Investidores temem pagar multas de empresas com acordo de leniência

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Especialistas dizem que existe receio relacionado à falta de lei específica para o mecanismo ao mesmo tempo em que não há definição de um órgão próprio para aplicar punições relacionadas

 

São Paulo - Investidores temem comprar uma empresa ou operação envolvida em algum acordo de leniência, devido à possibilidade de serem obrigados a responder solidariamente pelas multas aplicadas no âmbito judicial.

 

A percepção de especialistas é que, apesar de várias das companhias envolvidas na Operação Lava Jato terem ativos à venda a preços atrativos e com qualidade o suficiente para serem explorados, os grandes bancos e fundos têm receio de que tudo o que comprarem seja penhorado para pagamento das dívidas com a Justiça.

 

De acordo com o sócio do PVG Advogados, Luciano de Souza Godoy, toda a venda de ativos de empresas envolvidas na Lava Jato está travada por causa desse receio.

"[A fatia] da OAS no aeroporto de Guarulhos, por exemplo, é um grande ativo. É rentável. Mas a dúvida do mercado [caso seja colocado à venda] é se a receita do aeroporto pode ser penhorada para pagar uma eventual multa", destaca. "No caso da JBS, há vários ativos à venda e é um acordo de 30 anos. Não faz sentido do ponto de vista de mercado ficar com um ativo sob risco de penhora por 30 anos", acrescenta.

 

Na opinião do advogado, muito dessa preocupação decorre da falta de uma legislação mais específica par os acordos de leniência no Brasil.

O professor de direito administrativo da FGV, Carlos Ari Sundfeld, afirma que a leniência ainda não é uma alternativa juridicamente segura. "Há muitas dúvidas sobre os efeitos, a validade e a capacidade dela em resolver todos os problemas", observa o professor.

 

Sundfeld lembra que a legislação foi colocada na Lei Anticorrupção em 2013, mas por ser um assunto muito complexo, mereceria uma revisão e até mesmo uma lei própria.

Hoje, conta ele, há uma briga por protagonismo no acordo de leniência entre Advocacia-Geral da União, Controladoria-Geral da União, Tribunal de Contas e Ministério Público Federal (MPF). "Há interesses dos vários órgãos do estado que impedem o avanço de uma regulação nova. Tem muita gente importante que briga pelo protagonismo."

 

O professor da FGV ressalta que o MPF, atualmente, tem ganhado essa disputa e foi o principal responsável por celebrar os acordos de leniência de empresas grandes como a JBS. Porém, essa posição de destaque foi adquirida por meio de uma interpretação criativa da lei, visto que a instituição não tinha competência originalmente para fazer isso.

 

Godoy afirma que esse é o principal risco para os investidores. "O MP está fazendo acordo de leniência mesmo sem ter uma lei que o respalde.Temos receio do TCU não aceitar e essa questão ter de ser resolvida no Judiciário", explica o advogado do PVG.

 

Cautela

O professor do Instituto de Direito Público de São Paulo (IDP-SP), Flávio Unes, salienta que não há dúvida de que se o acordo foi firmado por uma pessoa jurídica, que assumiu a obrigação - e a responsabilidade será repassada pelos sucessores em caso de aquisição. "A empresa se compromete a pagar o valor e isso vai para o passivo. Quem comprar vai assumir todos as dívidas", complementa Flávio Unes.

 

Já o especialista em direito constitucional e criminal, Adib Abdouni, recomenda muito cuidado a investidores e empresas que vão tratar com companhias que celebraram acordo de leniência. De acordo com ele, embora o objetivo do acordo seja manter a estabilidade do mercado e garantir os empregos ao mesmo tempo em que se repara um dano, todas as autoridades assumem um olhar muito rigoroso diante da pessoa jurídica que passou por esse processo.

 

"A empresa pode operar, mas está sendo constantemente monitorada pela Receita Federal e pelo Ministério Público. Quem quiser fazer negócio entra junto. Colateralmente, o investidor será atingido."

 

Ricardo Bomfim

 

 

Fonte: DCI (09.06.2017)


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