Indústria farmacêutica precisa investir mais em pesquisa, dizem especialistas

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Depois de sofrer com a abertura comercial nos anos 90, a indústria farmacêutica brasileira tem recuperado sua força, mas ainda encontra um dos seus maiores desafios no desenvolvimento da pesquisa. O Ministério da Saúde investiu R$ 700 milhões nos últimos cinco anos com a contratação de 3 mil projetos de inovação. O valor ainda é baixo comparado ao Produto Interno Bruto (PIB) do país, de cerca de R$ 3 trilhões, mas é um começo importante, avaliam especialistas presentes ontem no seminário "Caminhos para o financiamento e acesso à saúde", promovido pelo Valor em parceria com a Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma).

 

O déficit comercial do setor é de quase US$ 3,5 bilhões. Mundialmente, a média de investimento em inovação da indústria farmacêutica alcança 21% de sua receita, enquanto outros setores investem cerca de 5%. "Essa indústria tem que investir, senão ela morre", diz Jorge Kalil, diretor do laboratório de imunologia do Instituto do Coração. Ele chama atenção para o fato de que, apesar do peso do PIB do Brasil no mundo, o país ocupa apenas a 17ª posição em pesquisa clínica de medicamentos, que é a aplicação assistida das drogas em pacientes.

 

Inovação farmacêutica é um investimento de alto risco, mas que garante retornos expressivos. Kalil conta que para desenvolver um medicamento, é preciso investir aproximadamente US$ 1 bilhão. "De 10 mil moléculas sintetizadas, apenas uma será comercializada", explica. Além do custo ser alto, um problema no mercado brasileiro é que o processo de aprovação de uma pesquisa clínica é muito longo - chega a até 14 meses, enquanto em países desenvolvidos o período é de três a quatro meses.

 

A concessão de patentes é outro desafio para a inovação farmacêutica que precisa ganhar mais agilidade e dar mais garantias aos investidores, segundo Jorge Ávila, presidente do Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi). Apesar do marco regulatório do setor ser moderno, Ávila diz que há uma série de restrições à concessão de patentes em biotecnologia que acabam gerando insegurança no mercado. "O processo leva cerca de cinco anos e a demora gera incertezas e inibe as pesquisas."

 

Segundo ele, manter restrições às patentes faz parte de um pensamento que considera o país mais como um importador de tecnologia do que investidor. Dessa forma, a patente significaria custo, e não incentivo. "Proteger a propriedade intelectual é importante para incentivar o desenvolvimento, e no Brasil há algumas deficiências nessa proteção", diz.

 

Mesmo com essas dificuldades, há casos de sucesso em investimento farmacêutico no país. Um exemplo é a Recepta Biopharma, empresa de desenvolvimento de pesquisa e testes clínicos de medicamentos para tratamento de câncer. Criada em outubro de 2006, ela é a primeira e até agora única empresa brasileira a conduzir a segunda fase de um teste clínico em pacientes de câncer. A empresa investiu R$ 18 milhões até agora, e neste ano deve investir mais R$ 7 milhões. "É um desafio grande, mas estamos num mercado em crescimento", diz José Fernando Perez, diretor da companhia.

 

Egresso da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), ele conta que um dos pontos importantes para desenvolver a inovação no setor é haver interação entre o universo acadêmico e a indústria. "Essa ponte ainda é muito incipiente no país", diz Perez.

 

Reinaldo Guimarães, secretário de Ciência do Ministério da Saúde, lembra que o setor farmacêutico está entre os seis estratégicos da política industrial brasileira. O próprio governo tem interesse em desenvolver tecnologia para reduzir os seus gastos com medicamentos, que hoje representam 13% do orçamento do ministério.

 

Segundo ele, há 17 acordos já assinados em cooperação com o setor privado para transferência de tecnologia, um investimento de R$ 850 milhões que deve gerar uma economia para o Sistema Único Saúde (SUS) de R$ 150 milhões na compra de materiais.

 

Acesso a medicamentos ainda é limitado no país

 

As discussões sobre acesso a medicamentos em um sistema universal de saúde, como é o caso do Brasil, ainda estão longe de chegarem a um consenso. O Sistema Único de Saúde (SUS), embora tenha registrado muitos avanços nos últimos anos, sofre com limitação de recursos e está distante do considerado modelo ideal de saúde.

 

"Temos bons exemplos, como o programa nacional de aids, mas é preciso um marco legal para discutir acesso a medicamentos", afirmou Gonçalo Vecina Neto, superintendente corporativo do Hospital Sírio Libanês. Vecina participou ontem do seminário "Caminhos para o financiamento e acesso à Saúde".

 

Para Jacob Frenkel, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o atendimento atual é irregular à demanda. "As classes mais baixas deveriam ter maior acesso. As classes D e E hoje não compram genéricos porque esses medicamentos ainda são caros para eles."

 

Atualmente, o consumidor brasileiro responde por quase 80% dos gastos totais do país com medicamentos, de acordo com a Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma). Nos Estados Unidos, os consumidores pagam quase 70%. No Japão, cerca de 29%. As classes C, D e E no Brasil estão entre as que mais gastam com remédios e 80% dessa população são dependentes dos hospitais públicos.

 

Apesar da existência de um sistema público, universal e integral, as limitações de financiamento com saúde no Brasil são expressivas. O Estado tem participação média de 45% no total das despesas com saúde e os gastos giram em torno de 3,65% do PIB.

 

Adib Jatene, ex-ministro e diretor-geral do Hospital do Coração, lembrou que a cobrança da CPMF, extinta em 2007, tinha como objetivo elevar os recursos com saúde. A E29 (emenda 29), que prevê a criação da Contribuição Social para a Saúde (CSS), ainda tramita pela Câmara dos Deputados e é apontada como alternativa para se elevar os recursos a esse setor.
 


Veículo: Valor Econômico


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