Loja na nuvem ou na terra? É melhor unir as duas

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A integração entre o comércio físico e o virtual foi tema de um debate entre especialistas na sede da ACSP (Associação Comercial de São Paulo) nesta terça-feira (15/09). Casos como os do Buscapé, Meu Amigo Pet, Imigrantes Bebidas e Hope foram apresentados por varejistas bem-sucedidos nas duas plataformas. 

Ao expandir suas operações para lojas físicas ou virtuais, essas marcas prosperaram e descobriram novos públicos, produtos e formatos a serem explorados.

Para Nelson Kheirallah, vice-presidente da ACSP e coordenador do conselho de varejo da entidade, é consenso que as duas modalidades se complementam.“Temos que proporcionar ao consumidor todo o tipo de experiência. Ele tem que pagar como quiser, e olhar o produto onde quiser para, então, decidir onde quer comprar”, disse. Marcel Solimeo, economista-chefe da ACSP, afirmou que é preciso criatividade para sobreviver à crise.

Ao discorrer sobre a situação atual do varejo, ele citou o cenário de 2010, que favorecia o consumo com a expansão do emprego, o aumento da renda, a queda da taxa de juros, o alongamento dos prazos de crediário e o crescimento da massa salarial.“Hoje, temos uma situação inversa. O desemprego está crescendo, os reajustes salariais estão contidos, os juros não param de subir, e a confiança do consumidor apresenta uma queda maior a cada mês”, disse.

De acordo com Solimeo, o consumidor está muito cauteloso para se endividar. No entanto, ele afirmou que o mercado consumidor do Brasil é um dos maiores do mundo e, mesmo diante desse cenário, os empresários não podem ser pessimistas.“O principal ponto para qualquer empresário é saber qual é a realidade do mercado, de seu setor, e da sua empresa. Somente estando bem informado, é que ele vai saber quais as medidas podem ser tomadas”, disse o economista.

Crescimento do E-Commerce

Na expectativa para o evento Black Friday 2015, que será realizado em 27 de novembro, Pedro Guasti, co-fundador da consultoria E-bit e idealizador do Relatório Webshoppers, disse que as vendas online devem atingir um faturamento de R$ 41,2 bilhões em 2015.

Desta forma, a variação deve ser de um crescimento de 15% na comparação com 2014, o que equivale a 5% abaixo do projetado para 2015.

Em números de pedidos, no entanto, a expectativa é de atingir a marca de 108,2 milhões, um crescimento de 5%.“Vamos crescer acima de dois dígitos porque o tíquete médio cresceu muito nesse ano e atinge R$ 400. Basicamente, os consumidores que buscam um produto de maior valor, como geladeira, têm optado pelo comércio eletrônico”, disse.Guasti diz que o preço da loja online chega a ser até 15% menor em relação ao da loja física para o mesmo produto.

Crise

As dicas de Guasti para enfrentar a atual recessão são: otimizar e melhorar os processos internos; manter um rigoroso controle de despesas e cautela com investimentos; evitar empréstimos bancários; renegociar contratos de fornecedores; fazer uma análise criteriosa do retorno sobre investimento em mídias; buscar novos nichos; melhorar a experiência de compra; surpreender o cliente e estar atento à política de frete grátis e ao parcelamento longo sem juros.“Renegocie com seus fornecedores. Tente buscar maneiras de reduzir custos. É melhor vender menos e manter a margem de lucro do que perdê-la”, afirmou.

Segundo Guasti, os números apresentados pelo mobile commerce (comércio pelo celular) revelam grandes oportunidades empresariais, a partir das recentes mudanças de comportamento do consumidor online brasileiro.

Uma delas é que mais de um terço do acesso a lojas virtuais é feito via browsers. Outra é  que as vendas por smartphone ou tablets já representam quase 11% do total de negócios online.“Esses 10% no final do mês fazem toda a diferença para bater uma meta. Apenas no mês de julho, 12,5% do faturamento do comércio eletrônico resultou de vendas realizadas em dispositivos móveis, ou seja, sua loja virtual tem que funcionar em telas menores”, disse.

Na categoria de eletrodomésticos, 16% do total de vendas online são feitas pelo mobile. Já as compras de artigos de moda e acessórios, celulares, e decoração, representam 12%. “A tendência é tamanha, que muitas pessoas estão realizando a sua primeira compra no e-commerce já pelo mobile porque muitas delas só acessam a internet em dispositivos móveis”, destacou.

Guasti disse que a praticidade, segurança, comodidade e agilidade são os principais motivos apontados pelos consumidores para comprar pelo celular.

Do físico para o virtual

No evento, Pedro Américo, assessor de marketing e planejamento de e-commerce da Imigrantes Bebidas, falou sobre a decisão da tradicional distribuidora da Zona Sul de incluir a loja virtual nos negócios.

Operando desde 1987, a loja se aventurou no e-commerce em 2003, quando se tornou a primeira loja de bebidas na internet. Hoje, 25 funcionários se dedicam exclusivamente ao funcionamento da loja virtual, que corresponde a 35% do faturamento de uma unidade física.

Mesmo com 16 anos de experiência, Américo garante que entrar no mercado de e-commerce não foi uma tarefa fácil. A primeira dificuldade para fazer o novo modelo de negócio funcionar foi aprimorar a logística da empresa.“Os Correios não queriam porque bebida é um produto complicado. É pesado, de vidro, muito frágil, e pode gerar uma série de problemas. Começamos devagar e optamos por uma logística própria e restrita à Capital para ter certeza de que o serviço seria bem feito”, disse.

Atender novos perfis de consumidor, adequar o mix de produtos oferecidos e se proteger contra fraudes foram outras dificuldades encontradas, completou.

Há 12 anos no e-commerce, o negócio colhe bons frutos. Com o aumento no movimento na unidade física e do faturamento da plataforma virtual, a Imigrantes Bebidas ampliou a unidade da Zona Sul e inaugurou outra na Zona Leste.Agora, a empresa está prestes a abrir a terceira loja na Lapa, na Zona Oeste.

Do virtual para o físico

Quando se discute a transição do virtual para o físico, dois pontos são importantes: ampliar a capilaridade e fortalecer a marca junto ao consumidor online, mas também aumentar o poder de barganha junto aos fornecedores.

No evento "Da nuvem para a terra”, Daniel Nepomuceno, fundador da Meu Amigo Pet, contou como uma empresa original do e-commerce, criada em 2008, decidiu migrar para o varejo físico em 2011 por meio do franchising.Tornou-se, inclusive, a primeira rede do segmento pet a entrar no anuário da Associação Brasileira de Franchising (ABF).

Hoje, a marca tem 15 lojas físicas, mas o site é considerado “mais uma loja”, segundo o fundador, por vender mais em volume e pela comodidade para o cliente.“A internet é uma terra de métricas, e fornece uma ideia do que os consumidores querem”, disse.

Da compra fracionada de produtos em um grande varejista do segmento para atender a clientela online no início, até chegar ao atual estoque com 3,6 SKUs, a Meu Amigo Pet conseguiu criar uma marca de valor no varejo virtual, e depois no físico, trabalhando vários conceitos.“E com pouco dinheiro para investir”, lembrou Nepomuceno. 

Um das atitudes de sucesso foi trabalhar o conceito “pet lover” nas redes sociais, onde já atingiu 2 milhões de fãs. Outras foram oferecer produtos diferenciados e “muito além da ração” e sediar eventos de ONGs de proteção animal – o que ajudou a trazer fluxo de clientes para a loja.

A empresa buscou parceiros e celebridades “pet friendly” (amigos dos animais) para promover a marca e, assim, gerou visibilidade para ambas as partes, sem nenhum custo adicional.

Recentemente, a Meu Amigo Pet implantou uma nova interface no site para vender pelo celular. As conversões aumentaram 20% e, hoje, o negócios feitos por mobile representam 10,2% das receitas.Além da missão de “melhorar a relação que as pessoas têm com os pets”, Nepomuceno disse que a ideia foi sempre tentar resolver problemas de acordo com a oferta de produtos.

Mas, para uma transição como essa dar certo, é preciso se questionar sobre o motivo que levaria um cliente a comprar na loja. “Se você não encontrar nenhum motivo, é hora de repensar o modelo de negócio”, recomendou.

Adotar uma “perspectiva mais evoluída” do conceito de multicanal foi a estratégia da Hope para se aproximar do consumidor, conforme mostrou o diretor de franquias e expansão da marca, Sylvio Korytowski, no painel “No caminho.”

Nascida na indústria e referência como “fábrica de calcinhas de algodão básicas”, a quase cinquentenária Hope conseguiu mudar a percepção de marca ao entrar para o segmento premium e fashion, por meio do franchising e com lojas-conceito. E sem sair do varejo multimarca.Depois, ao criar uma estratégia para o e-commerce, tornou-se definitivamente omnichannel ao perceber que, para o consumidor, não importa mais o ponto de venda, e sim a experiência de compra.

Foi assim que o custo de um produto da marca passou de R$ 2,90 para R$ 29,50, mesmo que a consequência disso tenha sido tirar linhas de produtos de pontos de venda mais populares, como supermercados, e gerado uma perda inicial de receitas.“Hoje, o consumidor compra soluções, não produtos. Tudo isso acontece quando se cria valor ao negócio. O preço é balizado por essa percepção”, disse Korytowski.Segundo ele, 73% dos consumidores que compram na internet, também compram na loja física.

Por isso é preciso alinhar estratégias para integrar canais. Na Hope, cada canal é um modelo de negócio, e as políticas definidas de distribuição diminuem possíveis conflitos. 

Com um consumidor 100% digital e o segmento de moda e acessórios em primeiro lugar nas vendas do e-commerce (18% do total, segundo dados do 32º Relatório Webshoppers, da E-bit), para a Hope, mais importante do que ter canais de vendas foi saber se comunicar também no online.

No caso desse segmento, é preciso ter um site com experiência agradável e fácil de comprar, usar mídias sociais de forma eficiente e contar até com a divulgação das blogueiras de moda. “Encantar o cliente é o segredo”, recomendou.

Inspiração e tendências

O on e offline integrados foram o foco do painel “O mercado e as oportunidades no comércio eletrônico para superar a crise e as tendências para o e-commerce”, apresentado por Romero Rodrigues, CEO da Buscapé Company.

Mesmo representando ainda 3,8% do varejo como um todo, quase 30% dos brasileiros usuários de smartphones já utilizaram seus browsers pelo menos uma vez para fazer compras. O pequeno e o médio varejo precisam prestar atenção no impacto que isso traz aos negócios.Como exemplo, Rodrigues citou o próprio Buscapé: segundo ele, hoje, 50% do tráfego do buscador é feito via celulares.

Seja por clientes que acessam de casa e vão para o desktop fechar a compra, ou pelos que pesquisam preço, mas acabam comprando na loja após fazer uma barganha com o vendedor.“E quanto o Buscapé ganha com isso? Já disseram que o e-commerce ia 'matar' as lojas físicas, e que não seria lucrativo. Mas hoje os números mostram o contrário. Por isso, é preciso estar atento às oportunidades, que não estão só no on, nem no off, mas em ambos”, afirmou.

Se os três pilares do varejo são preço, seleção e conveniência, Rodrigues apontou outras três tendências para atrair o consumidor e continuar a vender – mesmo em um cenário recessivo. 

A primeira delas é a localização indoor, ou seja, detectar clientes dentro de áreas de compra fechadas, como aeroportos ou shoppings, via aplicativos mobile.Com isso, o consumidor de determinada marca pode ser localizado e participar de promoções e anúncios dentro da própria loja, ou ser acessado se estiver nas proximidades.“Em uma ação da P&G, 30% dos usuários foram às farmácias ou supermercados participantes menos de duas horas após receberem o anúncio”, disse.

A outra tendência é a antecipação do momento de compras. A rede americana Target também criou uma ferramenta - o Cartwheel - que lista os produtos que o consumidor costuma comprar. Quando entra na loja, sua presença é detectada, e ele ganha descontos nos produtos de sua lista. 

A estratégia ajudou a aumentar as vendas da loja física, com crescimento de 21% no movimento, e a elevar em 74% os negócios pelo celular. Hoje, as vendas iniciadas pelo aplicativo representam 80% de todo o negócio. “Se isso fosse feito online, qualquer um poderia ter pego a venda”, diz.

As duas tendências levam a uma terceira: que é a de trazer os produtos para perto do consumidor na hora da compra. Por isso, segundo o CEO do Buscapé, o varejo nunca será 100% digital, mas uma combinação do on e do off.“Mesmo pesquisando no on, ele pode comprar no off. Ou vice-versa.  A compra foi feita onde, então? É discutível. E quem não estiver pronto para essa integração, perderá oportunidades”, concluiu.



Veículo: Site Diário do Comércio - SP


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