Norma da repatriação ainda deixa brechas

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Publicada ontem, a regulamentação da Lei da Repatriação pela Receita Federal ainda deixa brechas para questionamentos no Judiciário. O Fisco recebeu mais de 200 pedidos de inclusão, esclarecimento ou supressão ao disponibilizar uma minuta da norma para consulta pública.

Ainda assim, advogados orientam os contribuintes com bens ou dinheiro de origem lícita no exterior a aproveitar a oportunidade do Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT). E, no caso de negativa de adesão ou exclusão, discutir a medida na Justiça.

Criado pela Lei nº 13.254, o regime permite que recursos alocados fora do país sejam regularizados com o pagamento de 15% de Imposto de Renda (IR) e multa de 15% sobre o valor. A regulamentação está na Instrução Normativa nº 1.627.

 

"Algumas dúvidas cruciais permaneceram", afirma a advogada Ana Cláudia Utumi, do TozziniFreire. Se não há saldo em 31 de dezembro de 2014 porque antes houve transferência do patrimônio para trust ou fundação, por exemplo, o beneficiário e o instituidor têm que fazer a regularização ou estão sujeitos a penas criminais. Segundo ela, a lei diz que a declaração sem pagamento não tem valor. "Assim, há o risco de pagarem duas vezes sobre o mesmo patrimônio."

O mesmo problema ocorre em relação à doação, caso do pai que repassou recursos ao filho no exterior antes de 31 de dezembro de 2014. Nessa data, quem tinha ativos era o filho, que deverá fazer a declaração e pagar o imposto. "Mas o pai ainda estará sujeito a sanções criminais porque foi ele quem gerou o recurso e o manteve lá fora, por muitos anos, não declarado", afirma Ana Claudia.

 

Mesmo assim, a advogada recomenda a adesão. Desde que a origem dos bens ou recursos seja lícita e haja documentação que demonstre licitude e consistência. "Em breve, começa a troca global de informações e se o Fisco bater na porta do contribuinte pedirá uma multa provável de 150%, 27,5% de IR e juros Selic de 14,61%, o que pode chegar a 83,36% do patrimônio não declarado", diz. Em razão do prazo decadencial, o Fisco pode autuar a partir de 2010.

O advogado Pedro Moreira, do CM Advogados, afirma que há base legal para questionar no Judiciário o fato da análise de recurso contra a exclusão do regime ser feita apenas pelo superintendente da Receita.

"Isso fere o direito ao duplo grau de jurisdição para defesa e o princípio da presunção da inocência", diz Aline Cristina Braghini, da mesma banca. Ela defende que deveria haver chance de análise pela segunda instância.

 

Ambos também aconselham o uso do RERCT. Só lembram que a remissão não abrange tributos estaduais ou municipais. "Assim, se a varejista de eletrodoméstico mandou dinheiro resultante de vendas para o exterior, corre o risco de ter que pagar ICMS", afirma Moreira.

O artigo que passou a dispor que a remissão dos créditos tributários não aproveita os créditos já constituídos e não pagos "até 14 de janeiro de 2016" conferiu segurança jurídica, segundo o presidente do conselho do Movimento de Defesa da Advocacia (MDA), Marcelo Knopfelmacher. "Ficou esclarecida a questão sobre a impossibilidade de a Receita cobrar outros tributos federais, além do IR, sobre os valores regularizados."

 

O advogado Eduardo Salusse, da FGV Direito, também viu pontos positivos na regulamentação. Entre eles, o fato de a IN esclarecer que só a documentação falsa poderá levar à exclusão do RERCT. "E mesmo que não houvesse mais saldo em 31 de dezembro de 2014, deverá ser pago o imposto, com base no valor presumido de mercado e dólar de 31 de dezembro de 2014", diz. "Contudo, os recursos objeto de regularização permaneceram em uma lista taxativa. Como na lei a lista é exemplificativa, a negativa do Fisco poderá ser questionada na Justiça."

 

Por Laura Ignacio

 

De São Paulo 

 

 

Fonte: Valor Econômico (16.03.2016)


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