Segurança jurídica será marca de novo código no Direito do Trabalho

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Para especialistas, novas regras processuais irão obrigar juízes a observar mais de perto decisões dos tribunais superiores. Hoje, sentenças ainda variam conforme a visão de cada magistrado

 

São Paulo - O maior respeito à jurisprudência deve ser uma das marcas que o novo Código de Processo Civil (CPC) deverá deixar na Justiça do Trabalho, na visão de especialistas. Ao empresariado, isso deve se traduzir em maior segurança jurídica.

 

Hoje, segundo eles, os juízes de primeira instância têm muita liberdade para adotar ou não as interpretações feitas pelos tribunais superiores. Com isso, as decisões a respeito da norma trabalhista podem variar de magistrado para magistrado.

 

A professora da Rede LFG, juíza Thais Mendonça, exemplifica a situação com o caso da demissão de uma gestante pelo empregador, que desconhecia a gravidez. "Não tenho lei nenhuma sobre isso. Existem apenas três dispositivos legais sobre o tema. E com esses três eu não consigo responder à pergunta", argumenta ela.

 

Apesar da lacuna na Legislação, a juíza explica que o Tribunal Superior do Trabalho (TST) possui entendimento em súmula sobre o assunto. Mas com o código processual vigente, ainda haveria espaço para dúvida.

 

Com as novas regras processuais, que devem entrar em vigor em pouco mais de um ano, a previsibilidade deste tipo de caso aumenta. "A partir do momento em que a súmula passa a ser procedente, a empresa já sabe o que vai acontecer", acrescenta. No caso, conforme a súmula, a empresa teria que conceder a estabilidade para a funcionária grávida.

 

"Assim, as pessoas começam a saber sobre direito do trabalho. Muitos questionamentos vão ser sanados. A questão não fica mais variando de juiz para juiz. Há juiz que não aplica a súmula. Ao criar o sistema de precedentes, respeita-se [o entendimento] e acabou", afirma.

 

Na mesma linha, o professor Rodrigo da Cunha, também da LFG, diz que esse aspecto da segurança jurídica é um dos mais marcantes do novo código. "O que acontece hoje é que cada juiz possui uma interpretação a respeito da lei. Isso gera insegurança muito grande."

 

Repercussão geral

 

Ele destaca que mesmo nos casos em que o STF decide em caráter de repercussão geral - quando o parecer vale para uma infinidade de processos parecidos - nada impede que o juiz, num segundo momento, ignore o parecer.

 

Seria o caso, por exemplo, do julgamento, ainda em trâmite, sobre a chamada desaposentação. O caso discute a possibilidade de o aposentado que não parou de trabalhar trocar de benefício. Apesar das várias sessões que o STF já usou para tratar do tema, e das que ainda usará, só com o novo código, diz Cunha, o julgamento terá maiores efeitos.

 

Modulação

Outro mecanismo processual que reforça a segurança jurídica diz respeito à modulação dos efeitos das sentenças. Hoje, só o STF faz a modulação (restrição) dos efeitos de suas decisões. Quando a Justiça derruba uma isenção tributária, por exemplo, a modulação pode garantir que as empresas não precisem devolver os descontos de impostos dos últimos cinco anos.

 

Cunha, doutor em processo civil, comenta que agora há previsão legal para que os tribunais modulem os efeitos de suas decisões. "Quer dizer, o tribunal pode aplicar o entendimento apenas daquele momento em diante. Sem que haja efeito retroativo", diz.

 

Com isso, pode-se evitar, por exemplo, que a decisão judicial crie um enorme passivo inesperado para a empresa. "No Brasil até o passado é incerto", comenta. Para ele, não seriam raras as ocasiões em que o Judiciário mantém um parecer por muitos anos, mas de repente muda de ideia, inclusive com possibilidade de efeitos retroativos.

 

"Como desenvolver uma atividade empresarial num ambiente de tanta insegurança jurídica? O problema é que não se sabe as regras do jogo", diz.

 

Rapidez

 

Se por um lado a expectativa de maior segurança jurídica parece consenso, há dúvidas em relação à aceleração do trâmite judicial, principalmente na Justiça do Trabalho. O sócio do Demarest Advogados, Paulo Valed Perry Filho, conta que há "otimismo" em relação à capacidade do novo CPC de reduzir a duração dos processos.

 

Para ele "é certo que medidas foram tomadas" desde antes da aprovação do Código, para diminuir a demora do Judiciário. No entanto, nem a redução da possibilidade recursos aos tribunais, tampouco o estímulo à utilização de acordos, significa, na prática, que se alcançará "a almejada duração razoável do processo."

 

No rito processual trabalhista, que já é considerado o mais célere da Justiça brasileira e que possui ênfase na conciliação, o advogado avalia que o novo CPC não deve trazer grandes inovações.

 

Nem mesmo as novas possibilidades de julgamento de demandas repetitivas ou de ações em massa terão a mesma eficácia no direito do trabalho, diz Perry. Isto porque, há a necessidade de que as ações discutissem absolutamente a mesma matéria. Mas nas trabalhistas, trata-se de direitos individuais e personalíssimos. "É incomum existirem ações idênticas no que se refere ao mérito discutido."

 

O advogado faz a ressalva de que "não há dúvidas de que as reformas processuais são benéficas". Contudo, acrescenta que como as questões são profundas, "não bastará, infelizmente, apenas as alterações da legislação processual".

 

Roberto Dumke

 

 

Fonte: DCI (19.01.2015)


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