Ação Direta de Inconstitucionalidade que está em trâmite na Corte pretende invalidar parte da lei que permite que agência exclua de maneira genérica uma substância dos produtos brasileiros
São Paulo - A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) pode perder o direito de proibir de forma genérica a importação e a utilização de alguns tipos de substâncias pela indústria, segundo especialistas.
Na visão deles, é grande a chance de o Supremo Tribunal Federal (STF) declarar inconstitucional a prática adotada pela agência após julgar uma Ação Direta de Constitucionalidade (ADI) referente à Lei 9.782/99, que trata das atribuições da agência reguladora. O processo tem relatoria da ministra Rosa Weber.
A ação impetrada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) visa garantir que a Anvisa tenha apenas uma atribuição de polícia em caráter excepcional e temporário. Assim, a agência teria que fazer uma análise particular para evitar que um composto com efeitos nocivos em determinado produto e benéfico ou neutro em outro não sofra uma exclusão completa do mercado.
De acordo com o sócio do escritório Lodovico Advogados, João Roberto Ferreira Franco, as agências no Brasil atuam de maneira muito engessada, até mesmo por falta de mão-de-obra. "Muitas análises são feitas de forma genérica. A agência deveria regular de forma técnica cada produto, não determinar que uma substância é ruim sempre", avalia especialista.
Franco cita o caso da cannabis sativa - erva popularmente conhecida como maconha - que em maio, após muita pressão da sociedade foi reclassificada na categoria de plantas medicinais. Antes, a comercialização era proibida pela Anvisa em qualquer situação.
"A reavaliação da cannabis, foi uma análise mais técnica, porque a substância foi autorizada para medicamentos, mas não para uso recreativo, por exemplo. A Anvisa tem que ter mais decisões como essa, levando em consideração o caso a caso", afirma.
Com a revisão da Anvisa, o medicamento Mevatyl, que é fabricado a partir de extratos isolados da cannabis teve seu registro concedido no Brasil e o livre comércio. O produto é indicado para o tratamento de adultos com espasmos relacionados à esclerose múltipla.
Já a sócia do Andrade Maia Advogados, Carolina Lisboa, defende que a Anvisa só tem competência para proibir produtos se ficar comprovado que riscos à saúde, conforme a Lei 9.782, que criou a agência.
"Tem que ser feita uma demonstração clara e com embasamento científico de que um produto faz mal à saúde", destaca a advogada.
Impactos
De acordo com Franco, a Anvisa precisa ter uma visão mais econômica. "Nenhum órgão poderia decidir de forma genérica sobre o mercado se a Constituição for seguida. A Anvisa está sendo autorizada a fazer algo que a Constituição não autoriza", avalia Franco.
Para o advogado, a atuação da agência poderia ser melhor regulamentada, seja pela edição de uma nova lei, seja pela construção de uma jurisprudência nova no STF. Na visão dele, se os ministros aprovarem a inconstitucionalidade da lei, o impacto para indústrias de diversos setores será muito positivo, uma vez que as fábricas não serão mais impedidas de produzir apenas em razão das moléculas e insumos presentes na composição dos produtos. "Por conta do efeito econômico às empresas, o STF deve decidir pela inconstitucionalidade [da lei que criou a Anvisa em 1999]", disse.
Além disso, o sócio do Ludovico Advogados espera uma maior segurança jurídica no País caso os ministros aceitem a ADI. "Quando as coisas ficam mais claras e não há contradição entre a Constituição e uma lei, é bom para o País".
Procuradas, Anvisa e CNI não responderam até o fechamento desta reportagem.
Ricardo Bomfim
Fonte: DCI (21.06.2017)