Advogados têm dúvidas sobre regras do parcelamento

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A recém-publicada norma que regulamentou o chamado Refis da crise ainda não resolveu muitos dos impasses em torno do novo parcelamento de longo prazo do fisco federal. O programa, que perdoa dívidas de até R$ 10 mil e permite o pagamento em até 15 anos de quase todos os débitos federais e previdenciários, foi regulamentado no dia 22 de julho com a edição da Portaria Conjunta 6/09, da Receita Federal e da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. Apesar disso, contribuintes ameaçados com a penhora de bens dados em garantia em execuções fiscais ainda precisam recorrer ao Judiciário se quiserem evitar os leilões. Como o sistema online de adesão ao parcelamento só entra no ar no próximo dia 17 de agosto, quem espera parcelar débitos em execução para salvar as garantias antes dessa data terá de pedir liminares à Justiça.

Desde que foi editada a Lei 11.941/09, que instituiu o novo parcelamento, empresas com a corda no pescoço têm corrido à Justiça para evitar a perda de bens penhorados em execuções fiscais. Elas alegavam que, embora a norma tivesse garantido aos devedores o direito a parcelamentos e descontos de multas, juros e encargos legais, devido à falta de regulamentação, não podiam usufruir dessa concessão. Liminares então se multiplicaram pelo país suspendendo leilões de bens e dando até mesmo certidões positivas com efeito de negativas às empresas.

Publicada a tão esperada regulamentação, vinda com a Portaria Conjunta 6/09, a situação permanece a mesma. O fisco não permitiu adesões ao parcelamento por meio de formulários de papel, mas apenas via online, por meio do site da Receita Federal. Os contribuintes terão de se cadastrar e obter uma senha. Como o sistema só começa a funcionar a partir do dia 17 de agosto — de acordo com a assessoria de imprensa da Receita Federal e com o artigo 12 da Portaria —, as empresas continuam de mãos atadas, pelo menos para soluções administrativas. “A saída é um pedido de adesão por escrito à Justiça, que pode, inclusive, garantir a obtenção de certidões”, explica o advogado Rodrigo Maito da Silveira.

O assunto foi discutido por tributaristas em um workshop organizado pelo escritório L.O. Baptista Advogados nessa quinta-feira (30/7) em São Paulo. Segundo Silveira, que palestrou no evento, a recente normatização deixou dúvidas também em relação à migração automática de parcelamentos antigos para o novo Refis, autorizada pelas regras do programa. A lei em que foi convertida a Medida Provisória 449/08 e que instituiu o novo Refis — Lei 11.941/09 —, limitou a inclusão, na negociação, de débitos vencidos até novembro de 2008. Já a Portaria 6/09 permite a inclusão de dívidas já parceladas posteriores a essa data. O impasse, diz o advogado, só será resolvido quando o prazo para a adesão for aberto, em 17 de agosto.

“É importante lembrar que débitos migrados de outros parcelamentos terão os valores originais recalculados com base na taxa Selic”, diz o advogado Marcos Ribeiro Barbosa, sócio do L.O. Baptista Advogados. O detalhe é importante principalmente porque parcelamentos anteriores — como o Refis, em 2000, o Paes, em 2003, e o Paex, em 2006 — usaram a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) para corrigir os valores originais. A taxa é bem inferior à Selic. No último mês de junho, o índice foi de 0,52%, enquanto a Selic, apesar da queda constante desde o início da crise financeira mundial, ficou em 0,76%. Em agosto de 2005, o índice chegou a 1,66%, o maior dos últimos cinco anos. Já a TJLP jamais passou de 0,82% no mesmo período.

Assim que for aberto para o público, o sistema de adesão online deve dirimir outra incógnita. De acordo com as regras publicadas, as quitações à vista dos débitos — que têm redução de 100% das multas de mora e de ofício, 40% das demais multas e 45% dos juros, além da dispensa de pagamento de encargos legais da PGFN — deverão ser feitas apenas com o pagamento das guias, sem a necessidade de qualquer formalização. “Isso pode gerar problemas no encontro das contas pelo fisco, impedindo a baixa de alguns débitos”, diz Silveira. Segundo ele, o sistema online pode trazer alguma forma acessória de confirmar a quitação.

Permitida pelas normas, a inclusão no parcelamento de débitos atribuídos a pessoas físicas responsáveis por pessoas jurídicas também está nebulosa. O fisco responsabiliza sócios e administradores quando não consegue cobrar dívidas tributárias das empresas, desde que configurada a responsabilidade da pessoa física pelo fato que gerou as pendências. Essas pessoas podem pagar os débitos da empresa à vista em seu próprio nome, com os descontos legais. Também podem parcelar as dívidas, mas nesse caso, precisam conseguir a anuência da pessoa jurídica devedora. No caso, porém, de empresas inaptas — que não entregam declarações e não são localizadas pela Receita —, em recuperação judicial ou em fase de liquidação de falência, obter uma carta de anuência pode ser impossível. “É necessário explicar a situação à Receita, ou entrar com uma medida judicial”, diz o advogado Horácio Villen Neto, também palestrante.

A opção, no entanto, pode ser perigosa. “Restituições de Imposto de Renda podem ficar bloqueadas enquanto os débitos da empresa não forem pagos”, diz Rodrigo Silveira. Por outro lado, pode ser a salvação para advogados que ficaram vinculados a pessoas jurídicas estrangeiras que deixaram dívidas no país. A situação é bastante comum, já que pessoas jurídicas do exterior só conseguem fazer negócios ou abrir subsidiárias no país nomeando um procurador — que costuma responder em todas as esferas mesmo depois do prazo estipulado na nomeação e é, na maioria dos casos, o advogado que dá conta dos registros no Brasil.

Além da regularização fiscal, o novo parcelamento abre outra porta para administradores e sócios que respondem a processos por crimes tributários. Segundo a Portaria, a negociação dos débitos suspende a punibilidade, o que significa a interrupção do prazo para apresentação da denúncia. “O acusado só voltará a responder se romper o parcelamento, mas com o prazo decorrido até lá, pode haver até mesmo a prescrição do crime”, explica Silveira. (Por Alessandro Cristo)

Fonte: Consultor Jurídico,3 de agosto de 2009.


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