STF considera válida cláusula de renúncia a direitos

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O Supremo Tribunal Federal (STF) considerou válida cláusula que estabelece renúncia geral a direitos trabalhistas prevista em termo de adesão a programa de desligamento incentivado (PDI). A decisão foi unânime e contrária ao entendimento consolidado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST). 

 

O recurso foi julgado com repercussão geral e a decisão, que deve ser seguida pelas instâncias inferiores, libera 2.396 processos que estavam sobrestados aguardando o julgamento desse caso, de acordo com o presidente do STF, ministro Ricardo Lewandowski. Na prática, segundo advogados, as empresas usam a cláusula de renúncia genérica em seus programas para tentar impedir os trabalhadores de recorrer à Justiça. 

 

O recurso julgado na quinta-feira foi proposto pelo Banco do Brasil (BB), que incorporou o Banco Estadual de Santa Catarina. Em 2001, o BB lançou um plano de demissão incentivada, de adesão facultativa, ao qual a trabalhadora do processo aderiu. 

O regulamento previa vantagens para a adesão. Porém, trazia essa cláusula, que constou de acordo coletivo e foi aprovada pelos sindicatos. A trabalhadora, de acordo com o processo, recebeu R$ 133 mil pela rescisão, cerca de 78 vezes o valor da sua maior remuneração. 

 

Em primeira e segunda instâncias, a cláusula foi considerada válida, mas o Tribunal Superior do Trabalho (TST) considerou que a quitação só libera o empregador das parcelas especificadas no acordo. 

Na decisão, o TST aplicou sua orientação jurisprudencial, no sentido de que não é possível validar a renúncia genérica contida em termo de adesão a programa de desligamento incentivado, sob pena de violar a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) - que determina a obrigatoriedade de discriminar a natureza de cada parcela paga ao empregado e seu valor. 

 

O Banco do Brasil, então, recorreu ao Supremo, alegando violação do ato jurídico perfeito e da previsão constitucional de reconhecimento de convenções e acordos coletivos de trabalho. 

No STF, todos os ministros acompanharam o voto do relator, Luís Roberto Barroso, favorável à cláusula. No início de seu voto, Barroso afirmou que a jurisprudência nessa matéria tem sido extremamente divergente. "No próprio TST há decisões em sentidos diferentes sobre a validade da quitação ampla", disse. 

 

Barroso considerou legítima a proteção dada pelas leis trabalhistas e pelo TST, em orientação jurisprudencial, aos trabalhadores, mas ponderou que a assimetria entre empregador e empregado nas relações coletivas de trabalho não é a mesma das individuais. "Não vigora, em relação ao direito coletivo do trabalho, as mesmas limitações à autonomia individual", disse. 

 

O ministro destacou que o modelo imposto pela Constituição de 1988 é o de valorização das negociações coletivas e acordos coletivos de trabalho. "A negociação coletiva tem um caráter emancipatório do trabalhador, liberando-o do paternalismo excessivo sem deixá-lo desamparado. Autorizar o empregado a burlar o acordo coletivo a que ele aderiu voluntariamente - esses trabalhadores tinham estabilidade e não perderiam o emprego - é passar a mensagem errada. O hipossuficiente deve ser protegido, mas não tem o direito de ser incorreto", afirmou. 

 

Barroso também destacou a importância dos planos de demissão incentivada que, como regra geral, oferecem condições de rescisão de contrato de trabalho mais vantajosas. "Nenhum empregador vai querer dar vantagem extra sabendo que depois terá que responder a uma ação trabalhista", disse. 

Para o advogado da trabalhadora, Alexandre Lindoso, a decisão do STF foi um golpe para o direito do trabalho. "Reformaram uma jurisprudência já consolidada no TST", afirmou. 

 

No julgamento, o ministro Marco Aurélio disse que agora o TST terá que rever sua orientação jurisprudencial. Já o ministro Teori Zavascki afirmou que a cláusula questionada compõe um acordo coletivo homologado e a anulação de cláusula tão sensível poderia levar a uma revisão integral do que foi acordado, inclusive de cláusulas favoráveis ao empregado. 

 

Com o julgamento foi firmada a seguinte tese: "A transação extrajudicial que importa rescisão no contrato de trabalho em razão de adesão voluntária do empregado a plano de dispensa incentivada enseja quitação ampla e irrestrita de todas as parcelas objeto do contrato de emprego caso essa condição tenha constado expressamente do acordo coletivo que aprovou o plano bem como dos demais instrumentos celebrados com o empregado". 

 

Antes do julgamento, o relator discutiu a participação da Volkswagen do Brasil como amicus curiae (parte interessada) nesse processo, questionada pela defesa da trabalhadora. Barroso, porém, manteve a montadora no processo. Não participaram do julgamento a ministra Rosa Weber, que estava impedida, e os ministros Celso de Mello e Dias Toffoli, que estavam ausentes. 

 

Para Luiz Antonio dos Santos Junior, sócio da área trabalhista do Veirano Advogados, a decisão é positiva, pois traz segurança jurídica, principalmente nas discussões envolvendo acordos coletivos. "Esse entendimento pode fazer o próprio TST repensar algumas decisões." 

 

Beatriz Olivon - De Brasília

 

 

 

Fonte: Valor Econômico / Clipping Eletrônico AASP (04.05.2015)


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