Adoção de selo ambiental é polêmica

Leia em 3min 40s

Sob pressão de grandes ONGs ambientalistas aliadas ao setor florestal, que abrange principalmente a indústria de celulose e papel e de exploração madeireira, o governo brasileiro tentará incluir a certificação socioambiental na lista dos instrumentos de políticas públicas que serão negociados pelos países em junho na Rio+20 - a conferência das Nações Unidas que definirá os rumos da economia verde. "Não será uma tarefa fácil, porque o assunto é polêmico até entre os países em desenvolvimento", afirma o embaixador André Correa do Lago, diretor de meio ambiente do Ministério das Relações Exteriores.


"Alguns países entendem esses mecanismos de mercado como precificação e não valorização da natureza; outros os enxergam como protecionismo, barreira ao livre comércio", revela o embaixador. Além dessas dificuldades, os países florestais mais pobres alegam incapacidade financeira e tecnológica para atingir padrões mais altos de produção sustentável. Para Lago, "temos que seduzir os países do G-77, pois há um grande temor de que a responsabilidade pelo desafio climático seja transferida aos países emergentes". O assunto entrará no contexto do debate entre as nações em desenvolvimento, tendo como estratégia a importância da certificação como algo complementar às legislações nacionais.


Países florestais mais pobres alegam incapacidade financeira para atingir padrões mais altos de produção 


"A posição dos países é mais influenciada por lobbies de quem teme perdas do que por propostas de setores ambientalmente mais avançados", diz o embaixador, lembrando que "o Brasil precisa fazer acima da média mundial porque tem mais força internacional, melhores condições econômicas, minérios, petróleo, água e biodiversidade". Se o cenário mundial com a Rio+20 não incorporar legalmente pontos que o Brasil defende, acrescenta Lago, "não significa que não precisamos aplicá-los".


"Há barreiras ideológicas contra ferramentas de mercado", ressalta André de Freitas, do Forest Stewardship Council (FSC), maior organização global que certifica produtos florestais. A entidade tem atuado junto ao grupo de 11 países florestais para a inclusão de uma emenda no documento oficial da Rio+20, destacando a importância desses mecanismos como suporte à sociedade na transição para a economia verde. A iniciativa ganhou sinal verde da União Europeia.


A proposta é transformar o apoio à certificação socioambiental em compromisso dos governos, sob a justificativa de que induz práticas sustentáveis e contribui com a conservação das florestas tropicais e seus recursos. Ao ganhar força política, o selo verde poderá receber planos nacionais de incentivo. O tema começa a entrar na agenda das compras e contratações públicas, que representam significativa parcela do PIB mundial. No Brasil, dados do Ministério do Planejamento indicam que as compras e obras governamentais são responsáveis por 15% da economia. O Ministério do Meio Ambiente articula com organizações ambientalistas a criação de um grupo de trabalho para avançar na questão.


"É significativa a influência do poder de compra do governo para a multiplicação de práticas sustentáveis", argumenta Freitas. Se o assunto evoluir na Rio+20, os governos se sentirão obrigados a se mexer e adotar políticas que podem privilegiar o selo socioambiental como instrumento que garante a origem sustentável dos produtos. "No caso dos produtos florestais, não adianta falar em certificação sem o mínimo de legalidade e de infraestrutura produtiva", adverte Antonio Carlos Hummel, diretor do Serviço Florestal Brasileiro (SFB). Ele diz que mais de 40% da extração madeireira na Amazônia é ilegal. Mesmo a legal não oferece na maioria dos casos garantias sobre a qualidade do manejo florestal e sobre a origem do que se consome nos grandes centros.


"Precisamos o mais rápido possível de uma lei sobre fomento florestal", propõe Hummel. Tramita na Câmara dos Deputados o projeto de lei 324/2007, que regulamenta a compra pública de produtos florestais e está em processo de revisão na Comissão de Finanças e Tributação.


Como 85% da madeira é consumida no mercado interno, regras de comércio internacional podem não proporcionar grandes mudanças no atual cenário de ilegalidade, que traz a reboque impactos negativos ambientais e sociais. Segundo Hummel, hoje 75% das terras na Amazônia são públicas, com 15 milhões de hectares sem destinação ou uso específico - ou seja, configuram-se como "terras de ninguém", abertas a práticas ilegais que despejam produtos nos principais mercados do país



Por Sergio Adeodato | Para o Valor, de São Paulo


Fonte: Valor Econômico (20.04.12)


Veja também

Quem reduzir consumo de energia terá bônus na conta, diz secretário

Bônus será para quem economizar 10% de energia com relação a 2020   O Brasil passa pel...

Veja mais
Confaz prorroga até 31 de dezembro a isenção de ICMS sobre transporte no enfrentamento à pandemia

Convênios prorrogados também amparam empresas, autorizando que os estados não exijam o imposto por d...

Veja mais
Mapa estabelece critérios de destinação do leite fora dos padrões

PORTARIA Nº 392, DE 9 DE SETEMBRO DE 2021   Estabelece os critérios de destinação do le...

Veja mais
Empresa não deve indenizar por oferecer descontos apenas a novos clientes

Não há vedação legal para que fornecedores de serviços ofereçam descontos apen...

Veja mais
Justiça do Trabalho é incompetente para execução das contribuições sociais destinadas a terceiros

A 9ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT/RJ), ao julgar um agravo de petiç&...

Veja mais
Corte Especial reafirma possibilidade de uso do agravo de instrumento contra decisão sobre competência

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu embargos de divergência e reafirmou o entend...

Veja mais
Partidos questionam MP sobre remoção de conteúdo das redes sociais

Seis legendas buscam no STF a suspensão dos efeitos da norma assinada pelo chefe do Executivo federal.   O...

Veja mais
Consumo das famílias cresce 4,84% em julho, diz ABRAS

Cebola, batata e arroz foram os produtos com maiores quedas no período   O consumo das famílias bra...

Veja mais
Lei que prorroga tributos municipais na epidemia é constitucional, diz TJ-SP

Inexiste reserva de iniciativa de projetos de lei versando sobre matéria tributária, a teor do dispos...

Veja mais