Empresas contribuirão com cota para moradia

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Os empreendimentos imobiliários da cidade de São Paulo, com mais de 20 mil metros quadrados de área construída, terão que destinar 10% dessa área para a chamada Habitação de Interesse Social (HIS), cujo objetivo é atender famílias com renda de até seis salários mínimos. A medida, denominada de cota de solidariedade, é uma inovação introduzida no país pelo plano diretor do município de São Paulo, cujo conteúdo, que está Lei nº 16.050, foi publicado em agosto no Diário Oficial.

 

A Secretaria de Desenvolvimento Urbano do Município informa que a cota se insere no cumprimento da função social da propriedade, prevista no artigo 5º da Constituição Federal, e tem por fim a construção de moradias populares. Pela nova legislação, as empreiteiras obrigadas a contribuir com a cota terão uma contrapartida. O empreendimento poderá beneficiar-se de um acréscimo de 10% na área computável, obtida mediante o pagamento de uma espécie de taxa. A norma também apresenta algumas alternativas à destinação de parte do terreno para as moradias populares, como a doação de área localizada em outro lugar ou o depósito do valor equivalente para o Fundo de Desenvolvimento Urbano (Fundurb).


Segundo advogados da área imobiliária, além de gerar uma eventual despesa extra às empresas, o que poderá ser repassado aos consumidores, a lei evidencia um choque entre o direito à propriedade e a determinação de atender a função social. A interpretação da medida, porém, é divergente entre especialistas.


O advogado Pedro Bicudo, sócio da área de imobiliário do escritório Lobo & Ibeas, avalia que a obrigação de contribuição com uma cota ofende o direito de propriedade, também previsto na Constituição, por impor uma restrição ao uso desse bem. "Com a obrigação de um destino social, há a obrigação de a pessoa fazer algo com parte de sua propriedade que ela não necessariamente queria fazer", afirma.


Nesse contexto, o advogado Alexandre Clápis, sócio da área imobiliária do Stocche Forbes, critica a inversão de papéis decorrente da criação da cota. "O Estado está transmitindo uma obrigação que é dele, a de moradia", afirma. Ele também acredita que a medida poderá afetar o resultado financeiro dos empreendimentos.


O presidente do Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis Residenciais e Comerciais de São Paulo (Secovi-SP), Claudio Bernardes, entende, porém, que a compensação dos 10% extra de área computável impediria o questionamento da cota chegasse à Justiça a partir da argumentação relativa ao direito à propriedade. "É uma regra administrativa que não causa prejuízo, então não viola o direito de propriedade", diz. Ele afirma que, se a cota causasse impacto financeiro às empresas do setor, isso teria que ser repassado aos compradores. "O prejudicado seria quem compra".


Marcelo Tapai, sócio do escritório Tapai Advogados, defende que não há objeção constitucional à cota de solidariedade. "Hoje se fala muito de função social da propriedade, inclusive se sobrepondo ao direito a propriedade quando, por exemplo, não posso deixar um imóvel parado por muito tempo, subutilizado, porque a prefeitura pode se apropriar para moradia social", diz. Para o advogado, a cota de solidariedade é uma forma que a prefeitura encontrou para garantir a moradia popular.


Já o secretário de Desenvolvimento Urbano de São Paulo, Fernando de Mello Franco, afirma que a medida não afetará os negócios imobiliários, pois o setor teria capacidade de absorver isso. "Pode ser que o mercado saiba inclusive operar com lucro", diz.


De acordo com o secretário, 20 mil metros quadrados de área construída computável equivalem a 40 mil metros quadrados de área construída (a área contabilizada pela município não inclui sacadas, por exemplo), o que equivale a construções do porte dos grandes shopping centers da cidade, na comparação do secretário. "A porcentagem de empreendimentos com esse tamanho é pequena", afirma.


No ano passado, de um total de 271 empreendimentos, 13 tiveram área útil maior do que 20 mil metros quadrados (4,79% do total), segundo a prefeitura. Em 2012, eles representaram 7,69% do total.


Por Beatriz Olivon | De São Paulo

 

 

Fonte: Valor Econômico (22.09.2014)

 


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