio governo não está contando com decisões tributárias do STF nesse ano. O advogado-geral da União, ministro Luís Inácio Adams, vai deixar de frequentar o tribunal durante o mensalão e acha que o mesmo deve acontecer com os grandes temas tributários.
Segundo Adams, nas últimas duas décadas, praticamente todas as ações do governo para aumentar a arrecadação foram questionadas pelas empresas e acabaram no STF. Isso fez do Supremo uma Corte eminentemente tributária. Agora, o governo deve se concentrar em desonerações, medidas que não provocam enxurradas de ações na Justiça. "As desonerações reduzem a necessidade de o empresariado recorrer ao Judiciário", disse Adams.


Nesse cenário, o STF deve se voltar aos processos envolvendo políticos. O Supremo vai deixar, portanto, a imagem de Corte tributária para a de tribunal político. Esse novo perfil do STF está sendo absorvido pelos tributaristas, que passaram a se adequar à realidade do mensalão. "A nossa forma de atuar mudou. Estamos focando em agravos (recursos contra decisões do plenário) ou nos casos que podem ser decididos por um só ministro, monocraticamente", disse o tributarista Dalton Miranda.


"No pós-mensalão, é provável que o STF procure julgar ações que possam ser decididas mais rapidamente, sem consumir uma tarde inteira com discussões", afirmou Gustavo Amaral, advogado da Confederação Nacional da Indústria (CNI). A entidade foi a autora, em 2003, da ação que discute a incidência de IR e de CSLL sobre empresas controladas e coligadas com outras no exterior. Apenas a Vale enfrenta uma cobrança de R$ 30,5 bilhões, e outras grandes companhias com atuação internacional discutem essa incidência. Mas, quase dez anos depois, a expectativa da CNI é a de que, mesmo após concluir o mensalão, os ministros do STF não encontrem uma brecha para julgar o caso das coligadas.


Adams acredita que os tributaristas devem sair cada vez mais da área contenciosa (disputas nos tribunais) para a área consultiva (planejamento às empresas). Nesse movimento, eles devem se concentrar mais no trabalho de acompanhar a formulação das leis do que na mera contestação delas. "Esse debate deve rumar para o local certo, que é o Congresso, até porque o Judiciário não é lugar para se fazer política tributária", afirmou o advogado-geral. Se a previsão se confirmar, as empresas vão se voltar cada vez mais ao Congresso e os políticos ao STF.


O mensalão tem data para começar - 2 de agosto -, mas está sem data para terminar.



Por Juliano Basile e Maíra Magro | De Brasília
Fonte: Valor Econômico (31.07.12)

 


Veja também

Quem reduzir consumo de energia terá bônus na conta, diz secretário

Bônus será para quem economizar 10% de energia com relação a 2020   O Brasil passa pel...

Veja mais
Confaz prorroga até 31 de dezembro a isenção de ICMS sobre transporte no enfrentamento à pandemia

Convênios prorrogados também amparam empresas, autorizando que os estados não exijam o imposto por d...

Veja mais
Mapa estabelece critérios de destinação do leite fora dos padrões

PORTARIA Nº 392, DE 9 DE SETEMBRO DE 2021   Estabelece os critérios de destinação do le...

Veja mais
Empresa não deve indenizar por oferecer descontos apenas a novos clientes

Não há vedação legal para que fornecedores de serviços ofereçam descontos apen...

Veja mais
Justiça do Trabalho é incompetente para execução das contribuições sociais destinadas a terceiros

A 9ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT/RJ), ao julgar um agravo de petiç&...

Veja mais
Corte Especial reafirma possibilidade de uso do agravo de instrumento contra decisão sobre competência

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu embargos de divergência e reafirmou o entend...

Veja mais
Partidos questionam MP sobre remoção de conteúdo das redes sociais

Seis legendas buscam no STF a suspensão dos efeitos da norma assinada pelo chefe do Executivo federal.   O...

Veja mais
Consumo das famílias cresce 4,84% em julho, diz ABRAS

Cebola, batata e arroz foram os produtos com maiores quedas no período   O consumo das famílias bra...

Veja mais
Lei que prorroga tributos municipais na epidemia é constitucional, diz TJ-SP

Inexiste reserva de iniciativa de projetos de lei versando sobre matéria tributária, a teor do dispos...

Veja mais