PGR questiona dispositivos da reforma trabalhista que afetam gratuidade da justiça

Leia em 4min 10s

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5766, com pedido de liminar, contra dispositivos da chamada reforma trabalhista, que, em seu entendimento, impõem “restrições inconstitucionais à garantia de gratuidade judiciária aos que comprovem insuficiência de recursos, na Justiça do Trabalho”. Segundo o procurador, as normas violam as garantias constitucionais de amplo acesso à jurisdição e a assistência judiciária integral aos necessitados.

 

De acordo com Janot, com propósito de desregulamentar as relações trabalhistas e o declarado objetivo de reduzir o número de demandas na justiça, a Lei 13.467/2017 inseriu 96 disposições na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), com “intensa” desregulamentação da proteção social do trabalho e redução de direitos materiais dos trabalhadores.

 

“Na contramão dos movimentos democráticos que consolidaram essas garantias de amplo e igualitário acesso à Justiça, as normas impugnadas inviabilizam ao trabalhador economicamente desfavorecido assumir os riscos naturais de demanda trabalhista e impõe-lhe pagamento de custas e despesas processuais de sucumbência com uso de créditos trabalhistas auferidos no processo, de natureza alimentar, em prejuízo do sustento próprio e do de sua família”, afirma o procurador-geral.

 

A ADI requer a declaração de inconstitucionalidade do artigo 790-B da CLT (caput e parágrafo 4º), que responsabiliza a parte sucumbente (vencida) pelo pagamento de honorários periciais, ainda que beneficiária da justiça gratuita. Na redação anterior da norma, os beneficiários da justiça gratuita estavam isentos; com a nova redação, a União custeará a perícia apenas quando o beneficiário não tiver auferido créditos capazes de suportar a despesa, “ainda que em outro processo”. Assinala que o novo Código de Processo Civil (CPC) não deixa dúvida de que a gratuidade judiciária abrange custas, despesas processuais e honorários advocatícios.

 

O procurador impugna também o artigo 791-A, que considera devidos honorários advocatícios de sucumbência por beneficiário de justiça gratuita, sempre que tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa. A seu ver, a gratuidade judiciária ao trabalhador pobre equivale à garantia inerente ao mínimo existencial. Ele argumenta ainda que, ao pleitear na Justiça do Trabalho cumprimento de direitos trabalhistas inadimplidos, os trabalhadores carecedores de recursos, com baixo padrão salarial, buscam satisfazer prestações materiais indispensáveis à sua sobrevivência e à da família.

 

Segundo a ADI, créditos trabalhistas auferidos em demandas propostas por trabalhadores pobres assumem caráter de mínimo existencial, compatível com o princípio constitucional da dignidade humana (artigo 1º, inciso III). “Essas verbas trabalhistas, marcadas pelo caráter alimentar, não diferem das prestações estatais de direitos sociais voltadas à garantia de condições materiais mínimas de vida à população pobre, a que o STF confere natureza de mínimo existencial”, destaca.

 

Janot questiona também o dispositivo que responsabiliza o beneficiário da justiça gratuita pelo pagamento de custas caso o processo seja arquivado em razão de sua falta à audiência, até como condição para ajuizar nova demanda (artigo 844, parágrafo 2º). Ele salienta que o novo CPC, ao tratar da extinção do processo sem julgamento de mérito, atribui ao demandante desistente responsabilidade pelo pagamento de custas e despesas processuais proporcionais, mas não imputa essa responsabilidade ao beneficiário da justiça gratuita.

 

Para efeito de concessão de liminar, o procurador-geral argumenta que a probabilidade do direito se caracteriza pelo que classifica como “intensa violação ao direito fundamental de acesso à jurisdição trabalhista”, dada a restrição à gratuidade judiciária, que afirma representar prejuízo aos trabalhadores carentes, sem condições de mover uma demanda judicial sem prejuízo de seu sustento. Quanto ao perigo da demora, aponta que a legislação entrará em vigor a partir de 11 de novembro de 2017 e, se não tiver sua eficácia suspensa, produzirá prejuízos à população pobre carecedora de acesso à jurisdição trabalhista e a colocará em condição de fragilidade para enfrentar os riscos da demanda trabalhista.

 

“Sem medida cautelar, os prejuízos serão ainda maiores para trabalhadores pobres que necessitem demandar direitos trabalhistas sujeitos a perícia técnica, geralmente referentes a descumprimento de medidas de higiene, saúde e segurança do trabalho, em face do alto custo da atividade pericial”, ressalta.

 

Na cautelar, Janot requer a suspensão da eficácia da expressão “ainda que beneficiária da justiça gratuita”, no caput, e do parágrafo 4º do artigo 790-B da CLT; da expressão “desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa,” no parágrafo 4º do artigo 791-A da CLT; e da expressão “ainda que beneficiário da justiça gratuita,” no parágrafo 2º do artigo 844 da CLT. No mérito, pede a declaração de inconstitucionalidade das regras questionadas.

 

PR/AD

 

Processos relacionados

 

ADI 5766

 

 

Fonte: STF (28.08.2017)


Veja também

Quem reduzir consumo de energia terá bônus na conta, diz secretário

Bônus será para quem economizar 10% de energia com relação a 2020   O Brasil passa pel...

Veja mais
Confaz prorroga até 31 de dezembro a isenção de ICMS sobre transporte no enfrentamento à pandemia

Convênios prorrogados também amparam empresas, autorizando que os estados não exijam o imposto por d...

Veja mais
Mapa estabelece critérios de destinação do leite fora dos padrões

PORTARIA Nº 392, DE 9 DE SETEMBRO DE 2021   Estabelece os critérios de destinação do le...

Veja mais
Empresa não deve indenizar por oferecer descontos apenas a novos clientes

Não há vedação legal para que fornecedores de serviços ofereçam descontos apen...

Veja mais
Justiça do Trabalho é incompetente para execução das contribuições sociais destinadas a terceiros

A 9ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT/RJ), ao julgar um agravo de petiç&...

Veja mais
Corte Especial reafirma possibilidade de uso do agravo de instrumento contra decisão sobre competência

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu embargos de divergência e reafirmou o entend...

Veja mais
Partidos questionam MP sobre remoção de conteúdo das redes sociais

Seis legendas buscam no STF a suspensão dos efeitos da norma assinada pelo chefe do Executivo federal.   O...

Veja mais
Consumo das famílias cresce 4,84% em julho, diz ABRAS

Cebola, batata e arroz foram os produtos com maiores quedas no período   O consumo das famílias bra...

Veja mais
Lei que prorroga tributos municipais na epidemia é constitucional, diz TJ-SP

Inexiste reserva de iniciativa de projetos de lei versando sobre matéria tributária, a teor do dispos...

Veja mais