Enquanto o Supremo Tribunal Federal (STF) não voltar ao assunto, o uso do amianto da variedade crisotila (asbesto branco) estaria proibido em oito Estados, que editaram leis contra o produto. No restante do país, não estaria "permitido nem proibido", segundo informação da assessoria de imprensa da Corte. Resultado do "vácuo jurídico" criado pelo julgamento da semana passada.
Na quinta-feira, os ministros declararam "incidentalmente" a inconstitucionalidade de dispositivo da Lei federal nº 9.055, de 1995, que permite a extração, industrialização, comercialização e distribuição do amianto. A decisão foi tomada durante a análise de norma do Estado de São Paulo contra o produto.
Para a Eternit, fabricante de telhas, louças e metais sanitários, com o julgamento, a proibição só valeria para o Estado de São Paulo, e não para todo o território nacional, segundo informou em comunicado enviado na sexta-feira à Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Desta forma, a decisão não causaria nenhum impacto em suas operações.
A aplicação prática do julgamento dividiu os próprios ministros do Supremo. Depois de quatro sessões julgando uma ação contra o artigo 2º da Lei 9.055, de 1995, não se atingiu o mínimo constitucional de seis votos para declarar a inconstitucionalidade, o que os levou a fazê-lo, na sequência, por meio da análise da lei paulista, que foi mantida.
Antes da posição oficial divulgada pela assessoria da Corte, os ministros Dias Toffoli e Celso de Mello informaram que a declaração de inconstitucionalidade da lei federal impediria o uso do amianto em todo o país. Já o ministro Alexandre de Moraes afirmou que a declaração valeria apenas para o Estado de São Paulo.
Além de São Paulo, em sete Estados há leis que proíbem o uso do amianto: Mato Grosso, Minas Gerais, Santa Catarina, Amazonas, Pernambuco, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, segundo o Instituto Brasileiro de Crisotila (IBC). A validade das leis dos três últimos e do município de São Paulo ainda será julgada pelos ministros. Porém, não há previsão de quando será a análise.
Nos julgamentos, algum dos ministros pode esclarecer a questão, segundo o advogado Marcus Vinícius Ferreira, do escritório Wald Advogados, que representa Pernambuco. "Para mim é claro que o STF teve a cautela de fazer a declaração incidental de inconstitucionalidade para não limitar a decisão a um Estado", afirma. De acordo com o advogado, restringir a decisão a São Paulo seria como considerar que o Estado está "fora do país".
Já o advogado do Instituto Brasileiro de Crisotila, Marcelo Henriques Ribeiro de Oliveira, entende que a decisão não deixa dúvidas de que a lei federal segue válida em todo o país, menos no Estado de São Paulo. Para ele, o Supremo permitiu o uso do amianto no país, mas reconheceu que os Estados podem legislar sobre o assunto e proibir.
"Por enquanto, só no Estado de São Paulo não se pode usar amianto", diz. Como considera a decisão clara, o advogado afirma que não pretende apresentar embargos de declaração (recurso usado para pedir esclarecimentos), mas pode questionar um argumento que, aparentemente, não foi abordado pela Corte – a exclusividade da União para legislar sobre jazidas e minérios.
Sobre a declaração "incidental" de inconstitucionalidade, o constitucionalista Saul Tourinho, do escritório Ayres Britto Consultoria Jurídica e Advocacia, afirma que acontece quando o juiz afasta a vigência de uma lei para alcançar um determinado fim na ação, mesmo que a inconstitucionalidade não tenha sido solicitada pelas partes.
A rigor, essa declaração incidental se dá em julgamentos de casos concretos, com efeitos exclusivos às partes, segundo Tourinho. Porém, nesse caso, há uma peculiaridade: o incidente foi feito em ação direta de inconstitucionalidade (Adin), que tem validade mais ampla que um caso concreto. Assim, os efeitos são gerais também para a inconstitucionalidade da lei federal.
Por Beatriz Olivon | De Brasília
Fonte: Valor Econômico (28.08.2017)