Cervejarias prontas para ir às compras

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Quando a AB InBev, maior cervejaria do mundo, assumiu o controle total da mexicana Modelo, acreditava que o acordo eram favas contadas; afinal, já a controlava, com uma participação de 50% e selar sua propriedade pouco afetaria o cenário.

Porém, órgãos reguladores antitruste dos Estados Unidos rejeitaram o acordo, temendo que uma companhia maior aumentasse o preço de marcas populares como Corona. Somente em 2013, após um ano de negociações e promessas de vendas dolorosas de ativos, a AB InBev recebeu a aprovação para o negócio de US$ 20 bilhões.

Agora, quando o negócio mundial de cerveja se prepara para outra rodada potencial de consolidação, esse episódio lança dúvidas sobre a aspiração das gigantes remanescentes do setor de construir impérios.

Em setembro, a Heineken disse ter rejeitado uma proposta de compra da SABMiller, segunda maior cervejaria do mundo. Embora essa transação talvez nunca ocorra, a tentativa da SABMiller de crescer por meio de uma aquisição grande poderia produzir nova rodada de negociação.

"Claramente há espaço para meganegociações", afirma Marc Levit, do Demeter Group, consultoria especializada no setor de cerveja. "Faz sentido para quem procura crescimento internacional e, inevitavelmente, acontecerá".

A próxima rodada pode não ser tão fácil quanto a última. Depois de décadas de consolidação, existem inúmeros obstáculos diante das cervejarias interessadas em crescer por negociações gigantescas.

Os órgãos reguladores temem que empresas grandes se tornem maiores ainda. A AB InBev atualmente controla perto de 21% do mercado cervejeiro mundial; se a SABMiller adquirisse a Heineken, controlaria outros 21%. E a maioria dos alvos restantes, como a Heineken, é controlada por famílias que parecem relutantes em vender.

Apesar dos desafios, no entanto, analistas acreditam que tanto a Anheuser quanto a SABMiller tentarão forjar acordos nos próximos meses e anos.

"Com a taxa de juros num valor baixo histórico e as tendências de crescimento orgânico lentas em muitos mercados, acreditamos que as condições estão dadas para um aumento em fusões e aquisições", afirma Simon Hales, analista cervejeiro do Barclays.

OBSTÁCULOS À FRENTE

Os titãs da cervejaria interessados em crescer também lutam com mudanças nos hábitos de consumo em alguns dos mercados maiores e mais maduros, como os Estados Unidos. "É o envelhecimento dos EUA: à medida que nos tornamos velhos, passamos a beber vinho", disse Harry Balzer observador veterano de tendências alimentares e vice-presidente do NPD Group.

A maior e mais poderosa fusão seria a combinação potencial da AB InBev e da SABMiller. Embora a primeira tenha cogitado o acordo no passado, não prepara nenhuma oferta pela segunda agora, de acordo com pessoas familiarizadas com os planos da empresa. "Nos últimos quatro anos, analistas, investidores e comentaristas do setor destacaram que uma proposta assim seria um provável fim de jogo para um período de mais de uma década de consolidação do setor cervejeiro", diz Hales, do Barclays.

Porém, quaisquer que tenham sido os obstáculos regulamentares encarados pela AB InBev para liberar o acordo com a Modelo, seriam pequenos se comparados à resistência que enfrentaria se tentasse adquirir a SABMiller.

No mínimo teria de vender a Miller Lite, segundo maior marca de cerveja leve dos Estados Unidos atrás da Bud Light. E com a sobreposição na Europa e outros mercados, talvez tivesse que vender bilhões de dólares em marcas regionais.

Por mais intimidante que pareça, a AB Inbev tem um histórico de obter lucros estupendos das empresas que adquire. Controlada pelo grupo brasileiro 3G Capital – que também controla a Heinz e o Burger King –tem reputação de eficiência no corte de custos, e analistas acreditam que mesmo após vender marcas como Miller Lite, conseguiria fazer o negócio funcionar.

Se uma combinação de AB Inbev e SABMiller vier a ocorrer, seria criada uma empresa que provavelmente valeria mais de US$ 200 bilhões. Também seria uma oportunidade para outros compradores, principalmente a Molson Coors, abocanharem marcas lucrativas como a Miller Lite.

Isso daria à Molson Coors, avaliada em aproximadamente US$ 13 bilhões, a chance de crescer.

A Carlsberg, outra cervejaria independente de tamanho médio, poderia estar bem posicionada para adquirir vendas de ativos na Europa.

Todavia, Molson Coors e Carlsberg são alvos improváveis de SABMiller ou Anheuser. A exemplo da Heineken, são controladas por famílias fundadoras que não parecem interessadas na venda agora.

Caso a AB Inbev não compre a SABMiller, outro tipo de transação gigantesca poderia acontecer. A SABMiller tropeçou nos últimos trimestres, e analistas disseram que a tentativa de adquirir a Heineken pode ter colocado a empresa no mercado. "Embora tenha conseguido equilibrar parte da retração orgânica por meio de economias com eficiência e custos, a história subjacente do crescimento não é tão impressionante como já foi", comenta Hales, do Barclays.

BRIGA NO ARTESANAL

A Diageo, grande fabricante de destilados e dona de marcas como Johnnie Walker e Smirnoff, já produz a Guinness, e executivos da empresa afirmaram que estariam abertos para crescer mais no setor cervejeiro, podendo surgir como um possível pretendente.

O único segmento do setor cervejeiro que está florescendo é o das marcas artesanais, cujas vendas subiram quase 20% no ano passado. O segmento ainda responde por uma parcela muito pequena da venda de cervejas, mas oferece a novidade ansiada por consumidores, numa ampla gama de sabores que costumam ser sazonais ou disponíveis durante períodos limitados. "A cerveja artesanal se tornou o movimento do vinho do setor cervejeiro", compara Balzer, do NPD Group. "Até são apresentadas fazendo dupla com os pratos nos cardápios, como se fossem vinho".

As grandes cervejarias também desenvolveram versões artesanais. A Tenth and Blake Beer Co., fabricante da Blue Moon, é a divisão artesanal da Miller Coors, enquanto a Goose Island Brewery é a unidade artesanal da Anheuser-Busch. Apesar dos sistemas parrudos de distribuição, as empresas têm sofrido para competir com as cervejarias artesanais pequenas. E a aquisição das maiores marcas artesanais, tais como Samuel Adams ou Sierra Nevada, teria pouco efeito nas vendas de uma companhia tão grande quanto a AB Inbev. "A artesanal vai se tornar cada vez mais importante ao longo dos anos, mas não basta só isso para despertar o interesse da AB InBev", argumenta Levit.

As grandes marcas de cerveja como Bud, Bud Light, Coors Lite, Miller Lite, Corona e Heineken ainda respondem por cerca da metade do volume do segmento, e o aumento de preços ajudaram os fabricantes a lucrar.

Joe Thompson, presidente da consultoria Independent Beverage Group, afirma que a atividade de fusão talvez tenha absorvido atenção corporativa demais nos últimos anos. Para ele, as grandes cervejarias "concentraram a energia em criar valor, cortar custos e praticamente tiraram o olho do volume".

Em termos internacionais, no entanto, ainda existe espaço para as marcas principais cresceram, mesmo perdendo mercado nos EUA.

E é nesse cenário – sede de crescimento, mudança dos hábitos do consumidor e restrições das agências reguladoras – que as grandes cervejarias, incluindo AB Inbev e SABMiller, irão arquitetar seus próximos passos. "Virou um tabuleiro de xadrez global", conclui Thompson.



Veículo: Diário do Comércio - SP


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